Arrolada inicialmente no boletim de ocorrência como testemunha, Terezinha Pereira dos Santos, de 53 anos, que chegou a ser apontada como "avó" dos garotos de 6 e 9 anos que foram trancados em um apartamento no bairro Lagoinha, na região Noroeste de Belo Horizonte, agora é considerada uma investigada pela Polícia Civil. A informação foi confirmada nesta sexta-feira (24) a O TEMPO por uma pessoa ligada à investigação. 

De acordo com a fonte ouvida, a mulher seria a proprietária do lote no bairro Imperador, em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana da capital mineira, onde a mãe das crianças,. uma mulher de 30 anos, e três de seus cinco filhos estariam vivendo há cerca de 1 ano e meio.

Lá, existia uma espécie de comunidade onde viviam várias pessoas, entre elas, o homem de 31 anos que foi apontado pela mãe das crianças como seu namorado. O suspeito, que está preso desde o início do mês sob suspeita de envolvimento nos maus-tratos contra o garoto de 4 anos que morreu, é filho de Terezinha. 

Ainda segundo a fonte de O TEMPO, mãe e filho utilizavam diversos nomes na região. Os vizinhos conheciam a Terezinha como "Maria Rosa" e o filho dela como "Zé Geraldo". A reportagem também esteve no local e vizinhos contaram nunca ter visto a mulher de 30 anos e os filhos dela no bairro. 

A Polícia Civil segue fazendo diligências em São Joaquim de Bicas, mas esclareceu que, no imóvel onde os crimes teriam ocorrido, ninguém mais está morando. Terezinha é apontada pela investigação como a possível responsável por manter as pessoas vivendo nessa "comunidade". 

No dia da prisão da mãe do garotinho de 4 anos que morreu, as duas filhas mais novas da mulher, de 1 e 2 anos, foram encontradas no local pela polícia. As garotinhas estavam com Terezinha, que, cerca de 2 semanas depois, foi vista entrando no apartamento onde os outros dois meninos acabaram resgatados. Na ocasião, após a prisão da mãe delas, as meninas acabaram entregues ao Conselho Tutelar - também com sinais de desnutrição

Na quinta-feira (23), O TEMPO adiantou a informação de que mãe e filhos, que são de Valparaíso, em Goiás, teriam sido abordados por Terezinha ao chegarem na rodoviária de BH. Ela teria se passado por assistente social e oferecido uma moradia para ela. 

De acordo com os advogados da mãe das crianças, a mulher estaria sendo mantida no local em condições análogas à escravidão e, inclusive, seria vítima de abuso sexual no local. A defesa afirma que ela trabalhava em troca de comida no local. Eles também pedirão novos exames na mulher, que segue presa

A reportagem tentou contato com o advogado que representa o filho da nova suspeita, porém, ele não respondeu aos contatos e nem atendeu ao telefone. 

Entenda o caso

  • O resgate

As crianças, de seis e nove anos, foram resgatadas na terça-feira, 21 de fevereiro, trancadas em um apartamento do bairro Lagoinha, na região Noroeste de Belo Horizonte. Segundo a Polícia Militar, elas estavam com sintomas de desnutrição e febre. Elas ficaram trancadas por três dias, sem alimentação.  

Conforme informado pela polícia, as vítimas estavam magras, usavam roupas sujas e o ambiente onde elas estavam era escuro e encardido. Após o resgate, as crianças foram encaminhadas para o hospital Odilon Behrens, no bairro São Cristóvão. 

  • A denúncia

A denúncia foi feita por uma vizinha, a vendedora Poliana Pereira dos Santos, de 37 anos. Ela acionou a polícia depois que percebeu que elas estavam sozinhas no apartamento e sem o auxílio de familiares. Ela tentou alimentar as crianças por um buraco na parede do apartamento. A porta da residência onde elas estavam foi trancada com um cadeado e correntes. 

  • O local em que as crianças estavam

Conforme a denunciante, no local em que as crianças estavam, havia uma vasilha de comida com bicho. Em entrevista ao TEMPO, ela descreveu o cenário. "Encontramos muita sujeira, o cheiro era tão forte que, quando os policiais abriram a porta, nem eles aguentaram. A gente se emocionou muito quando vimos os dois, com os bracinhos fininhos, um deles sem conseguir nem falar. Aí começamos a chorar. Aqui tudo sujo, tudo podre, vasilha com bichos, colchão no chão", relatou.

  • Menino sentiu cheiro de churrasco e pediu comida

Uma das crianças resgatadas pediu um pouco de comida para a vizinha depois que sentiu o cheiro do churrasco que era feito por ela. "Meu sobrinho estava andando de bicicleta aqui e, pelo buraquinho, ele viu e pediu um pouco de comida. Meu sobrinho, que tem mais ou menos a idade dele, veio até mim e contou. Fui até a porta e vi os dois, um deles disse que estava com fome e pediu churrasco para ele e o irmão. Pedi para ele abrir a porta, e ele falou que podia ser por ali mesmo. Falei que a vasilha não cabia no buraco. Ele, então, sugeriu que eu colocasse em uma sacolinha e disse 'eu estou com muita fome, me dá churrasco'",  detalhou a vendedora Poliana dos Santos, de 37 anos, responsável por fazer a denúncia para a polícia.

A criança disse para a vendedora que elas estavam acompanhadas da avó. No entanto, o menino voltou a pedir comida durante a noite daquele dia, o que intrigou a vizinha e indicou de que elas estariam sozinhas.

  • Os responsáveis pelas crianças

A investigação apontou que as crianças são filhas de uma mulher, de 30 anos, que foi presa por maus-tratos a outro filho, morto no último dia 6 de fevereiro. O caso foi registrado em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana da capital. De acordo com o boletim de ocorrência, no início do mês, a mulher levou o filho de 4 anos ao médico, mas a criança já estava morta. O menino chegou com lesões no olho, inchaço no pé e queimaduras no tornozelo.

O pai biológico das crianças, segundo a apuração do caso, teria morrido de Covid-19, em 2020. Em depoimento à polícia, uma das vítimas resgatadas no apartamento, na última terça-feira (21), informou que elas haviam vindo de São Joaquim de Bicas, na semana anterior ao resgate, e que a avó teria passado a noite de sábado (18) com elas, mas não retornou. 

  • Crianças resgatadas possuem duas irmãs que estão em abrigo

Duas meninas, de 1 e 2 anos, que são irmãs dos meninos resgatados na última terça-feira, dia 21 de fevereiro, no bairro Lagoinha, estão em um abrigo, sob a tutela do Estado. A informação foi confirmada ao TEMPO pelo Conselho Tutelar de São Joaquim de Bicas, na região metropolitana de Belo Horizonte. 

As meninas foram encaminhadas para unidade no dia 6 de fevereiro, depois que a mãe delas foi presa após levar um de seus cinco filhos, um garoto de 4 anos, com ferimentos para uma unidade hospitalar da cidade. O menino acabou morrendo devido à gravidade dos ferimentos que sofreu. No momento da prisão, a mulher teria omitido a existência dos dois filhos mais velhos, de 6 e 9 anos, resgatados na capital mineira. 

  • A investigação

A Polícia Civil abriu um inquérito para investigar o caso e, até o momento, a mulher que estaria cuidando e teria abandonado as crianças no local ainda não foi identificada e presa. O Ministério Público de Minas Gerais informou, por meio de nota, que o caso é investigado e que as informações estão sob sigilo.