Exaustão em meio a epidemiade dengue. Um sentimento de esgotamento que voltou a fazer parte da rotina de profissionais de saúde diante do aumento dos casos da doença em Belo Horizonte. Na rede municipal da capital mineira, o número de atendimentos saltou 25% em apenas duas semanas de fevereiro, quando comparado a janeiro. No mês anterior foram 28 mil atendimentos nas nove Upas e nos 152 centros de saúde, número inferior aos 35 mil registrados neste mês, até o último dia 16. Um cenário que se repete nas unidades de assistência médica das redes estadual e privada. A capital tem 3.718 casos de dengue confirmados, com cinco óbitos, além de 259 de chikungunya.
"Além do grande número de casos, não temos estrutura física para essa quantidade de atendimentos. O plano que a prefeitura fez para desafogar as Upas e os centros de saúde, com os Centros de Atendimento à Dengue (CAA) e uma Unidade de Hidratação (Unidade de Reposição Volêmica- URV), não tem sido eficiente", relata a médica Ana Tobias, que trabalha em um centro de saúde da regional Barreiro. Segundo a profissional, a busca por assistência médica aumentou de forma progressiva desde janeiro. No entanto, teve um salto significativo na última semana. "São mais pacientes, e casos mais graves também", acrescentou.
A sensação de sobrecarga é a mesma para o médico Artur Oliveira Mendes, que atua em um centro de saúde na região Leste da capital e é diretor do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG). "Temos hoje uma demanda muito grande e somado a isso uma dificuldade de ajustar o tamanho da rede à necessidade da população", justifica. Para ele, o momento epidemiológico junto ao déficit de profissionais tem adoecido trabalhadores da área da saúde. "Além dos problemas que já enfrentamos, têm a sobrecarga deste momento. Uma soma de fatores, que leva muitos ao afastamento, sobrecarregando outros. Um ciclo vicioso", expõe.
Em entrevista para a reportagem de O TEMPO, o secretário municipal de saúde de Belo Horizonte, reconheceu a situação enfrentada na rede pública. Segundo ele, o aumento na busca por atendimentos era algo previsto, e deve continuar até o fim da primeira quinzena do mês de março. "Hoje nós temos as equipes das unidades de saúde sobrecarregadas com a grande procura por atendimentos", disse.
O secretário informou que após o decreto de emergência, publicado no último sábado (17 de fevereiro), a capital deverá contratar até 600 profissionais da área e criar três hospitais temporários para ampliar os atendimentos. A prefeitura, no entanto, não informou o número de profissionais afastados em janeiro e fevereiro deste ano.
Para quem trabalha na rede de saúde, o reforço poderá ajudar os profissionais. No entanto, o Plano de Enfrentamento às Arboviroses, lançado no fim do último mês, precisa ser revisto. "A coleta de sangue nas unidades de saúde para quem precisa de acompanhamento aumentou. Essa coleta geralmente é feita pela manhã ou durante a tarde. Porém, até o resultado do exame ficar pronto, já passou do horário do fechamento do posto. Com isso, o médico e o paciente precisam ficar esperando na unidade", conta a médica Ana Tobias.
A avaliação é a mesma do médico Artur Oliveira Mendes. "A nossa maior dificuldade hoje é garantir agilidade nos fluxos dos atendimentos. A gente tem falta de alguns materiais sim, mas o grande problema é ter a rapidez na assistência. Isso ocorre por causa do protocolo, dos procedimentos e também pelo déficit que a rede possui. Hoje, por exemplo, o ideal seria ter o dobro de profissionais", apontou o médico, que também é diretor do sindicato da categoria.
Problema que se multiplica
O cenário na rede municipal se perpetua nas unidades de saúde do estado e da rede particular. De acordo com a técnica de enfermagem Bárbara Cristina Machado, a epidemia de arboviroses aumentou a busca por atendimentos no hospital João XXIII, referência em traumas da América Latina. "Essas pessoas buscam assistência nas Upas e estão cheias, nos centros de saúde a mesma coisa. Então elas vão para o João", conta.
