Os investimentos feitos pelo governo de Minas Gerais em ações contra as arboviroses (dengue, chikungunya e zika) em 2023 foram os menores na comparação com os investimentos dos últimos três anos. De acordo com dados do painel VigiMinas — Programa de Fortalecimento do Sistema Estadual de Vigilância em Saúde — no último ano, foram investidos R$ 64,4 milhões, quantidade inferior aos R$ 75,9 milhões de 2022 e aos R$ 123,2 milhões de 2021.

Em 2024, o Estado enfrenta uma epidemia das doenças, com 86.184 casos confirmados de dengue e 26 mortes, 18.329 diagnósticos confirmados de chikungunya e quatro vítimas, além de seis casos de zika. Os números foram atualizados nesta quarta-feira (21 de fevereiro) pela Secretaria de Estado de Saúde do Estado (SES-MG). Com o avanço dos casos, Minas Gerais decretou situação de emergência no dia 27 de janeiro. Em todo o Estado, 71 municípios também declararam emergência em decorrência do cenário epidemiológico.

O secretário de Estado de saúde, Fábio Baccheretti, no entanto, explica que o menor valor destinado às ações de enfrentamento às arboviroses no último ano ocorreu devido à quantidade de recursos "parados nos municípios", uma vez que a quantia repassada em 2021 não foi aplicada, já que a epidemia das doenças — prevista para o ano seguinte — não se confirmou. 

"Esse tipo de investimento é feito de forma proporcional à expectativa de anos epidêmicos. A gente tinha a previsão de grande número de casos em 2022, por isso, uma maior quantidade foi investida em 2021, porém essa epidemia não ocorreu. O que temos hoje é recursos parados e, por isso, estamos orientando as regiões para aproveitar essa quantia de melhor maneira, freando o avanço da doença e garantindo assistência médica para evitar mortes", justificou o secretário.

Situação das cidades

Belo Horizonte, uma das cidades mineiras que decretou situação de emergência devido o avanço dos casos de dengue e chikungunya, recebeu, em 2023, uma quantidade de recursos quase três vezes menor quando se comparado com a quantia alocada em 2021 — ano em que o governo de Minas destinou maior valor para o enfrentamento das arboviroses. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, foram destinados R$ 4,8 milhões no ano passado, número inferior aos R$ 12,9 milhões de 2021.

A quantidade recebida no último ano, no entanto, é mais que o dobro daquele repassado em 2022, cerca de R$ 2,2 milhões. "Considerando que a saúde municipal possui políticas e ações que são continuadas, em falta ou redução de recursos de fontes estaduais ou federais, a prefeitura aumenta seus investimentos em saúde", informou a pasta.

A necessidade de realocar recursos têm sido um desafio para a cidade de Ipatinga, localizada na região do Vale do Aço. Segundo o secretário municipal de saúde, Walisson Silva Medeiros, a redução dos investimentos por parte do governo de Minas exigiu que o município fizesse um maior aporte de recursos próprios para as ações de combate dengue, chikungunya e zika.

Em 2023, a cidade recebeu R$ 478 mil do Estado para o enfrentamento de arboviroses, conforme a pasta."O dinheiro que seria utilizado para reforçar a equipe médica ou fazer uma obra na Upa (Unidade de Pronto Atendimento) e até mesmo nos centros de saúde está sendo investido em fumacê, nas contratações de agentes de fiscalização e de profissionais de capina urbana, nas campanhas educativas. O município não está deixando de trabalhar em outras frentes, mas toda atenção de recurso agora está destinada a resolver esse problema emergencial", disse o secretário.

A cidade da região do Vale do Aço decretou situação de emergência em saúde pública por causa do avanço dos casos de arboviroses em 5 de janeiro deste ano. O município tem 5.161 casos confirmados de chikungunya, e oito mortes pela doença em investigação, conforme o painel de monitoramento da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) desta quarta-feira (21).

Ipatinga ainda soma 1.943 casos de dengue, com uma morte em investigação. "Temos feito todos os esforços para eliminar os focos do mosquito e garantir assistência médica para a população, mas precisamos de mais recursos. No final do ano passado, o governo Federal enviou um valor extra de R$ 200 mil, e ainda não recebemos uma quantia extra do governo de Minas. Temos a promessa de que isso ainda será repassado, e a nossa expectativa é poder receber o quanto antes", acrescentou Walisson Silva Medeiros.

A esperança por esse repasse extra do governo de Minas é a mesma da secretária de saúde da cidade de Serro, Karina Pertile. A cidade da região do Vale do Jequitinhonha decretou situação de emergência em saúde pública no dia 19 de fevereiro por causa do aumento da taxa de incidência da dengue. São 36 casos confirmados e outros 262 em investigação, conforme os dados mais atuais. O município não possui casos confirmados ou em apuração de chikungunya ou zika.

