BRASÍLIA - O tenente-coronel Hélio Ferreira Lima afirmou nesta segunda-feira (28/7) ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o documento encontrado pela Polícia Federal que previa a prisão de ministros da Corte foi produzido por ele em um trabalho de inteligência que previa “prospecção de cenários”.
O militar atuava como oficial de inteligência da 6ª Divisão do Exército, em Porto Alegre (RS), e relatou que precisava pensar em casos em que as Forças Armadas poderiam intervir, como em uma possível fraude na eleição de 2022. Ele é réu no inquérito que apura suposta tentativa de golpe de Estado, integrante do núcleo 3, composto de acusados de liderar ações de campo voltadas ao monitoramento e neutralização de autoridades.
“Se amanhã sair um relatório ou pronunciamento falando ‘atenção, teve fraude sim’, eu não posso deixar meu comandante ser surpreendido. Eu tenho que ter alguma coisa para que a gente comece a discutir com o Estado-Maior", disse, durante seu depoimento.
“A função do oficial de inteligência militar é reduzir incertezas e evitar a surpresa”, destacou Ferreira Lima, que está preso há nove meses preventivamente.
O documento foi encontrado em um dos pen drives apreendidos com o militar durante busca e apreensão no ano passado, com o nome de “Desenho Op Luneta”. Segundo Ferreira Lima, o arquivo não tratava de uma Operação Luneta para dar um golpe de Estado, mas era, na verdade, um “desenho operacional”, com o objetivo de “restabelecer a lei e a ordem por meio da retomada da legalidade e da segurança jurídica e da estabilidade institucional”.
Uma das metas estabelecidas no documento era “neutralizar a capacidade de atuação do Min AM”, em referência a Alexandre de Moraes, além de “realizar a prisão preventiva dos juízes supremos considerados geradores de instabilidade”. O Desenho Operacional Luneta previa também gabinetes de crise central e nos estados e o apoio na realização de novas eleições presidenciais.
O tenente-coronel afirmou ainda que não despachou o documento com seus superiores e que recebeu outras demandas do chefe da área de inteligência do Rio de Grande do Sul.
De acordo com a denúncia da PGR, o documento deixa “claro que as diversas frentes de atuação da organização foram fruto de planejamento prévio, que antecipavam desde os ataques ao processo eleitoral até concretização do golpe de Estado”.
O tenente-coronel Hélio Ferreira Lima negou ainda que tenha ido a Brasília para monitorar o ministro Alexandre de Moraes, do STF, uma das autoridades que seriam “neutralizadas”, de acordo com a suposta Operação Luneta.
Plano Punhal Verde e Amarelo
De acordo com investigação da Polícia Federal, militares das forças especiais do Exército, os chamados “kids pretos”, usaram carros da corporação para monitorar o ministro Alexandre de Moraes. A intenção era sequestrá-lo e matá-lo envenenado ou com tiros e até bombas.
A ação seria desencadeada em 15 de dezembro de 2022 e incluiria os assassinatos do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), duas semanas antes da posse de ambos, conforme disposto no planejamento operacional denominado ‘Punhal Verde Amarelo’, elaborado pelo general Mário Fernandes”, afirma a PF no relatório.
Saiba quem são os acusados do núcleo 3
O núcleo 3 é composto basicamente por militares, entre eles, os chamados "Kids pretos", do Batalhão de Comandos Especiais do Exército. Entre as ações do grupo estava o plano de atentado contra autoridades, chamado de “Punhal Verde e Amarelo”, que seria executado após as eleições presidenciais de 2022.
Além disso, teriam atuado para pressionar o Comandante do Exército e o Alto Comando a aderir à suposta trama golpista. De acordo com a denúncia da PGR, são eles:
Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, como comandante do Comando de Operações Terrestres (COTER), teria aceitado coordenar o emprego das forças terrestres conforme as diretrizes do grupo.
Os "kids pretos" Hélio Ferreira Lima, Rafael Martins de Oliveira e Rodrigo Bezerra de Azevedo e o policial federal Wladimir Matos Soares teriam liderado ações de campo voltadas ao monitoramento e neutralização de autoridades.
Bernardo Romão Correa Netto, Cleverson Ney Magalhães, Fabrício Moreira de Bastos, Márcio Nunes de Resende Júnior, Nilton Diniz Rodrigues, Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros e Ronald Ferreira de Araujo Junior teriam promovido ações táticas para convencer e pressionar o Alto Comando do Exército a consolidar o golpe.
Crimes listados pela PGR
A denúncia, assinada pelo procurador Paulo Gonet, foi embasada no indiciamento feito pela PF em novembro do ano passado. A investigação teve como base a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.
Além disso, por meio de operações policiais, os agentes recolheram outros materiais que, segundo a denúncia, comprovam a veracidade do esquema. Entre os itens, estão manuscritos, arquivos digitais, planilhas e trocas de mensagens.
Eles respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado. As penas somadas podem chegar até 43 anos e quatro meses de prisão por conta de agravantes.