Saúde

Wegovy: saiba como o medicamento pode revolucionar a luta contra a balança

Especialistas tiram dúvidas sobre a nova injeção aprovada pela Anvisa que traz esperança para o tratamento da obesidade


Publicado em 10 de janeiro de 2023 | 05:30
 
 
 
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Com problemas de sobrepeso desde a infância, Maria da Silva (nome fictício), conta que já experimentou de tudo na luta contra a balança. 

“Fiz tanta dieta na vida que às vezes até me perco: regime das proteínas, do tipo sanguíneo, da Beyoncé e até mesmo o tal do jejum intermitente”, revela a auxiliar de enfermagem, de 38 anos. 

Depois de muitas tentativas e inúmeros remédios, ela decidiu recorrer à cirurgia bariátrica em 2017. Um ano e meio após o procedimento, tinha conseguido perder 35 kg. 

“Fiquei muito contente, mas minha alegria durou pouco. Achei que ia ficar magra para o resto da vida e voltei a comer de tudo. De lá para cá engordei quase a metade do que tinha ido embora. Foi decepcionante”, lamenta.
 
Apesar do revés, Maria segue obstinada na busca de uma solução que a ajude a chegar ao peso ideal. 

“Não posso desistir porque é uma questão de saúde, né? Estou superempolgada com essa nova injeção que está famosa no TikTok agora. Se funcionar mesmo, eu pago qualquer valor por ela. Faço até dívida”, diz. 

Maria se refere ao Wegovy, nome comercial para a semaglutida 2,4 mg, primeiro medicamento injetável de uso semanal para o tratamento da obesidade que foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no último dia 2 de janeiro.

Fabricado pela Novo Nordisk e comercializado nos Estados Unidos desde 2021, o fármaco tem sido apontado por muitos especialistas como um importante aliado no combate ao excesso de peso corporal. 

Mas para além de sua toda fama, qual é a verdadeira eficácia dessa medicação? 

“A semaglutida mostrou nos estudos clínicos uma média de perda de peso em torno de 17%, e até um terço dos pacientes no programa conseguiu um resultado em torno de 20%. Outras drogas testadas ficam entre 5-10%. Até o momento, ele é o medicamento aprovado com maior percentual de perda de peso”, explica Flávia Coimbra Pontes Maia, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia – Regional Minas Gerais (SBEMMG). 

Inicialmente, a semaglutida foi introduzida no mercado para tratar o diabetes tipo 2, mas acabou surpreendendo e se mostrando eficaz também para fins de emagrecimento. 

“Ela age como um hormônio produzido no intestino, chamado GLP1, que atua no aumento da produção de insulina pelo pâncreas e por isso é usado no tratamento do diabetes. Além disso, retarda o esvaziamento do estômago e opera no sistema nervoso central dando uma sensação de saciedade”, enfatiza Flávia. 

Os resultados têm sido tão otimistas que o medicamento pode se tornar uma opção viável para a cirurgia de redução de estômago no futuro, dizem estudiosos. 

“A bariátrica possui mais de uma técnica disponível e pode atingir de 25 a 30% de perda ponderal entre o primeiro e segundo ano de pós-operatório", ressalta Ana Paula Borges Santos, médica endocrinologista com mestrado pela UFMG.

Ela cita, porém, que há um novo grupo de drogas já disponíveis como a semaglutida e a terzipatide – que ainda não é vendida por aqui –, que demonstram melhores resuldatos em estudos: uma perda de 25% de peso ou mais em cerca de 36% dos participantes testados.

"Sendo assim, esses remédios poderão algum dia ser uma alternativa para alguns pacientes em lugar da cirurgia”, defende.

Uso e efeitos colaterais 

É importante ressaltar, contudo, que o uso do Wegovy deve ser feito somente com prescrição e acompanhamento médico. 

