Gabinete paralelo

Atacado por filhos de Bolsonaro, juiz que mandou prender Ribeiro recebe ameaças

Renato Borelli tem em sua carreira um histórico de decisões contrárias a políticos de diferentes partidos, como PT e MDB, e até mesmo contra Jair Bolsonaro

Por Renato Alves
Publicado em 23 de junho de 2022 | 11:19
 
 
 
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O juiz Renato Borelli, da 15ª Vara Federal Criminal de Brasília, recebeu "centenas de ameaças" por causa das decisões que levaram às prisões do ex-ministro Milton Ribeiro, dois pastores ligados ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros dois acusados de integrar o esquema de corrupção  na liberação de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ligado ao Ministério da Educação (MEC).

A informação é da assessoria de comunicação da Justiça Federal. "Os pedidos de investigação já foram encaminhados para a PF [Polícia Federal]", afirmou a assessoria da Corte..

Renato Borelli ouve nesta quinta-feira (23) três dos cinco presos pela PF na operação desencadeada quarta (22). Todos vão ser submetidos à audiência de custódia. 

Milton Ribeiro será ouvido de São Paulo, onde passou a noite na carceragem da Superintendência da PF. O pastor Arilton Moura está preso no Pará. Por isso ambos serão ouvidos por videoconferência. Já o pastor Gilmar Santos participará presencialmente, pois está na capital federal. 

Além dos três principais investigados, outras duas pessoas foram presas durante a operação: o ex-assessor do MEC e advogado Luciano de Freitas Musse e o ex-assessor da Prefeitura de Goiânia Hélder Diego Bartolomeu.

Todos são acusados de pelos crimes de tráfico de influência (com pena prevista de dois a cinco anos de reclusão), corrupção passiva (dois a 12 anos de reclusão), prevaricação (três meses a um ano de detenção) e advocacia administrativa (um a quatro anos de prisão). 

Os recursos são do FNDE, órgão ligado ao MEC controlado por políticos do Centrão, bloco político que dá sustentação a Bolsonaro desde que ele se viu ameaçado por uma série de pedidos de impeachment e recorreu a esse apoio em troca de cargos e repasses de verbas federais.

O fundo concentra os recursos federais destinados a transferências para municípios.

Juiz que mandou prender Milton Ribeiro já condenou políticos do PT e MDB

Renato Borelli tem em sua carreira um histórico de decisões contrárias a políticos de diferentes partidos, como PT e MDB, e até mesmo contra Jair Bolsonaro.

Em junho de 2020, durante a pandemia, foi ele quem determinou, no âmbito da 9ª Vara Cível do Distrito Federal, que Bolsonaro fosse obrigado a usar máscara nos espaços públicos de Brasília, fixando multa diária de R$ 2 mil ao mandatário em caso de descumprimento. 

Dias depois, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) acatou um pedido da União e derrubou a decisão.

Bolsonaristas incitam apoiadores contra juiz Renato Borelli 

Desde a prisão de Milton Ribeiro, bolsonaristas recuperam a determinação sobre o uso de máscaras para tentar minimizar a decisão sobre Ribeiro. 

Aliados do presidente insinuam que o juiz teria alguma motivação ideológica para perseguir o chefe do Executivo, mas o histórico de decisões de Borelli não atesta essa tese.

O nome do juiz foi compartilhado pelos perfis do deputado Eduardo Bolsonaro (União Brasil-SP) e do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O ex-secretário de incentivo à Cultura André Porciuncula classificou o caso como “ativismo judicial”.

“Sim, o juiz que sentenciou o presidente a usar máscara é o mesmo que mandou prender o ex-ministro Milton”, publicou Eduardo Bolsonaro.

Além de juiz federal, Borelli é palestrante e professor de direito administrativo em um curso preparatório para concursos. E

Ele dedica suas redes sociais a promover o curso, chamado Gran Jurídico, mas desde quarta-feira tem recebido comentários como “comunista ativista” e “juiz esquerdista”.

Em 2016, na 20ª Vara Federal, Borelli condenou o ex-deputado João Paulo Cunha, do PT, e o empresário Marcos Valério, envolvidos no escândalo do mensalão, por improbidade administrativa. O juiz decretou a João Paulo Cunha o ressarcimento de R$ 10,9 milhões ao cofres públicos, e a Marcos Valério, R$ 536,4 mil.

Em 2017, também na 20ª Vara Federal, Borelli determinou a suspensão da assistência médica oferecida pela Câmara dos Deputados ao ex-deputado Rocha Loures (MDB), ex-assessor especial do então presidente Michel Temer, e obrigou o emedebista a devolver salários recebidos no período em que esteve afastado do cargo por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em 2018, ainda na 20ª Vara Federal, Borelli decretou o bloqueio de mais de R$ 3 milhões do ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella (Republicanos), que na época havia sido citado em uma ação por improbidade administrativa. O bloqueio atingiu ‘todos os valores creditados em contas bancárias, cadernetas de poupança, fundos de investimento ou quaisquer outras aplicações financeiras’ do político.

Milton Ribeiro disse que recebeu pastores por ordem de Bolsonaro

Os pastores presos são ligados a Bolsonaro e apontados como lobistas que atuavam no MEC. Ribeiro disse em entrevista que atendeu os dois a pedido do presidente, mas negou que os favoreceu. 

No entanto, áudios revelados pela Folha de S. Paulo mostraram diálogo em que Ribeiro compromete ele próprio e o presidente.

Já Bolsonaro, quando o escândalo veio à tona, em março, se apressou em defender Milton Ribeiro ainda no cargo. O presidente chegou a afirmar que “bota a cara toda no fogo” pelo ex-ministro. 

Mas, dias depois, Ribeiro caiu, diante de novas denúncias, feitas por prefeitos que acusavam os pastores de montar um gabinete paralelo para negociar a liberação das verbas do FNDE. 

Apesar de nenhum dos religiosos ter cargo no MEC, eles chegaram a receber prefeitos no edifício-sede do ministério. Prefeitos contaram que os pastores pediram dinheiro e até ouro como propina. (Com Estadão Conteúdo)

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