BRASÍLIA - O governo federal pediu, nesta quarta-feira (3/9), investigação da Polícia Federal sobre fraudes na concessão do Seguro-Defeso do Pescador Artesanal em 23 municípios dos estados do Acre, Amazonas, Amapá, Bahia, Maranhão, Pará e Piauí. De acordo com o governo, entre os sete estados investigados, estão os cinco com o maior número de pescadores beneficiários.
O seguro-defeso é o benefício pago a pescadores no valor de um salário-mínimo, garantido por meio do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para pessoas que dependem exclusivamente da pesca de pequeno porte. O recurso é destinado à garantia da renda nos períodos em que não é permitido pescar, em razão do crescimento e reprodução das espécies.
O Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA) e a Controladoria-Geral da União (CGU) constataram em auditorias indícios de dois tipos de práticas criminosas. Em um dos tipos, atravessadores estariam coagindo pescadores artesanais legítimos a repassarem a eles parte de seus vencimentos.
Em outro, os atravessadores, em troca de remuneração, estariam induzindo e orientando pessoas que não têm direito ao Seguro-Defeso a obter o benefício de forma irregular, por meio de fraude e declaração de informações falsas ao governo.
“Adotamos uma medida preventiva de gestão para maior controle do programa, com a realização de uma auditoria por iniciativa do governo, e constatamos casos muito graves em que pessoas sem direito ao benefício eram orientadas sobre como obtê-lo, em troca de parte do valor recebido”, relata o ministro da CGU, Vinícius Marques de Carvalho.
“É muito sério ver uma política pública, criada para proteger as famílias de pescadores e os recursos pesqueiros, que precisa de meses de interrupção da pesca para se recuperar, sendo desvirtuada apenas para ganho de alguns criminosos. O governo sempre atuará para combater as fraudes, de modo a assegurar o pagamento a quem de fato tem direito”, destaca o ministro da Pesca e Aquicultura, André de Paula.
De acordo com a CGU, as apurações realizadas fazem parte da primeira etapa de uma auditoria que já integrava o Plano Anual de Atividades de Auditoria Interna (PAINT), antecipadas por decisão do governo federal. A auditoria, no entanto, só deve ser concluída em dezembro. Mas os primeiros achados da auditoria já foram enviados, em sigilo de justiça, à Polícia Federal.
De acordo com dados do governo federal, o total de pescadores registrados no país passou de 1 milhão em 2022 para 1,7 milhão em maio de 2025 — sendo 500 mil novos cadastros desde meados de 2024.
No ano passado, o número de beneficiários do seguro-defeso chegou a 1,1 milhão, o que representa um crescimento de 34% em relação a 2022. O governo federal gastou R$ 5,9 bilhões com o benefício em 2024.
Governo alega que aumentou controle sobre o benefício
Além de aprofundar as investigações, o Governo Federal também anunciou nesta quarta-feira novas medidas para o controle dos requisitos legais e a proteção dos profissionais legítimos que recebem o benefício do Seguro-Defeso do Pescador Artesanal.
Com o objetivo de fortalecer os mecanismos antifraudes, o Ministério do Trabalho e Emprego passará a fazer verificação presencial dos requisitos para habilitação como uma etapa de validação do requerimento digital, que hoje é realizado integralmente de modo remoto, por meio do aplicativo e da central de atendimento telefônico do INSS.
Em um primeiro momento, o MTE deslocará equipes para atuar nos estados do Amazonas, Bahia, Maranhão, Pará e Piauí. Juntos, estes cinco estados concentram 75% de todos os pescadores artesanais registrados no país.
“As equipes vão atuar com o propósito de assegurar os direitos dos pescadores artesanais que, de fato, atuam de forma exclusiva e ininterrupta. O compromisso do governo é garantir um processo ágil e transparente em benefício dos pescadores e pescadoras que vivem de seu trabalho,”, aponta Luiz Marinho, Ministro do Trabalho e Emprego.
O processo – previsto para ter início em outubro, mês que coincide com o aumento dos pedidos de Seguro-Defeso – envolverá critérios mais rigorosos para a concessão do benefício. Com isso, o MTE passará a verificar as seguintes documentações e informações:
- Notas fiscais de venda de pescado e comprovantes de contribuição previdenciária;
- Relatórios mensais que comprovem a atividade como pescador artesanal;
- Registro biométrico obrigatório na Carteira de Identidade Nacional (CIN);
- Acompanhamento do local da atividade de pesca por meio da coleta de dados geolocalizados dos pescadores; e
- Confirmação do endereço de residência do pescador e verificação da compatibilidade entre o município de residência e os territórios abrangidos pelo defeso.
O governo federal já vinha adotando medidas para combater fraudes no programa e garantir o Seguro-Defeso a quem de fato tem direito a ele. Em setembro de 2024, passou a exigir o cadastro biométrico a todos que quiserem requerer o benefício. Todos os pescadores artesanais deverão possuir Carteira de Identidade Nacional (CIN) até dezembro de 2025, medida que garante ainda mais segurança para a identificação dos beneficiários.
Em audiência no Senado na terça-feira (12/8), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que auditorias da CGU acenderam “alerta amarelo” sobre fraudes no seguro-defeso. Em decorrência das denúncias, o Executivo federal decidiu elaborar novas normas para o pagamento do benefício.
As regras recém-definidas constam na Medida Provisória (MP) 1.303/2025, que limitou a concessão do benefício à dotação orçamentária do ano e previu a homologação da situação do pescador localmente, que será feita pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
Além disso, o Decreto nº 12.527, publicado no final de junho, determinou a revisão periódica do Seguro-Defeso e a limitação da sua concessão às pessoas que moram perto em municípios abrangidos pelas portarias do Seguro-Defeso. Estabeleceu também a obrigatoriedade de os pescadores apresentarem, anualmente, o Relatório de Exercício da Atividade Pesqueira (REAP), no qual o pescador deve informar as espécies pescadas e quantidades.
Ao longo do ano de 2025, medidas de saneamento do Registro Geral de Pescadores (RGP) já levaram ao cancelamento de 312.707 cadastros.