Rubens Lessa Carvalho é presidente da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros de Minas Gerais (Fetram) *
O transporte público rodoviário e urbano é a espinha dorsal da economia mineira e brasileira, movimentando cargas e passageiros por todo o território nacional. A eficiência, segurança e sustentabilidade desse modal são cruciais para o desenvolvimento do Estado de Minas e do país.
No entanto, discussões recentes sobre o aumento do teor de biodiesel no diesel comercializado no Brasil, especialmente a proposta de elevação para 15% (B15), levantam sérias preocupações para o setor. A Federação das Empresas de Transporte de Passageiros de Minas Gerais (Fetram) reforça o posicionamento da Confederação Nacional do Transporte (CNT) de que a compatibilidade técnica operacional do combustível nos veículos de ciclo diesel é fundamental para garantir um transporte eficiente, sustentável e seguro.
Regulação do percentual de biodiesel
O percentual de biodiesel utilizado no Brasil é superior ao de muitos países desenvolvidos. Atualmente, o diesel comercializado no país contém 14% de biodiesel puro (B100) em sua composição, um dos maiores percentuais do mundo, e subirá para 15% em agosto. Em termos práticos, isso significa que o teor de B100 comercializado no país é 71,42% maior do que o combustível utilizado como referência nos testes de homologação em veículos da fase P8 do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve).
Essa desconexão entre as agendas regulatórias pode gerar desafios técnicos para o transportador. Comparativamente, o percentual de utilização do biodiesel em outros países é significativamente menor: Japão (5%),
Comunidade Europeia (7%), Canadá (2% a 4%). Mesmo países como os Estados Unidos variam entre 6% e 20%, e a Argentina utiliza 10% (B10), enquanto a Índia planeja 5% até 2030 (B5).
Estudos e a experiência prática do setor apontam para um cenário de potenciais problemas mecânicos, redução da eficiência energética dos veículos e, paradoxalmente, um possível aumento das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). Pesquisas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) evidenciam que teores acima de 10% de biodiesel resultam em aumento no consumo de combustível e, consequentemente, elevam os custos operacionais do transporte.
Uma sondagem da CNT em 2021, quando o teor de adição de biodiesel era de 13%, revelou que 60,3% dos empresários entrevistados relataram problemas mecânicos diretamente relacionados à mistura. As ocorrências mais frequentes incluíam: aumento da frequência de troca de filtros (82,7%), falhas no sistema de injeção (77,1%), aumento no consumo de combustível por quilômetro rodado (48,4%), paradas repentinas devido a falhas de sistema (44,6%), desgaste prematuro de peças do motor (44,2%) e falhas mecânicas em componentes eletrônicos (22,4%).
Impactos da mudança de teor dos combustíveis
Os impactos da elevação do teor de biodiesel vão além dos aspectos técnicos e operacionais. A medida traz consequências negativas tanto para o meio ambiente quanto para a economia. Os custos adicionais de manutenção dos veículos representam um encargo significativo para as empresas de transporte.
Ao utilizar combustíveis que diminuem a eficiência energética e elevam as despesas de manutenção, o custo para transportar qualquer item no país fica mais caro. Esses custos são repassados para o valor do frete e para as passagens, gerando um custo adicional que recai diretamente sobre o consumo das famílias brasileiras, impactando a inflação e o poder de compra da população.
Diante desse cenário, reafirmamos a necessidade de um debate amplo, inclusivo, com a participação de todas as partes interessadas e impactadas. É crucial que essa transição, embora possa trazer benefícios, seja responsável e transparente, sem comprometer a eficiência, a segurança e a economia do setor de transporte rodoviário e urbano, base essencial para o desenvolvimento do país.
(*) É também presidente do Grupo Saritur e do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros Metropolitano (Sintram).