Após o governo Romeu Zema (Novo) perder o prazo, a regulamentação do ICMS da Educação começa a caminhar na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Em despacho na última terça-feira (23), o presidente Tadeu Martins Leite (MDB), o Tadeuzinho, encaminhou a proposta, que deveria ter sido regulamentada até agosto de 2022, para as comissões de Constituição e Justiça, de Educação e de Fiscalização Financeira e Orçamentária. 

Quando foi instituído ainda em 2020, o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais (Fundeb) - Emenda Constitucional 108 - aumentou de 2% para 10% o mínimo de recursos de ICMS que o Estado deve repassar aos municípios conforme indicadores de melhorias de resultados de aprendizagem e de aumento da equidade nas redes municipais de ensino.   

Porém, a discussão é de onde sairão os recursos para compensar os oito pontos percentuais de aumento do mínimo do ICMS da Educação. “O cálculo é muito complexo. A gente tem que lembrar que os oito pontos percentuais estão dentro do ICMS Solidário. (...) Dinheiro novo não existe. É o mesmo dinheiro”, afirmou o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Marcos Vinicius Bizarro.

O ICMS Solidário corresponde à parcela de 25% da arrecadação de ICMS do Estado de Minas Gerais repassada às prefeituras - depois de regulamentado, o ICMS Solidário vai subir para 35%. Antes conhecido como Robin Hood, o ICMS Solidário é fatiado entre os municípios de acordo com 17 critérios diferenciados definidos pela legislação estadual - 18.030/2009 -, desde a cota mínima a que cada cidade tem direito até a cota para aquelas que têm penitenciárias ou são mineradoras. 

Logo, o aumento do mínimo do ICMS da Educação de 2% para 10% vai demandar esforços da ALMG por um consenso para a redistribuição dos recursos. “Quando começa a discussão de onde vão sair os oito (pontos percentuais a mais) para botar na educação, começa o conflito. Podemos tirar da cota do meio ambiente, da infraestrutura, das cidades com estabelecimentos penitenciários, do patrimônio cultural etc.”, explicou Bizarro. 

De acordo com o presidente da AMM, “alguém tem que perder para que alguém possa ganhar”. “Se eu disser que não haverá impactos (para alguns municípios), eu estaria sendo mentiroso”, pontuou Bizarro, acrescentando que, teoricamente, quem perde são os municípios de médio e grande porte. “Não que eles perdem. Eles deixam de arrecadar um dinheiro que pode ser utilizado de forma livre para passar a arrecadar um dinheiro que necessariamente tem que ser utilizado na educação”, observou.

Em recente entrevista à FM O TEMPO, o próprio Tadeuzinho, que anunciou que a ALMG se debruçaria sobre a regulamentação do ICMS da Educação quando ocupou interinamente o cargo de governador, admitiu que a discussão é complexa. “Porque mexemos em alguns critérios”, apontou o presidente da ALMG. “Mas é fundamental que façamos a discussão, escutando principalmente prefeitos de cidades grandes a cidades pequenas”, disse o deputado.

Perda de recursos da União

A ausência de regulamentação levou os municípios a perderem recursos do ICMS da Educação a que teriam direito, já que, até que haja a atualização da legislação estadual, as cidades não poderão disputar com aquelas de outros estados a complementação Valor Aluno Ano por Resultados (Vaar), que correspondem a 2,5% dos 23% dos recursos aportados pela União no Fundeb. 

Os recursos serão distribuídos pela primeira vez pela União durante o exercício financeiro de 2023. “É o único dinheiro novo que existe”, observou Bizarro. “De acordo com os indicadores de 2022, 600 e poucos municípios qualificados estariam qualificados para receber o Vaar e não vão receber”, disse o presidente da AMM, que, questionado, não soube estimar quanto as prefeituras deixaram de receber, “porque o novo governo federal ainda não conseguiu se adaptar” ao novo Fundeb.

De acordo com um cálculo apresentado pela AMM em dezembro passado, os municípios poderiam deixar de receber R$ 1,1 bilhão por causa da ausência de regulamentação, o que foi contestado pelo secretário de Estado de Educação, Igor Alvarenga. De acordo com ele, o montante, na verdade, seria o valor do ICMS da Educação que seria redistribuído com o aumento do mínimo de 2% para 10%. A Secretaria de Educação estimou que os municípios deixariam de receber R$ 160 milhões de complementação federal.

A postura do governo de Minas levou o Ministério Público Federal (MPF) a pedir à Procuradoria-Geral da República no último mês de abril que denuncie o Estado ao Supremo Tribunal Federal por “omissão em editar lei estadual para regulamentar o ICMS Educacional”. De acordo com o MPF, a “omissão viola a Constituição Federal e traz prejuízos financeiros à educação pública mineira”.

Regulamentação em banho-maria em ano eleitoral

A complexidade, somada à cisão entre Zema e o então presidente da ALMG, Agostinho Patrus, foi o que deixou a regulamentação do ICMS da Educação em banho-maria na Casa durante o ano passado. Como os custos políticos de uma redistribuição de recursos aos municípios poderiam ser caros não só ao governo, mas também aos deputados em ano eleitoral, os projetos de lei (PLs) que tratam sobre a regulamentação sequer caminharam, apontaram deputados.

A presidente da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia, Beatriz Cerqueira (PT), afirmou que diminuir o problema a 2022, ano eleitoral, ignoraria que o governo poderia ter regulamentado o ICMS da Educação antes. “A iniciativa de puxar essa discussão deveria ter sido politicamente do governo do Estado e não de deputados da ALMG. O governo Zema não tomou iniciativa. Isso é gravíssimo”, questionou a deputada.

Beatriz, aliás, é autora de um dos PLs encaminhado por Tadeuzinho às comissões de Constituição e Justiça, Educação e Fiscalização Financeira e Orçamentária que propõem a regulamentação. “Eu só apresentei (o PL) decorridos os dois anos e a partir de uma interlocução com o Tribunal de Contas do Estado e com o Ministério Público, que passaram o ano de 2022 cobrando a regulamentação”, observou a presidente da Comissão de Educação.

O PL de Beatriz está anexado a outro, sobre o mesmo, mas de autoria do deputado Zé Guilherme (PP). A reportagem procurou o deputado, mas não foi atendida. O governo de Minas também não respondeu os questionamentos até a publicação da matéria.