"Temos recursos para as ações de rotina, mas em caráter emergencial. Recebemos um recurso do Estado para as arboviroses, mas não foi o suficiente, precisamos de um valor extra que foi anunciado, e estamos contando com esse dinheiro. A gente precisa ampliar o número de profissionais em atuação e comprar insumos", explicou a secretária.

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Ações do Estado

De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), devido ao aumento dos casos, novos investimentos estão sendo feitos pela pasta. Foram investidos R$ 30,5 milhões para que os municípios contratem o serviço de drones. Esses equipamentos são utilizados na identificação, monitoramento e tratamento dos focos e criadouros do Aedes aegypti.

Desse total, R$ 15 milhões foram repassados em 2023 e o restante será pago neste ano. O Estado também garante que repassou R$ 48,3 milhões aos municípios em dezembro do último ano. Haverá, ainda, a antecipação de R$ 32,2 milhões. Esse valor estava previsto para julho, mas deve ser quitado ainda neste mês, conforme informou a secretaria.

"Estamos antecipando essa parcela para agora porque estamos com esse momento epidêmico. Além disso, temos o pagamento de uma parcela extra para ajudar os municípios. Todo esse esforço será feito junto ao governo Federal. Conseguimos uma negociação com o Ministério da Saúde, e mais um novo recurso deve chegar aos Estados e municípios que decretaram emergência", garante o secretário Fábio Baccheretti.

Conforme o titular da pasta, o governo de Minas tem feito diversos esforços para a área da saúde. "O orçamento executado (para toda a área da saúde como um todo) mais que dobrou nos últimos anos, saltou de R$ 4 bilhões para R$ 10 bilhões. Mas a gente sabe dos desafios dos municípios para a gestão da saúde, e o quanto de recursos que eles precisam destinar. Por isso, acredito que os questionamentos não são em relação à falta de dinheiro para a vigilância em arboviroses, mas a gestão de todo o aparato que eles são responsáveis", ponderou.

O secretário municipal de saúde de Berizal, Edivaldo Farias da Silva Filho, questiona a versão de Baccheretti, e afirma que os municípios têm enfrentado dificuldades para o combate das arboviroses devido à falta de recursos. Ele, que é titular da pasta na cidade do Norte do Estado e presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Minas Gerais (Cosems-MG), afirma que esse tem sido um desafio para diversos gestores.

"Vivemos um momento difícil ascendente e esse aumento requer mais gastos e mais despesas. Com diminuição de repasse, há sobrecarrega ainda maior dos municípios e isso impacta diretamente nas ações", pontua. Edivaldo Filhoressalta, porém, que o Estado está sensível e sabe das necessidades das prefeituras, e que negocia a liberação de aproximadamente R$ 40 milhões para as cidades combaterem as doenças provocadas pelo Aedes aegypti.

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Planejamento e novos investimentos

Especialistas apontam que as alterações climáticas provocadas pelo fenômeno conhecido como El Niño contribuem para a infestação por Aedes aegypti e para a explosão de casos de dengue registrada no Brasil. Isso porque a combinação de altas temperaturas e chuvas intermitentes é a receita perfeita para a proliferação do mosquito. O fenômeno que atingiu o país no último ano ocorre em média a cada dois a sete anos, conforme a Organização Meteorológica Mundial (OMM).

De acordo com o secretário de Estado de saúde, Fábio Baccheretti, não foi possível antecipar a previsão do aumento dos casos de arboviroses por causa desse fenômeno. Segundo ele, essa percepção só ocorreu em outubro do último ano, quando teve início o período chuvoso. "Percebemos, naquele momento, que seria um ano (2024) muito difícil. Por isso, os primeiros recursos foram antecipados. Não é comum dois anos seguidos de epidemia", apontou o secretário.

Conforme o titular da pasta, o momento é delicado para a saúde pública, não somente em Minas Gerais. Outros Estados e países também enfrentam os impactos das doenças. "Além do fator climático (que favorece os focos do mosquito), temos o sorotipo 3 em circulação na América Central e o sorotipo 2 aumentando no Brasil. Há um movimento mundial de aumento de arboviroses, países que não tinham casos agora possuem, e Estados como o Rio Grande do Sul também. Essas mudanças climáticas nos colocam um desafio maior do que já tínhamos", acrescentou.

O secretário garante que, se necessário, o governo de Minas poderá aumentar os investimentos nas ações de enfrentamento às arboviroses em 2024. "Nosso foco é capacitar, estamos falando de 853 municípios, que podem ter de 866 habitantes até mais de 3 milhões de habitantes, com realidades distintas. Sabemos que nosso papel de capacitação vem surtindo efeito. A gente sempre avalia as projeções do que vem pela frente, uma previsão validada pelo Ministério da Saúde e pela Organização Pan-Americana de Saúde. Então, caso seja necessário recurso extra este ano, daremos", finalizou.