Nossa desigualdade

Contornos sociais

por Natália Oliveira

Das janelas da favela se veem prédios luxuosos. Das janelas dos prédios se veem barracos sem reboco. O encontro da avenida Nossa Senhora do Carmo com a BR-356, no bairro Santa Lúcia, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, tem a vista de um dos mais emblemáticos contrastes sociais da cidade. Em meio a vários bairros de classe média-alta, se ergue o aglomerado Santa Lúcia, mais conhecido como Morro do Papagaio, e é lá dentro que funciona o projeto Fa.Vela, que tem como um dos objetivos diminuir os contrastes físicos e sociais que separam essa comunidade dos outros bairros.

O Vela no nome do projeto tem, justamente, o significado de impulsionar, de fazer deslanchar empreendimentos de moradores de comunidades carentes. E foi embarcando nesse velejo que Jumara Elisa da Silva, 39, deixou para trás a frustração de ter fechado seu salão de beleza por três vezes por causa da má administração.

“Eu fazia meu trabalho de cabeleireira direitinho, mas não conseguia administrar, perdia dinheiro e acabava falindo. Era muito desorganizada e não sabia mesmo o que fazer. Com o Fa.Vela eu tive aulas de administração e, desde então, mantenho o salão aberto. O projeto foi minha luz no fim do túnel”, se alegra Jumara. O sucesso foi tanto que agora ela só pensa em expandir o empreendimento. “Eu tô construindo um segundo andar, onde vou fazer um Dia da Noiva completo; não é porque moramos em comunidade que não podemos ter essa regalia”, complementa Jumara.

4 é o número de vilas dentro do aglomerado

35 mil é o número aproximado de habitantes do morro

Uma das fundadoras do Fa.Vela, Tatiana dos Santos Silva, 30, explica que o projeto é formado por um coletivo de voluntários, que contribui para democratizar o conhecimento sobre gestão de negócios. “Cada voluntário ajuda com o seu conhecimento. Por exemplo: estudantes de administração ensinam como cuidar dos negócios; quem é da área de marketing ou comunicação contribui com a divulgação; e assim por diante”, explica Tatiana.

Segundo ela, o projeto também é importante porque promove a interação entre as pessoas do aglomerado com os voluntários. “Se não fosse dessa forma, provavelmente, muitos estudantes nunca subiriam o morro”, considera Tatiana. Esse foi o caso da voluntária e estudante de jornalismo Ana Clara Rodrigues, 25, que há um ano entrou pela primeira vez em um aglomerado de Belo Horizonte para realizar o projeto.

“Eu ajudava os responsáveis pelos empreendimentos com a divulgação em redes sociais, comunicação, artes, fotografia e vídeos. Acabei fazendo meu trabalho final da faculdade sobre o projeto. É um trabalho muito gratificante”, se orgulha Ana Clara. O projeto é mantido com a ajuda de patrocinadores, e a escolha dos empreendimentos que vão participar do Fa.Vela é feita por meio de edital. Além do aglomerado, o projeto também atua no bairro Pindorama, na região Noroeste da capital.

Construindo histórias

Martelo, furadeira, pá, enxada e carrinho de mão. Essas são algumas das ferramentas utilizadas para se construir uma casa, mas, no aglomerado Morro das Pedras, na região Oeste de Belo Horizonte, esses instrumentos ajudam também a construir sonhos. É que por lá funciona a Oficina da Vizinhança, projeto de compartilhamento de ferramentas para a construção de habitações no aglomerado.

“Temos um espaço físico onde ficam guardadas essas ferramentas e contamos ainda com a ajuda de estudantes de arquitetura que dão dicas para as construções. Às vezes, fazemos mutirões e ajudamos uns aos outros nas obras. Além disso, estamos com a ideia de montar uma serralheria e uma marcenaria dentro do aglomerado”, contou Marcus Horacius de Jesus, 30, um dos organizadores do projeto.

Segundo ele, o mais interessante é que a oficina já está saindo dos contornos do aglomerado e ajudando os moradores até mesmo financeiramente. “Alguns meninos que estão desempregados pegam baldes e aspirador de pó emprestados para lavar carros nos bairros do entorno”, conta Jesus. Todas as ferramentas foram doadas, e há um controle dos empréstimos.

O que fazer para diminuir a desigualdade social?

Reduzir o preconceito social

Esta é uma importante ferramenta para reduzir a desigualdade social. O preconceito por si só acaba por segregar ainda mais as camadas sociais. Muitas vezes algumas pessoas acabam não sendo contratadas para alguns tipos de emprego por causa da discriminação.

Convivência

A convivência e interação entre pessoas de várias origens sociais é importante para que as pessoas conheçam a realidade umas das outras, não só financeiramente, mas também socialmente.

Projetos sociais

É importante a realização de projetos nessa área para que as pessoas mais pobres tenham acesso a um maior conhecimento. É importante também a premiação desses projetos sociais para que se crie um incentivo ao desenvolvimento desses trabalhos.

Oportunidade para a comunidade LGBT

A inserção de pessoas LGBT no mercado de trabalho é outro fator fundamental para que elas não sejam marginalizadas. Em São Paulo, por exemplo, há um hotel em que eles contratam um grande número de travestis para serem atendentes, a ideia é minimizar o preconceito e trazer um reconhecimento para elas.

Fonte: Professora da UFMG Danielle Sireno Fernandes do Departamento de Sociologia.

De grão em grão

Uma vez por mês, em alguma das vias de Belo Horizonte, por volta das 15h, acontece o encontro de moradores de rua com uma turma cheia de solidariedade. Geralmente aos sábados, os voluntários do Grupo Grão de Areia saem pela cidade entregando marmitex.

“Fazemos mais ou menos 230 marmitex e vamos andando pela cidade fazendo as entregas. O grupo já tem oito anos, e, com a ajuda de amigos e familiares, conseguimos comprar um fogão industrial e juntar voluntários tanto para fazer a comida quanto para as entregas”, conta Débora Teixeira Costa, 24, uma das organizadoras do grupo.

Segundo ela, muito mais que comida, a proposta é levar um pouco de alegria e esperança para essas pessoas. “Tem um morador de rua que, toda vez que lhe entregamos a marmitex, nos diz palavras bonitas como se fosse uma poesia”, conta Débora.

Como ajudar? Para colaborar com os projetos entre em contato com os organizadores pelos links no Facebook que estão no meio do texto.

Expediente

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