Segundo a profissional, parte dos pacientes chegam à unidade com sintomas graves, sendo que muitos necessitam de internação. "Hoje não estamos dando conta. Dar conta não é apenas atender essas pessoas, é garantir assistência com qualidade. E isso, infelizmente, não está sendo feito", relata a técnica, que também revela um maior número de afastamento entre os profissionais de saúde nos dois primeiros meses deste ano.
A sobrecarga de atendimentos também ocorre no hospital Risoleta Tolentino Neves, localizado na região Norte de Belo Horizonte. O hospital, que é responsável por atender 1,5 milhão de pessoas da capital e de municípios do entorno, registrou até o dia 14 de fevereiro um número de notificações de pacientes com sintomas da doença maior que toda a quantidade de 2023. São 552 notificações na unidade de saúde, número superior aos 14 do ano passado. Um aumento de 3.842%.
"No Risoleta os números mostram um aumento bastante expressivo de casos suspeitos de 2023 para 2024. No momento, toda a nossa equipe está focada em lidar com a superlotação no Hospital, assim não temos nenhuma fonte disponível", informou o hospital, que é gerido com recursos do Estado (54%), da União (33%) e do município de Belo Horizonte (13%).
A crescente busca por assistência médica é semelhante em hospitais da rede privada, como a Unimed-BH. De acordo com um levantamento da instituição, do início de janeiro até 17 de fevereiro de 2024, houve um aumento de mais de 850% nos atendimentos de casos suspeitos de dengue, chikungunya e zika, incluindo a teleconsulta.
"Devido a epidemia de arboviroses na capital e região metropolitana, a Unimed-BH confirma que vem registrando um aumento significativo de atendimentos em sua rede. Para prestar a melhor assistência aos clientes, a Unimed-BH esclarece que vem se preparando com ações de enfrentamento, desde o final do ano passado, quando houve sinalização de potencial aumento dos casos", destacou.
Por causa da alta procura por atendimentos, a cooperativa afirma ter criado salas de hidratação em diversas unidades, reforçado a quantidade de médicos, técnicos de enfermagem e enfermeiros, além do aumento de agendas para consultas on-line. Somado a esses esforços, a rede afirma diz ainda que tem realizado campanhas de comunicação com o objetivo de alertar sobre os cuidados, principalmente em como eliminar os focos do mosquito Aedes aegypti. Veja o posicionamento completo ao fim da matéria.
"O momento que estamos vivenciando alerta para a necessidade de pensar a dengue durante todo o ano e não só nesta época. Se a gente muda esse comportamento, vamos conseguir evitar catástrofes como essa que estamos vivenciando", alerta o médico infectologista Leandro Cury, que atua em hospitais da rede privada de Belo Horizonte.
Procurada pela reportagem de O TEMPO sobre o aumento do número de atendimentos e a possível falta de profissionais, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) se limitou a dizer que "os atendimentos competem aos municípios, bem como a contratação de profissionais de saúde". A Prefeitura de Belo Horizonte, por meio de nota, reforçou que possui um Plano de Enfrentamentos às Arboviroses e que após o decreto de emergência, publicado no último sábado (17), as equipes de saúde devem ser reforçadas.
"Diante do aumento da demanda por atendimento, já foram contratados mais de 250 profissionais para reforçar os atendimentos a pessoas com suspeita de dengue e outras arboviroses. Foram admitidos médicos, enfermeiros, técnicos de laboratório e de enfermagem, além de trabalhadores administrativos. A Secretaria Municipal de Saúde mantém sempre ativo um banco de currículos on-line. Assim, os profissionais interessados podem se cadastrar para as vagas em aberto na rede", disse. A nota pode ser lida na íntegra no final da reportagem.
Veja a nota da Prefeitura de Belo Horizonte
A Prefeitura de Belo Horizonte informa que conta com um Plano de Enfrentamento às Arboviroses, que contempla ações que têm como objetivo ofertar uma assistência oportuna, segura e de qualidade, de forma a evitar a ocorrência de maior gravidade de casos.
