Dobradinhas e apadrinhamentos políticos são comuns em todas as eleições. É normal que candidatos se apoiem para conseguirem dividir os votos. Mas nem sempre a transferência de voto é automática e funciona. Exemplo disso é Minas Gerais. Dos governadores eleitos desde 2002, apenas Fernando Pimentel (PT), em 2014, foi apoiado diretamente pelo presidente eleito naquele pleito, no caso Dilma Rousseff (PT).
Nas eleições deste ano, até o momento, os dois líderes nas pesquisas para presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), possuem candidatos para o governo de Minas, Alexandre Kalil (PSD) e Carlos Viana (PL), respectivamente. No entanto, nenhum dos dois, conforme mostrou a última pesquisa DATATEMPO, ainda conseguiu transformar o apoio dos padrinhos em voto concreto para subir nas intenções de voto.
Para o professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e consultor em Marketing Político, Marcelo Vitorino, a forma como ocorre a transferência de votos mudou, e hoje, “para além de atrelar-se a padrinho eleitoralmente forte é preciso convencer o eleitor de que possui os mesmo ideais do padrinho.”
“A cabeça do eleitor mudou. A cabeça do eleitor de 10, 15 anos atrás não é a mesma de hoje. Antigamente era muito comum dizer: ‘Ah, fulano elege até um poste’. Isso não dá mais certo, porque o eleitor está mais crítico. Ele precisa se convencer que a indicação tenha as mesmas características que o indicador. O eleitor, hoje, entende que para que o voto dele migre, não seja tanto pela pessoa, mas pelos ideais que ela defende”, explicou Vitorino.
“Por exemplo, o candidato que queira abocanhar parte dos eleitores do Bolsonaro terá que se mostrar conservador, antipetista e que defende, em tese, a pauta anticorrupção. Já aquele que queira os votos do Lula vai ter que se mostrar mais assistencialista e mais progressista nas pautas morais”, pontuou o consultor em Marketing político.
O sociólogo e diretor de relações institucionais da Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais (Abrapel), Maurício Garcia vai na mesma linha que Vitorino e pontua que para que essa associação seja automática, a estratégia de campanha precisa tornar crível para o eleitor aquela aliança.
“É possível e existe espaço para essas associações. Mas precisa saber que na hora da campanha, da comunicação, esse candidato que vai ser apresentado para população, se aquilo é crível. Em tese elege-se “postes”, agora precisa mostrar quem é esse poste, se esse poste é confiável, se faz sentido essa aliança, ou se o poste não vai ser apenas um ‘pau mandado’”, afirmou.
Estratégias
A última pesquisa DATATEMPO, publicada na última segunda-feira (25), apontou um grande desafio para o ex-prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD). Ele, que tem o apoio do ex-presidente Lula, que lidera as intenções de voto para presidência no Estado, precisa transformar o apoio do petista em voto concreto.
Com o apoio de Lula, Kalil, ultrapassa Romeu Zema (Novo), que, apoiado por Felipe D’Ávila (Novo), cai de 48,3% dos votos para 27,5%. Vale ressaltar, porém, que, na pesquisa estimulada, sem que as alianças sejam informadas aos entrevistados, Zema permanece na liderança com folga e vence no primeiro turno quando levados em conta apenas os votos válidos.
E é justamente na perspectiva do que pontuou o consultor em Marketing Político, Marcelo Vitorino, que a campanha de Kalil parece trabalhar para conseguir abocanhar os votos lulistas do Estado. Segundo levantamento realizado pela reportagem às 17h47 da última quinta-feira (28), Kalil havia feito 66 postagem, desde a postagem que oficializou a aliança entre ele e Lula, no dia 19 de maio. Das 66 publicações, 34 fazem referência ao petista ou à aliança dos dois, ou seja um pouco mais da metade. O teor das postagens, em sua maioria, discursos como:”estou com Lula, porque, assim como eu, ele cuida de gente”.
Na avaliação do pesquisador eleitoral Maurício Garcia, embora as pesquisas ainda não mostrem essa associação automática entre Lula e Kalil, ela tende ser mais fácil, uma vez que no Estado, não há outro nome que dispute com Kalil neste campo.
