Enquanto os usuários das rodovias que integram o Vetor Norte têm se queixado sobre a possível implementação de 13 pedágios com o projeto de concessão do Governo de Minas, prefeitos da região metropolitana têm se movimentado para tentar barrar a cobrança de tarifas. Das 13 prefeituras na área de abrangência da concessão, pelo menos seis já se manifestaram sobre o projeto. Destas, cinco demonstram ser contra.
Em Lagoa Santa e Pedro Leopoldo, há projetos de lei que proíbem a instalação de pedágios no perímetro urbano dos municípios. Breno Salomão (Cidadania), chefe do Executivo de Lagoa Santa, relatou a O TEMPO que as prefeituras não teriam sido ouvidas sobre o projeto. Em novembro, houve um encontro entre o Governo de Minas e os prefeitos para apresentação dos investimentos ao Vetor Norte, porém, ele diz ter sido pego “de surpresa” com a questão dos pedágios.
O prefeito de Santana do Riacho, Fernando da Farmácia (Republicanos) também cobra que as cidades sejam ouvidas antes da implementação das cobranças. Ele afirma que os moradores da cidade, uma das mais distantes da capital, serão os mais impactados porque arcarão com os custos de todo o trecho. Conforme Fernando, os prefeitos estão buscando agendar reunião com o Estado para debater novamente o problema. “Estamos muito preocupados.”
A prefeita de São José da Lapa, Márcia Lopes (PP), também se demonstra contra ao pedágio na MG-424, defendendo que o progresso seja alcançado “sem sacrificar a qualidade de vida” da população. Em postura semelhante, o prefeito Racly Andrade (Solidariedade), de Jaboticatubas, informou que um pedágio pode impactar no turismo na região e na locomoção dos moradores da cidade que utilizam a MG-010 diariamente.
Por outro lado, o prefeito de Capim Branco, Elvis Presley (PSD), diz ser a favor do pedágio por conta da necessidade de recuperação das vias na região. Entretanto, ele afirma que é preciso discutir melhor sobre as tarifas que serão cobradas.
O prefeito de Matozinhos, Italo Borges (PSD), optou por não se pronunciar, a princípio. A reportagem também tentou contato com os chefes dos Executivos de Confins, Santa Luzia, Vespasiano, Prudente de Morais, Belo Horizonte e Sete Lagoas, mas não obteve retorno.
Usuários reclamam de pedágios
Empresário do setor de construção civil em Contagem, Rodrigo Dias estranhou a quantidade de pedágios a serem instalados. Ele realiza viagens ao menos três vezes por semana aos municípios do Vetor Norte, e acredita que, somado à má condição das estradas que demanda manutenção constante dos veículos, o pedágio pode pesar no bolso. “Vai onerar ainda mais”, diz.
A advogada Gabriela Gomes, moradora de Lagoa Santa, também se demonstra contrária ao projeto. Ela transita frequentemente para Vespasiano a trabalho e para Belo Horizonte a lazer, e vê como um “descaso” o fato da opinião da população não ter sido levada em conta.
Já a enfermeira Veridiana Thaisa Soares, que faz o trajeto entre o bairro Planalto, em Belo Horizonte, até Santa Luzia, acredita que não há “necessidade alguma” de um pedágio no local. “Não faz sentido a gente ter que pagar por isso”, diz.
O professor universitário Idalmo Montenegro, de 57 anos, também percorre a rodovia entre a capital e Santa Luzia e diz que, por se tratar prioritariamente de trânsito local, a decisão de implantar pedágios é ruim. “Acho que nas grandes rodovias, de grande movimento, é ok”, contrapõe.
Funcionamento
Com a concessão das rodovias, o pedágio funcionará como um sistema de livre passagem (free flow), ou seja, não serão instaladas praças convencionais, mas dispositivos eletrônicos que indicam o veículo e a tarifa devida. Cara pórtico possui um valor de tarifa, definida a partir da distância existente dentro do trecho de cobertura. Assim, a cobrança das taxas será realizada pela distância efetivamente percorrida pelos veículos.
