FUNDO DE ERRADICAÇÃO DA MISÉRIA

Belo Horizonte pode perder R$ 83 milhões com veto para assistência social

O governo estadual vetou a vinculação do Fundo de Erradicação da Miséria (FEM) ao Fundo Estadual de Assistência Social (FEAS), o que segundo pesquisa afetaria os recursos destinados especialmente às cidades com maior população, como BH, Contagem, Uberlândia e Betim

Por Mariana Cavalcanti
Publicado em 19 de março de 2024 | 15:24
 
 
 
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Cidades com maior população, como Belo Horizonte, Contagem, Uberlândia e Betim, serão as mais afetadas pelo veto do governador Romeu Zema (Novo) que impediu a vinculação do Fundo de Erradicação da Miséria (FEM) ao Fundo Estadual de Assistência Social (FEAS). Segundo o economista e pesquisador André Veloso, que compõe o gabinete da deputada estadual Bella Gonçalves, só BH deixaria de receber R$ 83 milhões para a assistência social.

Nesta terça-feira (19), entidades e usuários do sistema público de assistência social participaram de mais uma audiência pública a fim de debater o Fundo de Erradicação da Miséria. Na última terça-feira (11), prefeitos de Minas Gerais participaram de uma audiência sobre o mesmo tema e reforçaram que desejam o repasse do fundo aos municípios. 

Na prática, o veto do governo estadual impede que cerca de R$ 1 bilhão seja integralmente repartido entre os 853 municípios mineiros para custeio de gastos com equipamentos e serviços socioassistenciais. Segundo a deputada estadual Bella Gonçalves (Psol), requerente da audiência pública, havia sido acordado com o governador Romeu Zema que todo o valor adicional arrecadado pelo aumento de 2% na alíquota do ICMS sobre bens considerados supérfluos seria repassado para o FEM. Entretanto, a lei orçamentária encaminhada à ALMG não contava com o recurso. 

“No ano passado, vinculamos o FEM ao Fundo Estadual de Assistência Social, no entanto, o governo quebrou um acordo com a Assembleia Legislativa e vetou esse orçamento, tentando desviá-lo para outras finalidades que não beneficiam a população mais necessitada em Minas Gerais. Está previsto na lei do FEM que o recurso deve ser utilizado para a erradicação da miséria, segundo um plano estadual, mas esse plano não existe atualmente. Nós fizemos um pedido para que o Tribunal de Contas do Estado realize uma auditoria sobre o uso inadequado desses recursos em anos anteriores”, explicou a deputada. 

O pesquisador André Veloso, que fez um levantamento sobre os impactos do veto à assistência social, explicou que apesar das grandes cidades perderem mais recursos, os municípios mais impactados seriam os mais pobres, especialmente no Norte de Minas Gerais e no Vale do Jequitinhonha. 

“Utilizamos o critério do Piso Mineiro de Assistência Social, baseado nas famílias cadastradas no Cadastro Único, para determinar quanto cada município receberia caso o veto não existisse. Concluímos que municípios grandes perdem uma receita nominalmente significativa, como Belo Horizonte com uma perda de R$ 83 milhões, Contagem com R$ 27 milhões, Juiz de Fora com R$ 20 milhões e Betim com R$ 23 milhões. Porém, proporcionalmente, os mais afetados são os municípios do Norte de Minas, Jequitinhonha, Mucuri e Vale do Rio Doce, que podem perder até 3% de sua receita anual para o combate à miséria. Esse valor é extremamente significativo, especialmente em regiões onde a pobreza é predominantemente rural e de difícil acesso”, analisou. 

Promotora se preocupa com falta de recursos 

Presente na audiência pública, a promotora de justiça de direitos humanos em Belo Horizonte, Cláudia do Amaral, demonstrou preocupação com a falta de recursos na assistência social dos municípios, especialmente os com número elevado de pessoas cadastradas no CadÚnico. À reportagem, ela explicou que a vinculação dos recursos do Fundo de Erradicação da Miséria ao Fundo Estadual de Assistência Social contribuiria para o financiamento de políticas públicas, especialmente em um momento que as cidades mineiras têm registrado um aumento na miséria.

“Os recursos vêm do ICMS, um tributo estadual. No ano passado, houve um aumento nesses tributos, com a expectativa de que esses recursos fossem destinados ao Fundo de Erradicação da Miséria. Portanto, faz sentido vinculá-lo ao Fundo Estadual de Assistência Social, que lida diretamente com a erradicação da pobreza e da miséria. O governo diz que essa não é apenas uma questão de Assistência Social, mas é importante que os recursos sejam direcionados especificamente para a Assistência Social, pois é nesse âmbito que se lida com a questão da miséria e da pobreza. Nos municípios, onde está a base, é onde esses recursos são mais necessários. São nos Cras, Creas e outros equipamentos de atendimento à população em extrema pobreza que esse dinheiro fará a diferença. Portanto, é essencial que os deputados revejam essa questão e trabalhem para derrubar esse veto, garantindo que esses recursos cheguem aos municípios e às pessoas que mais necessitam”, argumentou a promotora. 

Em seu discurso durante a audiência pública, Cláudia destacou que as prefeituras estão sobrecarregadas com a assistência social e as entidades sucateadas. 

Recursos limitados

Presente da audiência pública, a representante do governo de estado, a subsecretária de Assistência Social, Mariana Resende Franco, não quis falar com a imprensa, mas destacou durante seu discurso que há “recursos limitados” e um “desfinanciamento” da Assistência Social por parte do Governo Federal. Ela ainda destacou que o governo estadual trabalha com uma base de dados de cadastros do CadÚnico de 2021, o que foi alvo de críticas por parte das entidades, que afirmam que dados atualizados mostram um aumento no número de famílias cadastradas. 

“Mesmo tendo recursos limitados, temos conseguido melhorar os recursos estaduais destinados para assistência social. O FEM foi criado em 2011, e em 2019 tivemos uma alteração legislativa que destinou parte do FEM para o FEAS, especialmente para o pagamento do piso mineiro de assistência social. A partir daí, sofremos com o desfinanciamento do governo federal, sem recursos para a política de assistência social, mostrando que essa luta é de muitos anos. Atualmente, o Fundo Estadual de Assistência Social recebe grande parte dos recursos próprios do Governo de Minas, sendo uma parte significativa proveniente do FEM. Para 2024, temos um orçamento aprovado de 102 milhões”, argumentou a subsecretária.

Extinto temporariamente pelo governo de Minas em 2023, o Fundo de Erradicação da Miséria (FEM) foi retomado em janeiro de 2024 e é financiado pelo adicional de 2% na alíquota do ICMS sobre bens considerados supérfluos (como bebidas alcoólicas, cigarros e armas, por exemplo). Pela lei, os recursos do FEM serão arrecadados até 2026 e devem custear, principalmente, o Piso Mineiro de Assistência Social, cujo repasse mensal aos municípios é de R$ 2,40 por família inscrita no CadÚnico. Segundo a deputada Bella Gonçalves, esse valor pode subir para cerca de R$ 24, caso o dinheiro do FEM seja integralmente destinado ao Fundo Estadual de Assistência Social. 

 
 

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