Proposta com o objetivo de controlar o crescimento das despesas obrigatórias e orientar o reequilíbrio fiscal das contas públicas, a PEC Emergencial acabou desidratada no Congresso Nacional e trouxe poucas medidas de compensação aos gastos que o governo federal terá com o novo auxílio emergencial, como queria o ministro da Economia, Paulo Guedes. No caso de Estados e municípios, por exemplo, as medidas de ajuste fiscal da PEC são apenas facultadas aos Poderes, ou seja, não precisam ser obrigatoriamente seguidas.
Na prática, a Emenda 109 – nome dado à PEC Emergencial após sua promulgação – colocou restrições à contratação e à remuneração de servidores da União quando as despesas obrigatórias do governo superarem 95% das despesas totais ou quando o país estiver em estado de calamidade pública (que precisa ser aprovado no Congresso).
No entanto, segundo o diretor executivo do Instituto Fiscal Independente (IFI) do Senado, o economista Felipe Salto, ainda assim não há previsão de acionamento desses gatilhos durante o mandato do presidente Jair Bolsonaro. “No caso da União, pela nossa conta, essas medidas só seriam acionadas em 2025, quando a despesa obrigatória atingiria 95% da despesa primária total, ambas sujeitas ao teto”, explica.
Já em relação aos Estados, a mudança na lei foi no sentido de facultar aos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas e à Defensoria Pública a aplicação de um mecanismo de ajuste fiscal de vedação quando a relação entre despesas correntes e receitas correntes supera 95% no período de 12 meses. “O fato de a regra ser facultativa enfraquece o potencial de ajuste”, diz Salto.
Entre as medidas de ajuste fiscal facultadas aos Poderes estão a impossibilidade de contratações (salvo para reposição de pessoal), realização de concursos públicos e também a concessão de reajustes salariais. Porém, segundo explicou Salto, não há clareza sobre o indicador que será utilizado para fins do cálculo da relação entre despesa e receita. “A EC 109 não explicita se o indicador ‘despesa corrente sobre receita corrente’ considerará a despesa empenhada, liquidada ou paga”, aponta.
Se considerarmos os números do último Relatório Resumido de Execução Orçamentária do ano passado da Secretaria de Fazenda de Minas, o Estado superaria a margem de 95% se considerada a despesa empenhada. No caso da despesa liquidada, o valor chega bem próximo. Mas, se a regra considerar a despesa efetivamente paga, aí a relação fica próximo de 80%.
Ainda segundo Salto, existe a possibilidade de o cálculo considerar o índice de Capacidade de Pagamento (Capag), do Tesouro Nacional. “Pelas informações da Capag, do Tesouro Nacional, o indicador equivalente indicaria 14 Estados já no nível acima de 95%”, explica. Entre eles, segundo o Tesouro Nacional, está Minas Gerais.
Zona nebulosa
Mesmo sendo apenas uma orientação aos Poderes, em caso de não adoção de medidas fiscais no caso da relação entre receita e despesa superar 95%, Estados e municípios estão sujeitos a algumas sanções, entre elas a concessão, por qualquer outro ente da Federação, de garantias ao ente envolvido e a tomada de operação de crédito por parte do Estado, seja diretamente ou por intermédio de seus fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais dependentes. Também fica proibido o refinanciamento de dívida contraída anteriormente.
Mas, também nesse caso, Minas não seria diretamente atingida porque, em razão do não pagamento da dívida pública desde 2018, o Estado já está impedido de contrair novos empréstimos. Além disso, o refinanciamento da dívida do Estado, demanda aprovação da Assembleia Legislativa, onde um projeto de lei para autorização para que Minas ingresse no Regime de Recuperação Fiscal (RRF) da União tramita há um ano e meio sem avançar sequer pelas comissões.
Como o Estado ainda não aderiu ao RRF, o economista Felipe Salto alerta que a Emenda 109 poderia sim trazer algum impacto, mas ainda não é possível afirmar pois é necessário “avaliar como as novas regras constitucionais vão conviver com a LC 178 (Lei Complementar que regulamenta o novo RRF) e outros regramentos”.“É uma zona nebulosa. Como Minas não aderiu, até agora, ao RRF ou outro regime de renegociação, é possível que a EC 109 afete, sim, o Estado”, disse.
No início deste ano, o governo de Minas apresentou um substitutivo ao texto do RRF a partir de mudanças que o governo federal fez ao Regime na LC 178, mas ainda não há previsão de apreciação do texto no Legislativo. Além disso, o substitutivo é apenas um pedido de autorização e não um plano detalhado de onde o Executivo pretende cortar gastos, porque esse plano prescinde da regulamentação do novo RRF, prevista pelo Tesouro Nacional para sair até abril ou maio deste ano.
Sem retorno
Questionada sobre a avaliação de impactos que a PEC Emergencial terá sobre as contas mineiras, a Secretaria de Estado de Fazenda não respondeu.