ESTRATÉGIAS

Pacto no CNJ, referência ao Kama Sutra e evento com influencers: as estratégias de Barroso contra o ‘juridiquês’

O ministro destacou que um dos seus compromissos à frente da Corte seria o de adotar uma linguagem simples no Judiciário

Por Fransciny Ferreira I Hédio Ferreira Júnior
Publicado em 26 de maio de 2024 | 10:04
 
 
 

BRASÍLIA - Na cerimônia de posse como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luís Roberto Barroso destacou que um dos seus compromissos à frente da Corte seria o de adotar uma linguagem simples no Judiciário. Desde então, para transformar a promessa em legado, ele tem se empenhado para abordar essa questão sempre que possível.

Nos bastidores do tribunal, têm chamado atenção algumas das estratégias usadas por ele, como a comparação do juridiquês com posições do Kama Sutra durante evento formal do Judiciário e até mesmo encontros com TikTokers na Corte. Em consonância com esses esforços, Barroso tem buscado o apoio dos colegas por meio do Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples.

Por trás dessa empreitada está o desejo do presidente, confidenciado aos mais próximos, de melhorar a percepção do STF junto à população. Como mostrou O TEMPO, outras ações estão em andamento por meio do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que também comanda. Equidade de gêneros nos tribunais e bolsa de estudo para negros na magistratura são algumas das medidas.

‘Algumas expressões jurídicas me lembrar de posição do Kama Sutra

Durante cerimônia de lançamento da nova edição do Anuário da Justiça Brasil, da editora ConJur, no último dia 22, o ministro defendeu a revisão do uso de expressões jurídicas. Barroso disse que alguns termos o fazem lembrar de posições do Kama Sutra, em referência ao manual indiano de sexo.

"Nós já temos muitas dificuldades inevitáveis no direito para precisarmos piorar. Nós já falamos coisas do tipo como ‘no aforamento’, ‘havendo pluralidade de enfiteutas’, ‘elege-se um cabeceu’. Isso é péssimo. Ou ‘embargos infringentes’. Ou ‘mútuo feneratício’. Sempre que vejo isso eu me lembro de uma posição do Kama Sutra. Nós não precisamos piorar o que já é ruim”, disse arrancando risadas da plateia. 

“É verdade que o Judiciário muitas vezes não se ajuda. Nós temos uma linguagem hermética e excludente que muitas vezes dificulta a compreensão do que a gente faz. (...) O pacto pela linguagem simples é falar com o sujeito, verbo e predicado. E sempre que possível nessa ordem. E não precisar utilizar palavras desnecessariamente complexas, nem se sentir mais inteligente por chamar recursos extraordinários de ‘irresignação derradeira’ ou habeas corpus de ‘remédio heroico’”, defendeu.

Encontro com 14 influenciadores

Também na última semana, o Supremo promoveu, em parceria com o TikTok, encontro de ministros com 14 influenciadores. O evento, chamado de “A Justiça falando a sua língua”, refletiu sobre linguagem, seus usos e suas formas de aproximação ou distanciamento com a sociedade. Barroso participou da abertura do evento com a analista política e advogada Gabriela Prioli, e João Pedrosa, professor e ex-BBB.

"As inovações são as plataformas digitais, e nós temos que nos empenhar para que elas operem numa trilha civilizatória – e não numa trilha de ódio, de maledicência e de desinformação. Portanto, estar aqui é uma forma de nos adaptarmos a uma nova linguagem, um novo meio de comunicação, junto a pessoas que influenciam a juventude", disse o ministro, 

Fizeram parte do grupo que visitou o prédio da Corte em Brasília: Andressah Catty, Cristian Wari’u, Fayda Belo, Gabriela Prioli, Ivan Baron, Janaína Bastos, Jerson filho, Júlia Costa, João Luiz Pedrosa, João Pedro Rangel, Kleiton Ferreira, Patrícia Shimano, Thiago Gomide e Victor Marinho. Juntos, totalizam 14.872 milhões de seguidores no TikTok.

Defesa do uso da IA

Barroso também acredita que, em breve, a Inteligência Artificial (IA) vai proporcionar aos juízes brasileiros escrever com mais agilidade as sentenças judiciais. A fala ocorreu durante o J20, encontro de presidentes e representantes das Supremas Cortes e dos Tribunais Constitucionais dos países integrantes do G20. A reunião foi realizada em 14 de maio, no Rio de Janeiro.

Para o magistrado, é preciso estar atento aos avanços e benefícios trazidos pelas ferramentas de IA, sem temer fechar os olhos a elas, desde que utilizadas sob monitoramento humano. Por demandar mais informações, o ministro acredita que a IA poderá tomar melhores decisões, automação de tarefas repetitivas, agrupamento de processos por temas, separar o que já foi decidido em repercussão geral, além de resumir o conteúdo de processos. 

“Eu acho que num futuro não muito distante nós vamos ter pelo menos a primeira minuta de decisões judiciais feitas por Inteligência Artificial. Até porque a Inteligência Artificial tem mais capacidade de processar informações em maior volume e maior velocidade e acho que a gente tem que se beneficiar disso”

Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples

O presidente do STF e do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, lançou o Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples no início de dezembro. O objetivo é adotar palavras diretas e compreensíveis nas decisões e na comunicação oficial dos tribunais. O magistrado pediu aos juízes que expliquem o impacto das decisões na vida das pessoas e os votos sejam mais diretos e objetivos.

"Com muita frequência, não somos compreendidos. Boa parte das críticas ao Judiciário decorre da incompreensão sobre o que estamos decidindo. E quase tudo que decidimos pode ser explicado em uma linguagem simples, que as pessoas consigam entender. Ainda que para discordar, mas para discordar daquilo que entenderem", afirmou ele em evento na Bahia, em dezembro de 2023.

 

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