Especialista concorda com implementação de pedágios
O consultor de transporte de trânsito Silvestre Andrade afirma que o modelo é bom para quem usa e para o desenvolvimento dos investimentos de infraestrutura nas rodovias, mesmo com a cobrança.
“É um modelo que vem dando certo no mundo e Brasil afora. Quem demanda serviços na rodovia é quem usa a rodovia. Quanto mais você usa a rodovia, mais demandas você tem. É nesses locais em que se tem mais desgaste de pavimento, maior número de ocorrências, acidentes, panes mecânicas e, por consequência, onde se demanda maior gasto. O que se busca, no entanto, é equilíbrio tarifário”, define o especialista.
Questionado sobre a inserção de tarifas que não existiam antes, Andrade diz que faz parte das compensações envolvendo a concessão. “Se você usa, você paga pelo o que você usa. ‘Vou usar e não quero pagar’, aí é complicado. Por equidade você tem que cobrar de quem usa. Não vejo problema com isso. Claro que as pessoas que não estão acostumadas a pagar acham que a via é um bem sem custos”, completa.
Sobre o novo modelo de pedágio usado, que cobra pela quilometragem e não pela praça inteira, o especialista reforça que demanda menores custos e permite mais equidade na cobrança. “É uma cobrança onde você tem menos discussão. Você usa a via e paga pelo o que usou”, conclui.
Representações municipais querem diálogo
O novo presidente da Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte, o prefeito de Nova Lima, João Marcelo (Cidadania), disse que pretende adotar uma postura de diálogo em relação à possível implementação de pedágios na Grande BH. Ele afirma que pretende ouvir os prefeitos das cidades envolvidas para buscar “construir um posicionamento institucional”.
Já o presidente da Associação Mineira de Municípios, Marcos Vinicius Bizarro, compartilha da ideia de estudar mais o que vem sendo discutido, como a própria PEC que tenta proibir a cobrança de tarifas em rodovias. Conforme Bizarro, o texto pode afetar outras regiões, como do Vale do Aço, com a BR-381, cujo processo de concessão está em andamento e promete grandes melhorias para a região.
Deputados tentam barrar cobrança
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pode proibir a instalação de praças de pedágio em rodovias que conectam municípios da região metropolitana de BH deve começar a ser discutida na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) a partir da próxima semana.
O texto – apresentado em meio a protestos contra o edital de concessão do Lote Vetor Norte, do governo de Minas – obteve 33 assinaturas de deputados, superando as 26 necessárias para iniciar a tramitação. Se aprovada, a PEC vai alterar a Constituição Estadual, sem possibilidade de veto do governador.
A deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL), coautora da proposta, critica a postura do Executivo estadual durante o processo de articulação da PEC. “Marcamos audiências e visitas técnicas para ter retornos, mas o governo estava constrangendo a base a não assinar a PEC”, disse.
Para avançar na Assembleia, a PEC ainda precisa ser lida no plenário, analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e debatida por uma comissão especial. Em seguida, será votada em dois turnos no plenário, e precisa de ao menos 46 votos favoráveis para ser aprovada.
Análise
Conforme o especialista em direito público Paulo Studart, haveria um problema de vício de iniciativa na criação de leis por parte do Legislativo que interferem em questões típicas do Executivo, como as concessões. Com isso, na avaliação dele, a PEC seria uma manobra parlamentar para tentar fugir da inconstitucionalidade de um projeto de lei ordinário. “Isso já foi tentado com outros assuntos e, no meu entendimento, não poderia acontecer”, pontua.
Em meio a críticas, Zema condena PEC
O governador Romeu Zema (Novo) saiu em defesa das concessões de vias estaduais, ontem, e teceu críticas à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tenta barrar a instalação de pedágios em estradas que interligam cidades da região metropolitana. “O mundo ideal para mim é um mundo em que não precisaríamos pagar impostos, taxas e pedágios. Mas temos um mundo real”, declarou o governador. Ele defendeu que as concessões atraem investimentos e melhoram a logística das cidades.