Uma das ações previstas no plano é o incremento de profissionais. Diante do aumento da demanda por atendimento, já foram contratados mais de 250 profissionais para reforçar os atendimentos a pessoas com suspeita de dengue e outras arboviroses. Foram admitidos médicos, enfermeiros, técnicos de laboratório e de enfermagem, além de trabalhadores administrativos. A Secretaria Municipal de Saúde mantém sempre ativo um banco de currículos on-line. Assim, os profissionais interessados podem se cadastrar para as vagas em aberto na rede.
No último sábado, 17, foi publicado decreto de situação de emergência. O decreto flexibiliza e agiliza novas contratações. Além disso, permite que o município renove o acordo com profissionais, sem necessidade de se cumprir intervalo de 30 dias para renovação, conforme legislação. Dessa forma, o município consegue manter o profissional durante o período de maior demanda assistencial. O decreto autoriza também a ampliação da carga horária dos contratos administrativos vigentes.
Seguindo as ações previstas no plano, o município tem ampliado os locais para o atendimento das pessoas que apresentam sintomas de dengue, chikungunya e zika. Até o momento já foram abertos três Centros de Atendimentos às Arboviroses (CAAs) e três Unidades de Reposição Volêmica (URVs). Além disso, a Prefeitura mantém a estratégia de abrir centros de saúde aos finais de semana, inclusive com aumento no número de unidades em funcionamento.
Cabe ressaltar que a Prefeitura já prepara a abertura de mais três unidades, que irão concentrar no mesmo espaço as consultas ofertadas às pessoas com sintomas das doenças, leitos para hidratação venosa e devido acompanhamento e monitoramento do quadro clínico dos pacientes, inclusive com realização de exames laboratoriais.
Com relação às ações de combate e prevenção ao Aedes aegypti, as medidas seguem em andamento em todo o município. De segunda a sexta-feira os Agentes de Combate a Endemias fazem vistorias nos imóveis para identificar e eliminar possíveis focos do mosquito e orientar a população sobre as medidas que devem ser tomadas para evitar a proliferação do Aedes aegypti.
Também são realizadas ações pontuais, como mutirões de limpeza, aplicação de inseticida Ultra Baixo Volume (UBV), monitoramento de ovitrampas - que são armadilhas em pontos estratégicos para monitorar a circulação do Aedes aegypti - e sobrevoo de drones para a aplicação de larvicida diretamente nos pontos de risco.
Essas atividades são planejadas e definidas conforme avaliação técnica de cada território, considerando os aspectos epidemiológicos (ocorrência de casos humanos), entomológicos (densidade vetorial do Aedes aegypti) e operacionais de cada área analisada.
Veja o posicionamento da Unimed
Devido a epidemia de arboviroses na capital e região metropolitana, a Unimed-BH confirma que vem registrando um aumento significativo de atendimentos em sua rede. Do início de janeiro até 17 de fevereiro de 2024, houve um aumento de mais de 850% nos atendimentos de casos suspeitos na sua rede assistencial de serviços próprios, incluindo a teleconsulta. Em apenas sete dias, a cooperativa registrou mais de 17 mil atendimentos de casos suspeitos de arboviroses.
Para prestar a melhor assistência aos clientes, a Unimed-BH esclarece que vem se preparando com ações de enfrentamento, desde o final do ano passado, quando houve sinalização de potencial aumento dos casos.
Entre as iniciativas estão:
- Criação de Salas de Hidratação em diversas unidades;
- Aumento de agendas disponíveis para consultas on-line;
- Reforço da equipe médica e assistencial.
- Divulgação de campanha de comunicação alertando sobre os cuidados, principalmente em como eliminar os focos do mosquito Aedes aegypti.
A cooperativa reforça que, ao perceberem os primeiros sintomas, os clientes procurem o serviço de teleconsulta, disponibilizado 24h. O agendamento pode ser feito via App da Unimed-BH ou pelo site - https://portal.unimedbh.com.br/
E, orienta ainda, sobre a importância da identificação dos primeiros sinais e sintomas e também sobre o correto direcionamento do percurso, sugerindo a procura de Pronto Atendimento para os casos de urgência e emergência.