Da ousadia do inusitado ao conforto do que é usual, são muitas as formas de aproveitar, na prática, o Dia do Sexo, celebrado nesta sexta-feira, 6 de setembro, ou, simplesmente, 6/9, combinação de numerais, claro, associado à posição sexual do “meia-nove” – em que o casal, simultaneamente, se estimula oralmente.

Originalmente, a ideia da celebração surgiu em 2008, quando uma marca de preservativos realizou uma campanha publicitária aproveitando a “coincidência”. Mas a ideia, antes meramente comercial, pegou e a data passou a ser relembrada anualmente, seja pelo mercado erótico e do bem-estar sexual, seja por profissionais e entidades da área da saúde, que aproveitam a deixa para discutir o tema.

Em Belo Horizonte, o Dia do Sexo ainda era pouco lembrado, na véspera da data, por quem circulava na praça Sete, onde a reportagem de O TEMPO circulou e, bem, coletou dicas.

O animado Erick dos Santos, por exemplo, esfregou as mãos ao descobrir a existência deste marco celebrativo. O camelô – ou melhor, “cabidiano”, como ele se descreve por vender roupas em cabides –, garante ser do tipo que topa incrementar a relação. “De vez em quando, invento umas coisinhas novas, tipo, amarro a mulher, uma ‘parada’ doida demais!”, empolga-se. E é tudo, digamos, bem caseiro. Esqueça algemas, cordas especiais: “Eu uso minhas roupas mesmo, tá ligado?”. E não é só. “Ela (sua parceira, que ele chama de ‘dona Maria’ durante a entrevista), costuma me chamar de ‘Pitbull’ e eu ‘grrrr’, dou aquela rosnada cabulosa. O bagulho fica doido”, conta em tom de descontração.

Já a professora de artes Danielle do Nascimento até sabia das comemorações do 6 de setembro, mas confessa que, no corre-corre da vida, não estava se lembrando, mas ficou feliz com o lembrete. Para ela, no sexo, vale tudo, se tiver consentimento. “Se você está com uma pessoa que gosta e quer experimentar, tem mesmo é que experimentar, ver até onde seu corpo vai. O que não dá é para ser só aquela coisa mecânica. Então, quer usar apetrecho, use! Não tenha vergonha e não passe vontade não”, opina. 

Mas, claro, nada disso é obrigatório e garantia de satisfação. Para alguns, aliás, pode até atrapalhar. Caso do técnico de enfermagem Rafael Oliveira, 29. “Sou mais delicado, sabe? E gosto do sexo mais natural. Óleos, até uso, mas, brinquedos, não gosto”, explica, inteirando que até sua posição favorita depõe para a preferência por uma pegada mais “amorzinho”: “Gosto de ladinho, porque já fico de conchinha, aconchegante”. 

A psicóloga Amanda Munari, 27, também não é adepta de muita invencionice. “Se eu estou confortável com a pessoa, com o parceiro, consigo me soltar um pouco mais. Se não, vou mais devagarinho”, diz, complementando que, seja como for, não é adepta do uso de fantasias e apetrechos demais. “No máximo, uso uma lingerie, mas acho que o que importa é o que está por baixo, e fantasio mais na minha cabeça. Daí, gosto mais de quem é bom de lábia, de quem sabe estimular a imaginação”, aponta ela, que também é adepta de óleos de massagem capazes de potencializar a sensibilidade do corpo.

