Tragédia do Sarriá

Paulo Isidoro e a grande decepção: ‘Mudou o futebol brasileiro’

Ex-jogador, que disputou a Copa de 82, relembra momentos do Mundial, fala sobre a eliminação e revela o que ele mudaria no time

Por Daniel Seabra
Publicado em 05 de julho de 2022 | 05:06
 
 
 
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Aos 69 anos, o ex-jogador Paulo Isidoro lembra, com um misto de alegria e tristeza, a disputa daquela Copa. Ídolo do Atlético, o mineiro, de Matozinhos, não vestia a camisa alvinegra quando foi convocado por Telê Santana.

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Em 1980, ele teve seu passe trocado pelo de Éder Aleixo, em uma negociação com o Grêmio. E foi pelo Tricolor gaúcho que Paulo Isidoro foi chamado para a disputa do Mundial na Espanha. “A preparação não teve coisa melhor”, relembra. “Mas houve algumas mudanças. A minha substituição foi errada, mas não adianta contar agora”, reclamou.

Para ele, não havia a chance de o Brasil não voltar com o tetracampeonato. “Foi uma decepção muito grande. O torcedor estava muito confiante. A decepção maior foi ter tomado os três gols naquele jogo (contra a Itália). Eu jamais esperava que nós não trouxéssemos o campeonato mundial”, disse.

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Mas Paulo Isidoro aponta o motivo que pode ter levado à derrota. “Talvez esse excesso de confiança, esse ‘oba-oba’, pode ter sido o responsável. Pegou a todos nós de surpresa.. Eu estava muito confiante”, frisou, lembrando-se da marcha do placar, naquele fatídico jogo contra os italianos. “Quando tomamos o terceiro gol, eu falei: ‘daqui a pouco vamos lá e fazemos o terceiro.’ A gente acreditava muito na nossa seleção.”

Segundo ele, antes das partidas, a confiança era total. Tanto que os jogadores cantavam e se divertiam, esperando, claro, sempre, mais uma vitória que viria na sequência. “Não só aquele jogo, mas em todos os jogos, antes, cantávamos ‘voa canarinho’ (música composta pelo lateral-esquerdo Júnior, que se tornou tema brasileiro na Copa). A confiança era total. Foi o excesso de confiança. Se a gente repetisse aquele jogo hoje, a gente não perderia. Hoje temos outra mentalidade.”

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E quando tudo deu errado para os brasileiros, Isidoro relembra do que viu no vestiário verde e amarelo, depois da derrota para a Itália. “Quando começou o torneio, não tinha um que não falava que o Brasil não seria o campeão. E depois, no vestiário, nunca vi tanto homem chorando, abraçado um com o outro. Aquela decepção, o choro… Eu mesmo fiquei para fazer exame antidoping. Todo mundo chorando, os italianos confortando a gente… Me parece até que eu vi os caras (os italianos), já com malas prontas. Eles não estavam com aquela confiança toda”, relembrou o ex-meio-campo brasileiro.

TIME E POLÊMICA

Sobre a equipe escalada por Telê Santana, Paulo Isidoro só faria uma alteração. “Eu mudaria com a minha entrada. Eu jogava com uma marcação muito forte. No Mundialito, eu joguei, e dei muita liberdade para o Zico, Falcão, Sócrates. Fazia o lado direito, e o Leandro tinha total liberdade de atacar. Uma função que eu poderia fazer, com uma eficiência que era marcação”, disse.

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Paulo Isidoro acabou ‘sacado’ do time, e o meio de campo, na Copa do Mundo, acabou formado por Cerezo, Zico, Falcão, Sócrates. “Tínhamos jogadores de enorme futebol, mas que não ajudavam na marcação”, lembrou.

Anos depois, muito se falou sobre um possível distanciamento dos jogadores ‘mineiros’ (nascidos ou que jogavam no estado), do restante do elenco. Segundo Paulo Isidoro, isso não aconteceu. “O único problema que teve é que o Edinho disse, lá no Rio, que ele deveria jogar, não o Luizinho. Mas o Telê soube administrar.”

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FUTURO DO FUTEBOL BRASILEIRO

Para Paulo Isidoro, a perda da Copa do Mundo se tornou um marco, uma mudança total de rota no que era o futebol brasileiro. “Mudou completamente, mexeu totalmente, mexeu na estrutura toda. O brasileiro não queria mais futebol arte, queria títulos. Nós acabamos com a essência do futebol brasileiro. Começamos a imitar o futebol europeu. Hoje, o jogador brasileiro que tem qualidade, de dominar uma bola… Todo mundo fica revoltado. Isso é um absurdo. Jogador toma uma caneta, ele sai para brigar. O futebol brasileiro mudou totalmente. Tem que ser robô. Não visa dar espetáculo”, lamentou.

Ele ainda relembrou alguns esquadrões de um passado, até certo ponto, recente. “Lembro de um Cruzeiro, de um Atlético, um Flamengo, nas décadas de 70 ou 80. Era bacana, os times jogavam bonito, davam espetáculo. Agora você não vê isso, é só força.”

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PROJETO

Antes da pandemia, Paulo Isidoro mantinha um projeto que visava revelação de jogadores, mas também formação social de meninos. “Estava com meu projeto, mas é um projeto dentro do social, e depois o futebol. Veio a pandemia, fechei meu centro de treinamento”, lamentou.

“E agora estou fazendo um projeto social, de alto rendimento. Sofri muito quando fui para a seleção, com pouco estudo, e senti muito isso. Procuro fazer um trabalho mostrando que ele tem que ter estudo. Fiz uma parceria com o Guarany de Mariana. já começamos, e agora vamos buscar os patrocinadores”, disse, sobre seus novos planos para o futuro.

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