“O casamento é a única coisa que afasta o sexo”. A provocativa frase, frequente em palestras e entrevistas do historiador Leandro Karnal, encontra, pelo menos parcialmente, respaldo em estatísticas sobre fatores que interferem na frequência sexual. Sim, é verdade que em relações monogâmicas duradouras o número de transas tende a cair ao longo do tempo. E há uma série de fatores que explicam esse fenômeno – como aspectos relacionados à idade e a uma certa acomodação.

Neste contexto – embora pesquisas e especialistas alertem que quantificar o sexo talvez não seja uma boa estratégia e, tampouco, uma frequência maior garantirá, magicamente, mais felicidade –, a preocupação em relação ao número médio de transas é tema ainda bastante comum entre casais. E, na verdade, brasileiros e brasileiras parecem desejar mais sexo do que de fato têm feito.

“O número de vezes que se tem relações sexuais costuma variar, em média, entre uma e três vezes por semana, sendo que fatores ambientais, culturais e relacionados à idade influenciam essa frequência”, explica o sexólogo Eduardo Siqueira Fernandes. Problemas de saúde ou financeiros e ambientes estressores, por exemplo, podem minar o desejo erótico. A idade também conta. Jovens entre 18 e 29 anos transam, em média, três vezes a cada sete dias. Já com adultos entre 30 e 39 anos a média cai para 1,6. O grupo etário compreendido entre 40 e 49 anos faz sexo 1,3 vez por semana. Os dados são de um estudo do Instituto Kinsey para Pesquisas em Sexo, Gênero e Reprodução, nos Estados Unidos, que se concentra especificamente nas relações heterossexuais de jovens adultos. 

Uma média que contrasta com as expectativas masculinas para o tema. Um estudo de 2016, que observou o perfil sexual dos brasileiros entre 18 e 70 anos que vivem em regiões metropolitanas, identificou que o sexo foi considerado importante ou muito importante para a harmonia do casal pela maioria dos homens (96,2%) e das mulheres (94,5%). Contudo, há uma divergência em relação à frequência. Enquanto a maioria deles considera que oito seria o número ideal de transas por semana – sendo que, desconsiderando a segmentação por idade, praticam o ato 3,15 vezes nesse período –, a maior parte delas respondeu que três encontros seriam satisfatórios – mas transam 2,65 vezes a cada sete dias, em média.  

Os dados são do Mosaico 2.0, do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP). Considerando as estimativas médias, a discrepância permanece sensível: o número ideal para eles seria de 6,48 relações semanais e, para elas, 4,58. 

“Notamos que as perspectivas do que é ou não prioridade variam de acordo com o gênero. Para os homens, a quantidade aparece como algo importante, mesmo que a qualidade seja duvidosa. É algo que revela um comportamento social: muitos querem poder dizer que transam muito, algo que está relacionado a um exercício de se sentir poderoso”, analisa Fernandes.  

Para as mulheres, por outro lado, o número de vezes não é tão importante. “Dentro dessas construções sociais, as mulheres tendem a valorizar mais a qualidade das relações sexuais. Para elas, que costumam acumular mais tarefas, cumprindo jornada profissional e doméstica, o importante é que as relações sejam prazerosas, mesmo que em um número menor. É mais qualitativo que quantitativo”, pontua.  

Com o casamento, frequência sexual tende a diminuir 

Corroborando parcialmente a frase que abre esta reportagem, o casamento também tem influência direta na rotina sexual. O estudo do Instituto Kinsey apontou que, no contexto do matrimônio, 34% têm relações entre duas e três vezes por semana, 45% algumas vezes por mês, e 13% algumas vezes por ano. 

“Nos relacionamentos monogâmicos duradouros somos levados a crer que o outro vai estar ali e que vamos poder fazer sexo amanhã. Então, o estímulo diminui, e acabamos adiando a transa para atender outras prioridades, como o cuidado com a casa ou das contas. Além disso, tem as pequenas brigas que acabam desgastando a relação”, comenta o sexólogo Eduardo Siqueira Fernandes. “Nas relações não monogâmicas e entre pessoas solteiras, o novo sempre estimula, então o sexo é mais frequente – o que não significa que as transas serão sempre boas”, diz. 

Quando a baixa frequência se torna um problema para a harmonia do casal, Fernandes sugere um esforço para incluir novidades na relação a partir de iniciativas simples. “Quando começamos um relacionamento, costumamos sair de mãos dadas, caminhar e frequentar bares ou sorveterias juntos... Nos relacionamentos longos acabamos deixando de fazer (esses programas) e paramos de criar situações que vão surpreender o outro”, assinala, reforçando que o desejo erótico pode ser acentuado com a inserção de uma rotina mais ativa. 

Felicidade. Eduardo Siqueira Fernandes acredita que ler o sexo por um viés quantitativo pode levar a uma negligência em relação à qualidade dessas relações. Além do mais, não parece verdade que uma frequência maior signifique um relacionamento melhor: uma pesquisa de 2015 da Universidade Carnegie Mellon, nos Estados Unidos, indica que, para casais heterossexuais de 35 a 65 anos, o esforço em aumentar o volume de sexo não implicou em melhores níveis de percepção de felicidade.