O prefeito de Belo Horizonte, Álvaro Damião (União), demonstrou mais uma vez que não quer ter sua assinatura em leis aprovadas pela Câmara de Vereadores dentro da chamada "pauta de costumes" -que são temas ligados à religião e sexualidade- propostos pela ala conservadora da Casa. O projeto de lei que cria o Dia de Combate à Cristofobia, apresentando pelo vereador Pablo Almeida (PL), foi promulgado pelo presidente da Câmara, Juliano Lopes (Podemos), após esgotado o prazo para que o prefeito sancionasse a proposição. Autores dos textos afirmam que gostariam de ver os textos sancionados pelo prefeito, mas que a recusa não afeta a relação com o governo.
A promulgação ocorreu na quarta-feira (3/9). É a terceira vez que isso acontece desde que Damião assumiu a prefeitura, em 3 de abril, com a morte de Fuad Noman, de quem foi vice nas eleições de 2024. Os outros dois projetos de lei que também tiveram que ser promulgados por Lopes são o que prevê o uso da Bíblia como publicação didática nas escolas municipais e particulares, apresentado pela vereadora Flávia Borja (DC), e o que cria o Dia Municipal dos Métodos Naturais, do vereador Uner Augusto (PL), que incentiva a população a adotar medidas contraceptivas que não sejam a camisinha, o DIU ou a pílula.
A legislação determina que uma lei aprovada pela Câmara tenha 15 dias para ser sancionada ou vetada pelo prefeito. Caso o chefe do Poder Executivo Municipal não se posicione, a decisão passa a ser do presidente do Poder Legislativo. A reportagem entrou em contato com a prefeitura para saber os motivos pelos quais Damião preferiu não assinar as leis. A assessoria do governo, no entanto, disse que o prefeito não se posicionaria. A assessoria do presidente da Câmara também foi acionada, mas não houve retorno.
Na justificativa do texto que cria o Dia de Combate à Cristofobia, a ser celebrado anualmente no Domingo de Páscoa, o autor da proposição afirma que a medida era justificada pela “crescente onda de abusos e ataques contra a fé cristã observados na sociedade contemporânea, que tem se intensificado nos últimos anos”. Um dos motivos levantados pelo vereador foi uma postagem feita pela Prefeitura de Belo Horizonte no Carnaval deste ano. “Por meio de sua rede social oficial no Instagram, repostou um vídeo de dois foliões — um fantasiado de Jesus e o outro de Diabo — se beijando. A atitude gerou indignação entre a comunidade cristã e evidenciou a necessidade urgente de reflexão sobre os limites da liberdade de expressão e o respeito às crenças religiosas”, avaliou Almeida.
Já o texto que originou a lei sobre o uso da Bíblia nas escolas da cidade teve como justificativa a intenção de auxiliar projetos escolares nas áreas de História, Literatura, Ensino Religioso, Artes e Filosofia, conforme escreveu a autora. Quanto à lei do vereador Uner, o parlamentar embasou sua proposição dizendo ser uma forma de dar maior conhecimento às alternativas de regulação de fertilidade. "Os métodos naturais enfatizam a beleza do amor conjugal e a responsabilidade dos cônjuges em relação à transmissão da vida", disse, na justificativa do texto. A forma contraceptiva reforçada pelo parlamentar é a checagem do muco vaginal para, a partir de sua densidade e cor, saber se a mulher está em período fértil.
Tudo bem
O vereador Pablo Almeida afirma que gostaria de ver o texto da Cristofobia sancionado pelo prefeito, mas que o importante é a entrada da lei em vigor. "É um projeto que está coibindo uma prática comum em vários lugares do mundo, inclusive no Brasil. A gente conseguiu uma segunda via, por assim dizer (a promulgação pelo presidente da Câmara), mas o projeto tá aprovado", declarou. O parlamentar disse ainda que o posicionamento do prefeito não interfere na relação com a bancada, que se coloca como independente. "Quando chegarem projetos do governo que forem bons para a cidade, votaremos a favor", disse Almeida.
O PL tem a maior bancada na Casa, com seis vereadores. O líder do partido, Sargento Jalyson, também avalia a implementação da lei como o mais importante. "Não faz diferença se o prefeito sanciona ou o presidente da Câmara promulga. O que vale é a entrada da proposição em vigor", disse. Para Uner Augusto, o posicionamento de Damião foi anunciado previamente. "O prefeito afirmou no início do mandato que não se envolveria em questões ideológicas na Câmara", disse. Também na avaliação do parlamentar, a decisão de Damião não afeta a relação com a legenda na Casa.