Mesmo cientes da importância da prática de atividades físicas para a saúde, muitas pessoas relatam ter dificuldade de conciliar os exercícios com suas rotinas diárias – e aqui estamos nos referindo aos afazeres profissionais e domésticos que, para alguns, seriam motivos suficientes para tirar qualquer disposição em realizar uma prática física. Tal situação é ainda mais complicada para quem lida com longos períodos de deslocamento e para aqueles que têm outras pessoas sob o seu cuidado – como mães e pais de crianças, que demandam muita atenção.
Diante desse cenário, no dia a dia, um lazer sedentário, como assistir a uma série, pode parecer mais convidativo, reservando-se apenas nos fins de semana um tempo livre para se exercitar. A grande dúvida era se esse hábito traria mesmo benefícios para a saúde, compensando a pouca constância de treinos nos dias úteis. Uma questão que agora foi parcialmente respondida por uma pesquisa, que trouxe boas notícias aos “atletas de fim de semana”. Ocorre que, pelo menos do ponto de vista cardiovascular, a resposta é que a estratégia funciona.
Os achados, publicados em julho no periódico científico “Jama”, são de um estudo que recorreu a um grande banco de dados do Reino Unido que reúne cerca de meio milhão de pessoas, de 40 a 69 anos, acompanhadas desde 2006 para avaliação geral de saúde e fatores de risco para diversas condições. A partir desse arsenal de informações, os pesquisadores fizeram um recorte, analisando dados de um subgrupo de participantes que usaram um “acelerômetro” de pulso – capaz de medir a aceleração e a força com objetivo de avaliar o comportamento desses voluntários em relação às atividades físicas.
A partir desse levantamento, que considerou dados de aproximadamente 100 mil indivíduos, os estudiosos identificaram que 42% deles praticavam pelo menos 150 minutos por semana em um ou dois dias. O grupo foi categorizado como “guerreiros do fim de semana”. Outros 24%, classificados como “ativos regulares”, se exercitavam por pelo menos 150 minutos ao longo da semana. Por fim, os demais 34%, chamados de “inativos”, realizavam menos de 150 minutos de atividade física moderada a vigorosa por semana. Em seguida, o histórico cardíaco foi avaliado, comparando-se os resultados entre os três grupos identificados.
Os resultados encontrados foram surpreendentes. Ainda que se trate de um estudo observacional – ou seja, que não propõe nenhuma intervenção nos hábitos dos participantes, tendo como objetivo principal gerar hipóteses para que futuramente novas pesquisas aprofundem o entendimento sobre o assunto –, os pesquisadores concluíram que tanto os “guerreiros do fim de semana” quanto os “ativos regulares” apresentaram um risco cardiovascular similar, e ambos os grupos tiveram um risco menor em comparação às pessoas inativas.
Achados são importantes
Ao desafiarem a crença comum de que apenas o exercício distribuído ao longo da semana é benéfico para a saúde cardiovascular, essas descobertas são encaradas com otimismo por Flávia Coimbra Pontes Maia, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia – Regional Minas Gerais. “São dados importantes para entendermos que podemos nos beneficiar da prática de atividade física mesmo quando, seja por condições de trabalho e rotina, seja por outras condições de saúde, não conseguimos atender àquelas tradicionais recomendações de 150 a 300 minutos de exercícios moderados ao longo de três a cinco vezes por semana”, examina.
“Obviamente a constância e regularidade são importantes para a manutenção de uma vida saudável de uma forma geral, mas este estudo mostra que fazer atividades físicas apenas aos fins de semana, por exemplo, já é um bom começo”, complementa, alertando que, para além dos treinos, é importante que as pessoas busquem ser ativas fisicamente no dia a dia. “Ou seja, elas devem caminhar mais e subir escadas, devem se levantar e dar pequenas voltas depois de passar muito tempo sentadas…”, recomenda. Nesse sentido, ela lembra que os exercícios são importantes do ponto de vista do condicionamento cardiovascular, além de trazerem outros benefícios, como o ganho de força, mas salienta que ser ativo já é suficiente para produzir uma melhora na qualidade de vida e no bem-estar.
Riscos de lesões
Flávia Maia assinala que, apesar de as preocupações com os exercícios de fim de semana estarem associadas à maior incidência de lesões osteomusculares, o estudo constatou que risco similar foi observado nos dois padrões de exercícios. “O mais importante é ressaltar que o começo deve ser gradual, conforme as limitações físicas e cardiovasculares individuais, e cada um deve respeitar os limites do seu corpo”, pontua, dizendo que o importante é dar o primeiro passo.
“Comece com menos tempo, menos intensidade e vá tentando atingir essas metas ao longo do treinamento, com constância e regularidade. Se você só tem tempo no fim de semana, já é um bom começo. Quem sabe em outro momento você não consegue distribuir melhor seus treinos, aumentando o tempo de atividade e diversificando os exercícios?”, incentiva. Em seguida, ela pondera que uma avaliação médica das condições de saúde e a orientação de um profissional de educação física são importantes para minimizar as chances de intercorrências.
Diversifique
A endocrinologista ressalta que, embora o estudo em questão não tenha avaliado o tipo de exercício executado pelos pacientes, é possível dizer, com base em outras pesquisas sobre o tema, que, ao se pensar em uma série de treinos, o ideal é diversificar as práticas para obter melhores resultados.
“O mais indicado é a combinação de treinos aeróbicos, que melhoram o condicionamento cardiovascular, com treinos de força”, sugere Flávia Maia. “Temos que fazer exercícios de força, como a musculação e os exercícios localizados, para envelhecermos capazes de manter uma boa postura, com equilíbrio e força para exercer nossas atividades diárias, de forma que consigamos amarrar os cadarços, nos levantar sozinhos de uma cadeira ou carregar uma sacola de supermercado”, enumera.