A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST) cancelou a reunião marcada para terça-feira (26), para discutir e votar o parecer do relator, deputado Ricardo Salles (PL-SP). Um pedido de prorrogação até a próxima quinta-feira (28) foi encaminhado ao presidente da Câmara, Arthur Lira. O adiamento de dois dias era necessário para que se cumpra o prazo regimental de duas sessões em virtude do pedido de vista ao relatório final.

O texto foi lido na semana passada. Em seu relatório, Salles pede o indiciamento de 11 pessoas. No entanto, a CPI instalada em maio para investigar invasões do MST pode terminar sem sequer ter o relatório votado, porque o prazo de funcionamento do colegiado terminou na terça. Caso Arthur Lira não conceda a extensão, o colegiado encerrará sua função sem um desfecho. E essa não será a primeira CPI do MST fracassada no Congresso.

Parlamentares da bancada ruralista e de outros setores de centro e direita já tentaram incriminar integrantes do MST e criminalizar o movimento social, historicamente ligado ao PT, em outras duas vezes: no primeiro e no segundo governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Primeira CPI contra o MST foi instalada após Lula usar boné do movimento

Vinte anos atrás, com aval de parlamentares da oposição, o requerimento de instalação de uma CPI mista que mirava o MST foi lido um dia após Lula posar para fotos com um boné do movimento. Formada por 24 senadores e deputados federais, a comissão, chamada de CPMI da Terra, prometia investigar “ações ilícitas, com sucessivas e violentas invasões de terras”.  

“Já devo ter tirado umas 200 fotos com chapéu do MST na cabeça: vou continuar pondo”, rebateu Lula à época, que cumpriu a promessa, posando com boné do MST inclusive durante a campanha eleitoral que lhe rendeu o terceiro mandato. O acessório, aliás, virou moda entre políticos e militantes de esquerda, além de fonte de renda para o movimento social.

A comissão visitou nove estados, realizou 43 audiências públicas, tomou 125 depoimentos, quebrou o sigilo bancário de 21 pessoas e reuniu uma documentação que chega a 75 mil páginas. Os trabalhos foram encerrados em 29 de novembro de 2005, dois anos após a sua instalação. 

A maioria rejeitou o relatório do deputado João Alfredo (PSOL-CE), aliado ao movimento e do governo Lula, e aprovou o substitutivo do então deputado Abelardo Lupion (PFL-PR), que classificou a invasão de propriedade de “ato terrorista”. Posteriormente, o parlamentar recuou, mas manteve no texto uma série de projetos de lei que criminalizam os sem-terra. Contudo, ninguém acabou indiciado em função do documento aprovado.

Desde então, o PFL virou DEM. Já Abelardo Lupion deixou um herdeiro na política. Ele é pai do deputado federal e presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), Pedro Lupion (PP-PR), um dos principais articuladores da atual CPI do MST, que tem Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro e aliado dos ruralistas, como relator.

Segunda CPI foi liderada por Onyx Lorenzoni, mas também não teve sucesso contra o MST

Em 2009, o Congresso instalou a segunda comissão para investigar o MST. O autor do requerimento foi Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que nove anos depois seria ministro de Jair Bolsonaro (PL) – assim como o ex-presidente, Lorenzoni  foi derrotado nas urnas em 2022, quando tentou ser governador do Rio Grande do Sul. 

A comissão foi instalada com o objetivo de colocar uma lupa sobre os repasses de dinheiro público ao movimento social. Ao contrário da atual, essa CPI teve como relator um aliado de Lula e do MST, o deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP) – Onix era o vice-presidente da comissão. 

Ela foi encerrada após um ano e meio após a instalação, sem qualquer efeito prático e mesmo com mais de 100 requerimentos em pauta. Tatto alegou que a maioria dos requerimentos era ilegal e fugia ao objeto da CPI. Ele ainda acusou a oposição de ter abandonado a CPI e disse que a comissão não serviu nem como palanque para os integrantes.