BRASÍLIA - Os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), têm investido em um tom institucional sobre a disputa pelo Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Isso, enquanto integrantes do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - e do próprio petista – não poupam o Congresso Nacional, com enfoque de discursos direto em Motta.
No início desta semana, Alcolumbre declarou que o governo tem "legitimidade" para acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) e tentar retomar a validade do aumento das alíquotas do IOF, sem inflamar a crise. Motta negou que tenha traído o governo e explicou que agiu para evitar o aumento de impostos à sociedade, em uma construção coletiva entre partidos.
Na quarta-feira (2), Motta indicou a intenção de “dialogar com todos” diante da crise, em manifestação feita à CNN. Antes, Lula havia anunciado, à TV Bahia, que quer conversar com a cúpula do Congresso, mas ao mesmo tempo chamou a decisão de Motta de articular a derrubada da alta do IOF de “absurda”.
“Nós não estamos propondo aumento de imposto, nós estamos fazendo um ajuste tributário nesse país para os mais ricos, para que a gente não precise cortar dinheiro da educação e da saúde”, disse o petista.
Os afagos, acompanhados de uma pitada de crítica, também foram feitos pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que negou ter sido procurado por Motta após a derrubada do decreto do IOF. Pressionado, Haddad chegou a tentar negociar um texto alternativo de consenso com líderes da Câmara, mas não teve sucesso.
“Estou aguardando o retorno de uma ligação que fiz para ele na semana passada. Ele tem que ficar à vontade também. O presidente Hugo Motta frequentou o Ministério da Fazenda como poucos parlamentares. É uma pessoa que é considerada amiga do Ministério da Fazenda, todos aqui, não só de mim. E sabe que tem livre trânsito comigo. Não tem nenhuma dificuldade, da minha parte nenhuma", apontou Haddad.
A situação motivou um ataque orquestrado a Motta, com nomes que integram ou são ligados à base governista alimentando uma campanha contra o presidente da Câmara. Há publicações viralizadas com hashtags como #HugoMottaTraidor, que azedaram a relação de Motta com Lula.
Além disso, vídeos e imagens geradas por inteligência artificial, que satirizam o presidente da Câmara e denunciam sua atuação política, passaram a ser compartilhados por perfis de militantes. Motta tem sido citado nos posts como “Hugo Nem-se-Importa”, em referência ao desinteresse por pautas sociais.
Os ataques obrigaram a entrada de atores em campo para apaziguar a situação. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, repudiou “ataques pessoais e desqualificados” disparados contra Motta. Ela chefia a articulação política do governo, cargo que exige relação direta com o Congresso Nacional.
O líder de Lula na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), endossou Gleisi e declarou que o revés no IOF “não pode ser usado como justificativa para ataques pessoais” a Motta. A busca por pacificação é endossada pelo próprio STF, que tenta um caminho de conciliação em vez de assinar decisões que podem aumentar a tensão entre os Poderes.
A tentativa de acalmar os ânimos, no entanto, pode ser minada por outras estratégias de enfrentamento. O governo tem depositado energia em uma campanha que coloca ricos contra pobres e aponta a responsabilidade do Congresso Nacional.
Na quarta-feira, em evento na Bahia, Lula posou para foto segurando uma placa em defesa da taxação dos super-ricos. O PT, como partido, quer entrar na articulação para inflamar esse discurso com foco nas eleições de 2026.
Nos bastidores, o entendimento é de que o presidente já não conta com o apoio do Centrão. Por isso, precisa apostar em uma aproximação com o povo, convencendo no discurso de que a busca por justiça social esbarra em percalços que independem do governo, para consolidar uma viabilidade eleitoral que mantenha a esquerda no poder.