“A aliança entre Lula e Kalil me parece mais clara. Sabemos que existem declarações antigas do Kali criticando o Lula e o PT, mas isso vai depender da campanha em conseguir argumentar com o eleitor de que aquilo foi outro momento. Mas em tese, há espaço aberto para o Kalil dentro do eleitorado lulista, porque em Minas não tem outro candidato que tenha ligação mais clara com o PT”, explicou Garcia.
Já o senador Carlos Viana (PL) também tem a candidatura a governador impulsionada com apoio de um presidenciável. Quando é dito aos eleitores que ele tem o apoio do presidente Jair Bolsonaro (PL), as intenções de voto dele sobem 12,3 pontos percentuais, de 3,7% para 16%, conforme a Data Tempo
No caso de Viana, o principal desafio é conseguir que Bolsonaro, de fato, se engaje em sua campanha e faça declarações e gestos públicos de apoio, o que não aconteceu desde que o senador trocou o MDB pelo PL em abril para ser candidato ao governo de Minas. O nome de Viana ainda não foi oficializado como candidato. O PL deixou para que a decisão seja da Executiva Nacional do partido.
Início oficial da campanha dará real dimensão dos apoios
O diretor de Relações Institucionais da Abrapel, Maurício Garcia, afirma que apenas com início da campanha oficial, a partir do dia 16 de agosto, sobretudo com o horário eleitoral gratuito em rádio e TV, dia 26 de agosto, que dará para se ter uma maior dimensão se esses apoios surtirão efeito nas escolhas do eleitor.
“Com a campanha, com a liberdade de propaganda e marketing que os candidatos terão só na campanha é que dá pra medir, de fato, o efeito desses apoios. Porque só assim terá mais espaços para conseguir cristalizar na cabeça do eleitor a associação de um candidato ao outro”, afirmou.
Segundo ele, o perfil das eleições atuais e o período menor de campanha dificultou também esse tipo de estratégia.
“ A campanha hoje tem um período mais curto, mas tem potencial para funcionar esse tipo de estratégia. Claro, a depender da comunicação adotada pelas equipes para conseguir convencer o eleitor de que a aliança é crível”, explica Garcia.
Megaexposição pode ser negativo, apontam cientistas políticos
Se por um lado, os apoios podem gerar transferência de votos, por outro, o candidato apoiado pode herdar apenas a rejeição. Isso é o que explica o professor e consultor em Marketing Político, Marcelo Vitorino.
“No momento em que nós estamos vivendo, os principais padrinhos (Lula e Bolsonaro) possuem rejeição. Então, quando você cola no padrinho, você tem a chance de não se assemelhar com ele na essência que é o que traz votos concretos e ainda pode herdar a rejeição. O uso do padrinho pode ser muito mais nocivo do que positivo”, pondera Vittorino.
Em Minas Gerais, Lula (PT) e Bolsonaro (PL), apesar de liderarem as intenções de voto, também figuram no topo da rejeição. Enquanto o atual presidente lidera, com 43 % de rejeição, o petista apresenta 30,1% de eleitores que não votariam de jeito nenhum nele.
Para o diretor da Abrapel, Maurício Garcia, esse cenário é delicado para o governador Romeu Zema (Novo).
“A situação dele é complicada, porque até internamente ele pode até querer se aproximar mais do Bolsonaro, mas ele sabe também que o Bolsonaro é radioativo. Se encostar muito ele pode se contaminar e se prejudicar e também ele não pode fechar uma porta de cara, caso o Lula ganhe”, afirmou.
"Em tese, candidato do Senado é associado ao candidato ao governo", diz pesquisador
O diretor de Relações Institucionais da Abrapel, Maurício Garcia explica que, historicamente, os senadores eleitos pelos Estados estavam ligados aos governadores eleitos.
“O Senado, geralmente, está muito ligado ao governador. A onda dos governadores que acabam elegendo os senadores. O Lula em 2010 elegeu inúmeros senadores, principalmente no Nordeste, mas em nenhum caso o senador que foi eleito, o governador também não foi”, explicou.
“Um candidato ao governo que dispara, que vem forte, ele tende a puxar o candidato ao Senado também. Ainda mais em eleição onde é um Senado só, como é essa agora”, completou.