BRASÍLIA - O relator da ação penal do golpe no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Alexandre de Moraes, pediu a marcação da data para início do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos outros sete réus do caso. A definição cabe ao presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin.
Quando o julgamento for iniciado, a sentença ou a absolvição dos oito será decidida pelos votos do relator, do presidente e dos ministros Cármen Lúcia, Flávio Dino e Luiz Fux, que também compõem o colegiado.
"Considerando o regular encerramento da instrução processual, o cumprimento de todas as diligências complementares deferidas, bem como a apresentação de alegações finais pela Procuradoria-Geral da República e por todos os réus, solicito ao Excelentíssimo Presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin, dias para julgamento presencial da presente ação penal", pede o relator em despacho publicado nesta quinta-feira (14/8).
Bolsonaro e os réus integram o núcleo crucial da trama golpista, segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), que pede a condenação do grupo pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de direito, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e organização criminosa armada. As penas máximas para os crimes podem alcançar 43 anos de prisão.
Esses oito réus são, para a PGR, as figuras centrais do núcleo golpista. Além do ex-presidente, também serão julgados aliados que ocupavam cargos fundamentais no período em que ele permaneceu à frente do Palácio do Planalto. são eles:
- Alexandre Ramagem, hoje deputado federal eleito pelo PL do Rio de Janeiro e, à época, diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
- Anderson Torres, ministro da Justiça do governo Bolsonaro e secretário de segurança do Distrito Federal durante as invasões do 8 de janeiro;
- Almir Garnier, comandante da Marinha no governo Bolsonaro;
- Augusto Heleno, general e ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no governo Bolsonaro;
- Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro nos quatro anos da presidência, e o delator da trama golpista com acordo de colaboração premiada firmada com o STF;
- Paulo Sérgio Nogueira, general do Exército e ministro da Defesa no governo Bolsonaro;
- Walter Braga Netto, general, ministro do governo Bolsonaro e vice na chapa do ex-presidente na última eleição;
Nas sessões para julgamento da ação penal, a Primeira Turma se debruçará sobre as alegações finais apresentadas pela PGR e sobre os interrogatórios de réus e testemunhas. A peça oferecida à Corte pelo procurador-geral Paulo Gonet relata que Bolsonaro era o líder da organização criminosa para dar um golpe de Estado.
"Sua liderança sobre o movimento golpista, o controle exercido sobre os manifestantes e a instrumentalização das instituições estatais, para fins pessoais e ilegais, são elementos que provam, sem sombra de dúvida, a responsabilidade penal do réu nos atos de subversão da ordem democrática", esclareceu o PGR no documento.
A atuação dos aliados do ex-presidente também é detalhada na denúncia da Procuradoria. "Ainda que nem todos tenham atuado ativamente em todos os acontecimentos relevantes na sequência de quadros em que se desdobraram as ações contra as instituições democráticas, todos os denunciados colaboraram, na parte em que lhes coube em cada etapa do processo de golpe, para que o conjunto de acontecimentos que compõem os crimes denunciados ganhasse realidade, entrosando-se numa concordância de sentido e finalidade", pontua.
Bolsonaro diz que é inocente
Os oitos réus entregaram na quarta-feira (13/8) suas alegações finais na ação penal que investiga a suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. A defesa de Bolsonaro reforçou a posição de que o ex-presidente é inocente e que não há provas para condená-lo pelos cinco crimes aos quais responde.
"Demonstrou-se a absoluta ausência de provas e o manifesto divórcio entre a acusação e o direito. Demonstrou-se que os atos imputados na denúncia jamais poderiam ser qualificados como criminosos, seja porque expressamente excluídos do âmbito de incidência penal pelo legislador, seja porque, ainda que adotada a lógica da denúncia, os atos se revelariam, quando muito, como atos preparatórios", alega.
Para a defesa, comandada pelos advogados Paulo da Cunha Bueno e Celso Vilardi, a acusação é “vazia”, “tão absurda quanto alternativa” e baseada em “ilações”.
Entenda a investigação
A Procuradoria-Geral da República (PGR) partiu do inquérito da Polícia Federal (PF) para denunciar ao Supremo Tribunal Federal (STF) 34 investigados por golpe de Estado. Gonet fatiou a denúncia em quatro núcleos de atuação, concentrando no primeiro grupo aqueles com papel primordial na tentativa de ruptura institucional. O principal nome, segundo a PGR, é Jair Bolsonaro.
A denúncia chegou às mãos do ministro Alexandre de Moraes em fevereiro, e a Primeira Turma tornou réus, em maio, 31 dos investigados. Todos respondem pelos mesmos cinco crimes, com exceção de Ramagem, que teve acusações suspensas por ocupar mandato de deputado.
A investigação começou após as invasões e depredações ocorridas no 8 de janeiro. A Polícia Federal (PF) identificou a existência de um plano articulado para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e garantir a permanência de Bolsonaro no cargo.
Pela apuração da PF, diferentes atores agiam em múltiplas frentes para fragilizar as instituições e criar um ambiente para um golpe de Estado. Alimentar a descrença nas urnas eletrônicas e pôr em xeque a segurança das eleições constava entre as estratégias do grupo golpista, conforme a PF.
Ministros do então presidente, entre eles Anderson Torres e Augusto Heleno, se reuniram para orientar a propagação de mentiras sobre fraudes nas eleições.
Um documento coletado no âmbito das investigações indica que o Partido Liberal (PL), presidido por Valdemar Costa Neto, buscou um instituto para invalidar as eleições. Militares também agiram para facilitar o golpe, segundo a PF. A publicação de uma carta de oficiais dirigida ao comandante do Exército, à época Marco Antônio Freire Gomes, para pressioná-lo a aderir à intentona golpista era uma das estratégias.
Houve, ainda, uma série de reuniões no Palácio da Alvorada para elaboração do golpe. Uma minuta golpista que previa a ruptura institucional foi discutida em um dos encontros. Conforme a PF, Bolsonaro tinha conhecimento de todas as frentes de atuação e orientava algumas delas. O ex-presidente rejeita as acusações.