Um tema que não se esgota

O mosaico de respostas ouvidas pela reportagem depõe para uma realidade em que, de fato, se tornou mais comum não apenas falar mais abertamente sobre sexo como também se abrir para novas possibilidades eróticas. Temas que estão longe de se esgotarem. “Se pararmos para pensar que sexo e as diversas relações sexuais existem desde os primórdios da humanidade e ainda são motivo de estranheza, fica fácil admitir que ainda há muito para ser descoberto”, avalia Nanà Pàuvoli, escritora romancista erótica, que foi a quinta autora mais lida no programa Kindle Unlimited no Brasil nos últimos 10 anos

“O prazer, a satisfação, os debates, estarão sempre ativos e em transformação enquanto nós estivermos por aqui. Os tempos mudam, sociedades encaram o sexo de maneira diferente, gerações desenvolvem novos gostos e olhares sobre o assunto, mas os seres humanos permanecem buscando respostas e satisfações. Então, acredito que nada é permanente e as novidades sempre chegam. Ou são ressignificadas”, avalia.

A sexóloga somática Tami Bhavani, que estreia nesta sexta (6) como colunista em O TEMPO, concorda. Para ela, há muito espaço para novidades, mas alerta: “Se a população tiver uma mentalidade muito conservadora, considerando sexo um pecado, ou simplesmente fechada à sexualidade, vai ser difícil implementar coisas novas”. Um sintoma dessa barreira, cita, se percebe na resistência diante de profissões como a que ela exerce. “Ainda tem um certo receio, um olhar para esse tipo de educação, que pensa no desenvolvimento de um corpo orgástico através de suas fantasias e desejos”, pontua.

Tami pontua que a criatividade na vida sexual não está restrita à experimentação de novas posições ou acessórios. “Vale para outros aspectos também. Eu já atendi casais que estavam juntos há 30 anos, mas nunca tinham experimentado tocar o outro de forma consciente, o que só fizeram em uma vivência tântrica”, exemplifica, em sintonia com o que defende Nanà. “No sexo, (o uso da criatividade) é muito pessoal, questão de gosto ou de mudança, pode ser ampliado por diversos fatores. Um deles é a literatura. Muitas mentes se abrem, desejos são descobertos, pessoas se conhecem melhor através da leitura”, avalia, contextualizando que o mercado de livros eróticos sempre foi feito de ciclos, mas, há anos permanece no gosto dos leitores, principalmente das mulheres. 

“Através da literatura erótica, mulheres pararam de esconder seus livros no fundo de gavetas e passaram a falar mais abertamente sobre sexo. Compram livros em livrarias, enchem eventos literários e eróticos, pedem por mais. Pois esse tipo de romance faz a pessoa se redescobrir, reconhecer suas fantasias, se tornar mais livre”, defende a autora, inteirando que experiências sexuais costumam ser trocadas em grupos de leitoras. “Recebo muitos relatos que descrevem como, a partir da leitura dessas histórias, essas mulheres se tornaram donas dos próprios desejos, apimentando suas relações, descobrindo seus limites”, conclui.

Como definir limites

Os depoimentos colhidos pela reportagem mostram também que, no sexo, as expectativas de duas – ou mais – pessoas podem ser antagônicas e até incompatíveis. Se tem quem goste de criar personagens, tem também quem relate perder o ânimo diante de um teatro erótico. Se tem quem tope usar brinquedos, tem também quem torça o nariz para o uso desses apetrechos.

Mas e então, como equilibrar essa balança no encontro a dois? “Com diálogo, muito diálogo”, crava Tami Bhavani. “Se você dorme com a pessoa, se divide sua intimidade com ela, por que não se abrir também sobre seus desejos e fantasias? Vai ser nessa oportunidade que o casal vai ter a oportunidade de colocar limites, de estabelecer até onde pode-se ir sem se impor sobre o outro”, estabelece.

Em tempo, Tami ainda faz um alerta: a busca por prazer, quando se torna excessiva, pode, na verdade, jogar contra o próprio desejo. “Existem casos de pessoas que iniciam uma procura incessante por novidades, pessoas que se tornam refém de uma necessidade cada vez maior de certas descargas emocionais para se sentirem satisfeitas, perdendo a capacidade de se excitarem com o sexo do dia a dia, com o ato de acordar de manhã e transar”, adverte.

(Com colaboração de Alice Brito)