Imagine-se a seguinte situação: você sente atração por uma pessoa há algum tempo e, finalmente, tem a oportunidade de ter um encontro com ela. Tudo corre bem até que, na “hora h”, a mágica se quebra, e a sensação de frustração se sobrepõe ao contentamento de antes. No momento seguinte, emerge a dúvida: vale a pena dar uma segunda chance na esperança de que, então, as coisas se encaixem melhor? Ou será que, no sexo, a primeira impressão é a que fica?

Essas questões, que podemos nos fazer intimamente, também chegam ao divã. E, geralmente, surgem sob o signo da culpa. É o que explica a psicóloga e sexóloga Graziela Rodrigues da Silva Chantal. Ela recomenda que as trocas íntimas sejam encaradas com menos idealizações.

“Em primeiro lugar, é importante lembrar que, na primeira vez, nem tudo pode correr como o esperado de primeira. Aliás, dificilmente a transa será impecável nesses casos, até porque são duas pessoas que não se conhecem tão bem, que não sabem a preferência uma da outra”, avalia.

Mas, em geral, se algo não sai conforme o esperado, a tendência é que haja uma desconexão entre as partes. “Normalmente, acontece de a pessoa chamar a culpa para si e, sentindo-se mal com isso, passar a evitar aquele antigo affair. Ou seja, se vou para o encontro e a minha parceria brocha, se não tem ou não consegue manter uma ereção, posso pensar que não sou boa o suficiente para causar excitação. Se ela não tem um orgasmo, vou pensar que sou incapaz de satisfazê-la. Se eu não tenho, vou imaginar que sofro de algum distúrbio. E, se o sexo acaba rápido e a pessoa vai embora, me culpo por não ser interessante o suficiente para que a pessoa ficasse comigo por mais tempo…”, exemplifica a especialista, alertando que, muitas vezes, essa sensação de culpa gera angústia e baixa autoestima.

Graziela reconhece que, de fato, diante de uma eventual falha, as chances de um reencontro diminuem. “Há vários fatores que contribuem para que isso aconteça. Um deles é a vergonha, pois, se eu sinto que não sou boa o suficiente, posso ficar intimidada e simplesmente passar a evitar aquela parceria. Outro é a decepção, que também vai gerar o afastamento”, situa.

“Além disso, se tomar como verdade absoluta que aquele deslize é um sinal de incompatibilidade com o outro, mesmo ao dar uma segunda chance, posso fazer isso já pensando que não vai dar certo ou com uma autocobrança imensa, como se fosse a última chance de reverter a má impressão. Evidentemente, essa tensão vai tornar tudo mais difícil, e é bem provável que as coisas voltem a ir não tão bem”, destaca. “São mais raros os casos de pessoas que, depois de não ter um bom primeiro encontro, se mostram abertas para um segundo, sem colocar tanta pressão sobre o ato”, complementa.

Portanto, a verdade é que, no sexo, a impressão inicial costuma mesmo ficar – e assombrar. Afinal, a sexóloga lembra serem muitos os relatos de pessoas que, após terem a sensação de falhar em uma transa, chegam ao consultório com a certeza de sofrerem de alguma disfunção sexual. “Por mais que essas situações sejam normais, elas geram muito sofrimento e acabam sendo confundidas com algo mais grave”, aponta.

Mais diversão, menos obrigação

Graziela Chantal sinaliza que a frustração em relação ao primeiro encontro – “que deveria ser encarado como uma oportunidade de as partes se conhecerem melhor, sem tanta pressão” – está relacionada ao fato de estarmos habituados a uma lógica muito normativa de sexo, em que apenas a penetração genital é valorizada em detrimento de outras múltiplas possibilidades de prazer. 

“É como se a gente já fosse para a transa com um roteiro pronto do que deve ou não acontecer, o que gera mais autocobrança e limita as possibilidades de fazer do ato uma brincadeira a dois”, observa.

“E estamos falando de um script que vem tão pronto que fica parecendo que só nos resta nos adaptar a ele. Mas, se não conseguimos incorporar bem aquele papel, fica parecendo que não deu certo, que não valeu a pena”, salienta, fazendo críticas ao que chama de “cultura da obrigatoriedade do orgasmo”. 

“Fica parecendo que, em toda relação, independentemente de qualquer coisa, eu preciso gozar e preciso fazer o outro gozar. E que, ao ter um orgasmo, temos que performar de determinada maneira, ignorando que nem todos gozam do mesmo jeito, com a mesma intensidade. Portanto, se a expectativa é um desempenho cinematográfico, vai ser grande o risco de frustração. Além disso, tanta preocupação em manter uma performance impecável é um combustível para a ansiedade, que, ironicamente, vai nos deixar mais vulneráveis a possíveis deslizes”, estabelece. 

Questão de gênero. A especialista sinaliza que, embora homens e mulheres de qualquer orientação sexual sofram com essa pressão por causar uma boa impressão, quando o tema é satisfação sexual, a pressão costuma ser maior sobre eles.

“Os meninos, sobretudo quando estamos falando da população cisgênero, são ensinados a chamar para si a responsabilidade da relação e do prazer”, diz. “É como se eles é que tivessem que conduzir essa valsa, pois é esperado que eles, nessa oportunidade, deixem sua marca. Então, normalmente, os homens sofrem mais com essa autocobrança, como se tivessem que mostrar virilidade e potência sexual”, sinaliza.

A ala feminina, por outro lado, sofre mais pressão quanto à forma como se apresenta. “Elas são mais vulneráveis à pressão estética, então tendem a se preocupar mais se estão bonitas, em esconder uma gordurinha que julga ser um defeito”, avalia.