“Ele deve ser tomado conforme orientação de um médico especializado. O uso indiscriminado pode gerar alteração do trânsito intestinal: náuseas intensas, diarreia, vômitos e risco de pancreatite, especialmente em pacientes que utilizam algumas classes medicamentosas e consomem álcool”, alerta a nutricionista esportiva e comportamental Ruth Egg. 

A semaglutida é indicada para indivíduos com Índice de Massa Corporal (IMC) acima de 27 ou 30 e que sofram de doenças relacionadas ao excesso de peso, como cardiopatias e diabetes. 

“Seu principal benefício está na perda sustentada de peso. Vale frisar que uma diminuição na ordem de 10% já é muito importante para reduzir os danos causados pela obesidade”, realça Flávia Coimbra Pontes Maia. 

Entretanto, a médica adverte que se for usado de maneira indiscriminada, o remédio pode aumentar o risco de eventos adversos na saúde além de dar uma falsa sensação de que o tratamento contra a obesidade pode ser algo simples.

"É um medicamento indicado para o tratamento de uma doença crônica. Não é para ser usado para perder uns quilinhos a mais que ganhamos nas festas de final de ano", admoesta.

Leve no corpo, pesado no bolso 

Queridinho das celebridades nos EUA – com fãs convictos como o bilionário Elon Musk –, o Wegovy ainda não teve seu preço definido pela Anvisa. A expectativa, porém, é que ele chegue às prateleiras brasileiras com um valor tão salgado quanto o da América do Norte, onde o tratamento não sai por menos de R$ 6.000 ao mês. 

Aqui no Brasil, o Saxenda (liraglutida), que é outro medicamento já aprovado na mesma categoria e tem ação semelhante, embora seja aplicado diariamente, custa cerca de R$ 600 por embalagem com três doses.

“Essas medicações costumam ser mais caras para segurar um pouco do uso indiscriminado”, observa Ruth Egg. 

Ana Paula Borges Santos concorda e adiciona. “O custo deve ser ponderado por nós médicos para a prescrição individual, mas a possibilidade do uso de drogas novas com boa resposta terapêutica, ainda que caras, melhora o tratamento de um grupo de pacientes de forma imediata”, informa a médica. 

Novo estilo de vida 

Ainda que os efeitos da semaglutida sejam considerados expressivos, é imperativo que se façam ajustes consideráveis no estilo de vida para se livrar de vez dos quilos a mais. 

“Esses fatores são estratégias primordiais. A medicação pode ajudar, mas o que fará a pessoa manter o peso perdido é a alimentação saudável e o exercício. Não tem jeito”, aconselha Ruth. 

E esses hábitos precisam ser feitos de forma adequada e mantidos por toda a vida. 

“O uso de drogas nunca substitui a modificação de estilo de vida que inclui boa alimentação, assim como atividade física regular, especialmente para que se mantenha a perda ponderal que for obtida com o auxílio de drogas efetivas e prescritas de forma adequada por médicos”, indica Ana Paula Borges Santos. 

Remédio não faz milagre 

Ainda que seja comum o surgimento de drogas que prometem efeitos positivos na luta contra a balança, todos os médicos entrevistados concordam que nenhum deles tem poder milagroso. 

“Não existe milagre nem mágica. Deve-se levar a sério o tratamento de uma doença crônica como a obesidade que pode ocasionar problemas gravíssimos para a saúde como a hipertensão, doenças do coração e até mesmo alguns tipos de câncer”, salienta Flávia Coimbra Pontes Maia. 

Ela lembra ainda que esse embate contra o peso envolve não apenas medicamentos, mas sim acompanhamento médico e muita disciplina. 

“Só assim vamos conseguir reduzir o estigma do tratamento da obesidade e ajudar pessoas que sofrem com essa enfermidade a procurem ajuda sem medo de sofrer preconceito da família, amigos e até mesmo da própria equipe de saúde. Precisamos também que os órgãos governamentais forneçam condições para maior acesso de toda a população a tratamentos eficazes. Quem sabe assim possamos um dia erradicar essa epidemia mortal?”, arremata.

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