Não é de hoje que Bruno Gagliasso e Giovanna Ewbank se habituaram a compartilhar aspectos de sua vida pessoal com o público, o que justifica o rótulo de celebridades conferido ao casal. No início do mês, à frente do programa “Surubaum”, veiculado no YouTube, eles divergiram acerca da prática da masturbação. Bruno considerou o ato “solitário”, enquanto Giovanna saiu em defesa do gesto como “liberdade pura”. A repercussão em torno do tema, sobretudo nas redes sociais, com opiniões acaloradas e divergentes, deixa claro que tal mobilização revela, no fundo, a permanência do tabu.
Para a sexóloga e psicóloga Bruna Belo, o “autoconhecimento sexual é super importante para qualquer pessoa”. “A masturbação individual é uma prática de auto-estimulação fundamental para que a pessoa conheça o próprio corpo e entenda qual estímulo prefere, que tipo de toque, qual a intensidade, a velocidade, o ritmo para manter ou reduzir a excitação. A masturbação é como se fosse um treino para a pessoa entender melhor o próprio corpo”, resume. Segundo ela, esse arcabouço prático tende a gerar “impactos positivos na vida sexual da pessoa, inclusive em relação à autoestima e autoconfiança que ela passa a exibir dentro do relacionamento”.
Bruna defende que a masturbação individual pode abrir as portas para fantasias sexuais e jogos eróticos em parceria. “Vamos supor que a pessoa se masturba escutando um áudio erótico. Ela pode transpor isso para o relacionamento, ou uma determinada posição, um vídeo, uma música, uma velocidade, um sex toy”, enumera. Com a pessoa ciente das próprias preferências, a especialista ressalta que aquilo que já é excitante sozinho pode ser mais ainda em companhia. “A partir daí, as pessoas podem brincar, inclusive, com a masturbação mútua e também facilitar a negociação na hora do sexo para o casal”, diz, enaltecendo as potências da “dança do acasalamento”.
Abra suas asas
A sexóloga não tem dúvidas de que os benefícios da masturbação podem atingir problemas sensíveis, como os relacionados a ejaculação precoce e dificuldade de atingir o orgasmo. “Esse homem que sofre com a ejaculação precoce muitas vezes vai estar sem um entendimento do processo excitatório, e a masturbação pode auxiliá-lo a compreender melhor as fases da excitação e suas respectivas oscilações. O mesmo vale para as mulheres com dificuldade de chegar ao orgasmo”, pontua. Essa “percepção corporal” deve indicar a elas caminhos e atalhos próprios que as levem ao destino almejado. “A mulher pode explorar com a masturbação se gosta mais do toque no clitóris, em um lado da vulva ou próximo à virilha, etc.”, sugere Bruna.
Para aquelas mais tímidas, ela orienta que comecem por um toque despido de conotação erótica, com o intuito de “conhecer melhor a região, colocar um espelhinho, se observar”. “Muitas mulheres com queixa de orgasmo têm essa falha de autoconhecimento sexual ou uma educação sexual muito punitiva”, constata. Na base dessa dificuldade ela identifica um problema de ordem cultural, o que pode ter determinado as percepções diferentes de Bruno e Giovanna sobre a masturbação. “As mulheres, por muito tempo, tiveram uma educação sexual muito mais reprimida e colocada no lugar de erro e de culpa do que os homens, que, geralmente, têm mais facilidade para falar e explorar a masturbação, é uma diferença cultural”, analisa Bruna.
A ressalva da especialista recai sobre “a forma” dessa exploração, muitas vezes relacionada a padrões impostos pela indústria pornográfica. Ela avalia que, embora a equidade sexual entre homens e mulheres ainda não tenha chegado, esse cenário vem mudando. “As mulheres estão tendo mais acesso a informações, mas isso ainda depende muito do grupo social no qual ela está inserida, e, por vezes, incidimos em um lugar de cobrança em que é preciso ter orgasmos múltiplos ou realizar ‘trocentas’ posições, e aí vem aquelas formas mágicas sobre ‘como enlouquecer um homem na cama’. Acredito que não é por aí, vai muito de pessoa para pessoa. Mais do que conhecer o órgão genital, nós estamos falando de conhecer o próprio corpo”, assinala.
Solte suas feras
Bruna fala com todas as letras: “A excitação e o prazer começam no cérebro”. “Não adianta a pessoa compreender seus estímulos, o que pode ser gostoso naquela região, se ela não estiver erotizando o toque, se estiver envolta em questões da vida que atravessam e atravancam aquele momento”, sublinha. Logo, para soltar suas feras e se permitir uma “busca curiosa pelo corpo”, é preciso sintonizar corpo e alma. “Muitas pessoas sentem culpa e vergonha em relação à masturbação, que entra em conflito com outros valores que elas possuem”, corrobora a sexóloga. Uma estratégia utilizada por ela para superar esse bloqueio é “ir adaptando essa linguagem”.
“Se a pessoa tem uma crença religiosa muito forte, devemos falar em um exercício de auto-toque que é importante para a saúde, ou seja, modificar o discurso levando a perspectiva da ciência e os benefícios apontados para a saúde sexual como um todo”, conta. O empreendimento serve também para “desmistificar ideias” muitas vezes arraigadas ao imaginário popular. “Tanto a masturbação quanto o sexo geram muita liberação de hormônios para o prazer e o bem-estar, como dopamina, endorfina, oxitocina, e tudo isso vai reduzir a tensão física e o estresse mental”, destaca Bruna, que se dedica então a responder “a pergunta de milhões”, como ela define em seguida.
“As pessoas ficam muito pilhadas em relação a números, se existe uma frequência saudável para a masturbação, mas isso varia de pessoa para pessoa. O que existem são elementos indicativos. Se a masturbação está sendo utilizada compulsivamente, ou seja, sem que eu tenha o controle sobre ela, para regular emoções negativas, então temos um problema. Se esse excesso leva a pessoa a se atrasar para compromissos, evitar a parceria ou deixar de se encontrar com os amigos é sinal de que ele se tornou disfuncional”, observa Bruna. Na opinião da sexóloga, é essencial que a pessoa identifique “outras fontes de prazer em sua vida”, para não ficar refém da masturbação.
Ampliando o leque
Para a sexóloga Bruna Belo, a masturbação pode ampliar o leque das práticas sexuais do casal e tornar esse diálogo mais íntimo e prazeroso. “A partir do momento que cada pessoa possui um bom autoconhecimento de suas preferências sexuais e decide compartilhá-lo com a parceria, esse momento de troca, conversa e diálogo intensifica a relação”, aposta. Esse vínculo aumentado se estenderia para esferas além do sexo, sobretudo a emocional. “Mas é importante saber como cada casal enxerga e lida com a masturbação, não é uma regra”, pondera Bruna.
Todavia, “criar essas pontes de intimidade e abrir espaço para o diálogo ao compartilhar fantasias e gostos” tem tudo para libertar o casal do primado da penetração. “A tendência é ampliar o repertório sexual e instigar novas práticas, brinquedos eróticos, jogos, promovendo essa cumplicidade e aproximando o casal”, reforça a especialista. Ao praticar esse ritual juntos, outra consequência comum seria a da “redução da vergonha”. “Esse conhecimento pode enriquecer a vida do casal, que não fica mais preso a convenções que podem ser muito engessadas”, arremata Bruna.