Opção por uma comunicação menos agressiva e reorganização interna para impulsionar o surgimento de novas lideranças para voltar ao poder em 2026 e levar prefeituras no ano que vem. Essa é a avaliação de interlocutores e deputados mineiros sobre o atual momento da direita, após a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A avaliação dos parlamentares ouvidos pela reportagem é que falta à direita maturidade política para, se não alcançar uma unidade, ao menos ter um discurso mais unificado para evitar divergências.
Numa tentativa de encontrar novos líderes, parte dos políticos ouvidos pela reportagem aposta que o governador Romeu Zema (Novo) pode ser o expoente desta ala, enquanto outros ainda esperam um ressurgimento de Bolsonaro. Uma posição, porém, é coincidente: todos apostam numa direita ainda forte para os próximos anos, a partir da defesa do pensamento conservador.
O principal partido de direita hoje em Minas é justamente o PL de Bolsonaro: são 11 parlamentares na Câmara e outros nove na Assembleia. Para o deputado federal Lincoln Portela, que é vice-presidente da sigla em Minas, a direita conseguiu se mobilizar, mas precisa dar passos em direção a consolidação interna.
“A direita no Brasil já está estabelecida, a partir de um legado deixado por Bolsonaro. Agora, precisamos de uma organização. Tem deputado de direita que diverge do outro porque ele não é ‘Bolsonaro raiz’. O que significa ser ‘Bolsonaro raiz’? Alguns usam muito a palavra ‘traíra’, o que divide (a bancada). A esquerda nem sempre tem unidade, o PT não tem, mas os caras se arranham nas reuniões internas e saem com um discurso comum depois”, diz o parlamentar, que vai para o seu quarto mandato consecutivo no Congresso.
O cientista político e professor do Ibmec Adriano Cerqueira avalia que a direita está em crescimento no Brasil e também em Minas desde as manifestações de 2013. Para ele, o país dificilmente vai se ver longe do cenário polarizado.
“Dificilmente, quem votou em Bolsonaro no segundo turno vai migrar para Lula. É nesse sentido que os políticos de direita vão trabalhar, se o Bolsonaro sair candidato ou não. Acho que a polarização entre esquerda e a direita vai continuar no Brasil”, avalia o especialista.
Nos bastidores da direita mineira, interlocutores afirmam que Zema aposta na inelegibilidade de Bolsonaro para conquistar o eleitorado de direita. Esse movimento seria feito sem críticas abertas ao ex-presidente, mas com um discurso mais moderado. A chapa do ex-presidente Jair Bolsonaro e Braga Netto é alvo de 16 processos de Ação de Investigação Judicial Eleitoral no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e, caso haja condenação em algum deles, os dois podem ficar inelegíveis.
“Tanto Zema quanto Tarcísio têm condições de crescimento dentro do cenário nacional, mas ambos são mais moderados do que Bolsonaro. Quando falo em moderação, isso não é um elogio. O tempo dirá se eles desenvolverão a postura necessária para enfrentar os riscos terríveis que o esquerdismo representa para o país”, avalia o deputado estadual Cristiano Caporezzo (PL), novato na Assembleia e um dos bolsonaristas mais fiéis no Estado.
‘É difícil substituir Bolsonaro’
O professor titular do Departamento de Ciência Política e pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG Carlos Ranulfo não acredita que o governador Romeu Zema tenha força para assumir o protagonismo da direita no cenário nacional por não ter papel conciliador sequer na direita mineira.
“Acho que uma eventual candidatura do Zema em 2026 é um blefe no momento. Não vejo nele potencial para agregar a direita nacionalmente. Ele pode até ser candidato, mas dificilmente será o expoente da direita. O Bolsonaro causou uma reviravolta no sistema político brasileiro. É muito difícil substituí-lo. As coisas não são simples para o Zema, porque ele não tem esse perfil. É um governador técnico. Ninguém morre de amores pelo Zema”, diz.
Ainda na opinião de Ranulfo, as eleições municipais do ano que vem são chaves para a direita mineira.
“O Nikolas (Ferreira, deputado federal pelo PL) é um candidato muito competitivo. O Bruno Engler (deputado estadual pelo PL) também. Eles vão ganhar se saírem? Não sei, mas certamente serão competitivos. Você tem também a possibilidade de algum filho do Bolsonaro sair para prefeito do Rio. Então, você pode ter essa direita bolsonarista levando governos de grandes cidades brasileiras”, afirma o especialista.
Deputada estadual pelo Podemos, Lud Falcão acredita que Minas, a partir de Nikolas Ferreira e Zema, pode liderar a renovação da direita nacional. “A gente vê a construção de um governo sólido aqui em Minas Gerais, que pega tantos outros jovens e motiva (o surgimento de) outras lideranças”, afirma.
Tática passa por ampliar pautas
Se parte do PL se concentra na chamada pauta de costumes, aquela que trata de questões ligadas à família, outra parcela, a qual o deputado federal Samuel Viana pertence, defende um debate mais próximo da sociedade.
“O primeiro passo para a direita fazer um bom trabalho político é, em primeiro lugar, ampliar as discussões e os temas debatidos, não se atendo apenas às pautas de viés ideológico. Discutir o Orçamento e a responsabilidade fiscal, fomentar o agro, a indústria, o comércio e o desenvolvimento das pessoas mais carentes”, afirma.
Colega de Viana na Câmara, o deputado federal Pedro Aihara (Patriota) aposta que a saída é pela mudança de discurso. “O Brasil precisa se afastar dessa polarização. A gente tem esse caminho do meio, da discussão”, diz o parlamentar.
Irmão do senador Cleitinho Azevedo (Republicanos), o deputado estadual por Minas Gerais Eduardo Azevedo (PSC) concorda com Aihara. Apesar de não criticar Bolsonaro, ele pede a adoção de um discurso menos ofensivo e mais estadista da direita. “Os extremos sempre são prejudiciais. O bom funcionamento da política depende de saber usar o ponto de equilíbrio, mas defendendo sempre o conservadorismo. E, ao mesmo tempo, abordar esses valores de maneira mais técnica”, afirma.
Sobre o surgimento de novas lideranças políticas, o deputado federal Samuel Viana e Eduardo Azevedo pensam que ainda é cedo para discutir quem ocupará a posição de Bolsonaro, até mesmo se o ex-presidente realmente é carta fora do baralho.