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Petróleo na foz do Amazonas: veja projeto, riscos, potencial e disputa política

Após Ibama negar licença para a Petrobras, Lula, em conversas com jornalistas, deu a entender que tende a liberar a exploração do mineral

Por O Tempo Brasília
Publicado em 22 de maio de 2023 | 10:12
 
 
 
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu dar a palavra final sobre o pedido da Petrobras para extração de petróleo na Foz do Rio Amazonas assim que retornar ao Brasil, após deixar o Japão, na noite de domingo (hora de Brasília), onde participou da cúpula do G7.

A questão divide ambientalistas e desenvolvimentistas do governo. Na quarta-feira (17), o Ibama negou uma licença para a Petrobras perfurar um poço exploratório a cerca de 160km da costa do Oiapoque, no Amapá, e a cerca de 500km da foz do Rio Amazonas. 

Lula, em conversas com jornalistas pouco antes de embarcar no avião presidencial de volta ao Brasil, deu a entender que tende a liberar a exploração do mineral. Ele garantiu que jamais permitiria se houvesse riscos ao meio ambiente, mas disse “achar difícil” que haja esse impacto para o meio ambiente pois o ponto de possível exploração fica a 530 km de distância da foz do rio.

A decisão do presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, representa uma vitória da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, em uma disputa contra o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que defendia a exploração experimental de petróleo.

Qual o potencial de exploração da área?

A Margem Equatorial Brasileira, área com potencial de exploração de 14 bilhões de barris de petróleo, compreende a região litorânea do Amapá até o Rio Grande do Norte. A área contempla as bacias da Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar.

A Petrobras informou, em novembro de 2022, que o processo de licenciamento estava na fase de execução dos projetos ambientais e preparação para a Avaliação Pré-Operacional (APO), requisito para a emissão da licença ambiental pelo Ibama.

Para o teste que pretende fazer na região, a Petrobras mobilizou seis embarcações de apoio, além de quatro helicópteros, um avião e o navio-sonda que iria perfurar o poço. São cerca de R$ 3 milhões gastos por dia.

Após ter a licença negada, a companhia estatal informou que desmobilizaria os equipamentos, mas o Ministério de Minas e Energia pediu sexta-feira que a empresa insista na empreitada e não retire os equipamentos do local.

A empresa diz que analisa a possibilidade de pedir reconsideração da decisão e que a perfuração é apenas a fase inicial do processo, sem necessidade, portanto, de uma avaliação ambiental de toda a região — como pede o Ibama.

Quais são os possíveis impactos ao meio ambiente

Rodrigo Agostinho seguiu o recomendado pela área técnica do Ibama. “Não restam dúvidas de que foram oferecidas todas as oportunidades à Petrobras para sanar pontos críticos de seu projeto, mas que este ainda apresenta inconsistências preocupantes para a operação segura em nova fronteira exploratória de alta vulnerabilidade socioambiental”, diz ele, no despacho em que nega a licença.

O Ibama entende ser necessário retomar ações que competem à área ambiental para assegurar a realização de Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS). Na prática, trata-se de um conjunto de estudos que medirá os riscos da atividade petroleira ao ecossistema e definirá se a exploração ali tem viabilidade ambiental.

A equipe técnica do órgão aponta também haver “inconsistências identificadas sucessivamente” e “notória sensibilidade socioambiental da área de influência e da área sujeita ao risco”, destacando a necessidade de “avaliações mais amplas e aprofundadas”. 

Em até 10 horas, segundo cálculos da equipe do Ibama, o óleo atingiria águas fora do território brasileiro. O bloco fica na região do Amapá, próximo à Guiana Francesa. “Em outras palavras, o plano apresentado é inferior às práticas adotadas pela própria companhia em outras regiões do litoral – o que seria um contrassenso em uma nova fronteira com ativos ambientais de alta vulnerabilidade”, afirmou no despacho.

Relatório aponta diversos riscos à vida humana e animal 

O Relatório de Impacto Ambiental protocolado pela britânica BP, antiga operadora do bloco, e usado pelo Ibama na análise do projeto considera que os impactos previstos e os possíveis riscos da operação não apresentam restrições à concessão da licença ambiental.

O relatório elenca 13 impactos ambientais ou socioeconômicos negativos e quatro positivos, a maioria deles ligada a oportunidades de geração de emprego e renda com a atividade. Entre os negativos, oito são considerados de baixa magnitude. Dois são considerados de média magnitude e outros dois, de alta: a possibilidade de soterramento, asfixia e contaminação de organismos por cascalho ou fluido e o incremento em 3.000% no movimento do aeroporto de Oiapoque (AP).

O grande número de impactos de baixa magnitude reflete o caráter temporário da atividade de perfuração de poço, que geralmente dura poucos meses, ao contrário da produção do petróleo, que se estende por anos.

Ainda assim, a expectativa de elevação no tráfego de embarcações para levar insumos e mantimentos à sonda de perfuração afeta a vida marinha local, com riscos de colisão ou vazamentos de combustíveis.

O relatório identifica na área de influência do empreendimento algumas espécies ameaçadas pela exploração, como o camarão rosa, o pito, a lagosta vermelha e o caranguejo-uçá. Identifica ainda 23 espécies de mamíferos marinhos, entre baleias, botos e golfinhos e duas espécies de peixes-boi.

Destas, seis estão ameaçadas de extinção no Brasil: boto cinza, boto vermelho, cachalote, peixe-boi marinho, peixe-boi amazônico e ariranha. "A diversidade de aves aquáticas na região chama atenção, são pelo menos 114 espécies", diz o relatório.

Aumento de voos também geraria grande impacto

Outra preocupação do Ibama é em relação ao aumento no número de voos na região, que criariam uma nova rota rumo ao nordeste, enquanto hoje o fluxo é rumo ao sul.

“Não se trata, portanto, de uma intensificação do tráfego aéreo sobre determinada área, mas do estabelecimento de uma nova rota, sem prejuízo de entender a intensificação como um impacto ambiental que deveria ser igualmente considerado”, diz o parecer que fundamentou a decisão de negar a licença.

A intensificação dos voos têm impacto sobre as comunidades indígenas da região, diz Agostinho na decisão. “Tais impactos estão relacionados à operação de atividades de apoio aéreo e não foram adequadamente previstos e dimensionados no estudo de impacto ambiental, o que configura um impeditivo para sua validação”.

O relatório de impacto ambiental elenca ainda os riscos de eventuais acidentes com vazamento de petróleo, tanto da unidade de perfuração quanto das embarcações que apoiarão sua operação.

São 11 tipos de riscos, os mais sensíveis relacionados a organismos do fundo do mar, peixes e a atividade pesqueira artesanal. O texto afirma que os riscos podem ser mitigados com a implantação de um plano de emergência individual, que prevê embarcações dedicadas e uso da base em Belém (PA).

De acordo com o parecer, a diversidade e a vulnerabilidade da fauna local demandam a elaboração de um robusto plano de proteção, principalmente porque se trata de ambiente distinto daqueles onde já existe exploração de petróleo no país. “A região abriga espécies endêmicas, ameaçadas de extinção e, muito provavelmente, espécies ainda desconhecidas ou não registradas localmente, tendo em vista o vasto ecossistema recifal recém-descoberto sob a pluma da foz do rio Amazonas”, diz. (Com Folhapress e Estadão Conteúdo)

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