O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não confirmou se irá comparecer à sede da Polícia Federal (PF) em Brasília (DF), nesta quinta-feira (22), para prestar depoimento. Ele foi intimado para falar sobre a suposta tentativa de golpe de Estado para continuar no poder, mas declarou que irá aguardar a orientação de seus advogados, que pediram o adiamento do depoimento até que tenham acesso às mídias que embasam a investigação. O pedido foi negado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

“Eu sigo a orientação dos advogados. Os advogados dizem que precisam ter acesso ao processo. Os processos são todos secretos, sigilosos, reservados, e os advogados se tiverem acesso até amanhã, obviamente que eu vou falar. Agora, se o advogado falar: 'não tivemos acesso, e são processos e inquéritos longos, de mil páginas'", disse nesta quarta-feira (21) em entrevista à rádio CBN Recife.

"Aí está o respeito ao Estado Democrático de Direito de (cumprir o) devido processo legal. Ninguém pode ser julgado sem saber do que está sendo julgado. Os advogados que decidem (se vou falar). (...) Ao longo desses quatro anos, me diga quantas vezes você ouviu eu falar: “dentro das quatro linhas”. Me aponte uma medida minha contra qualquer decisão do Parlamento ou Justiça brasileira”, acrescentou.

Alexandre de Moraes negou na noite de quarta-feira (20), pela segunda vez em menos de 24 horas, o pedido da defesa de Bolsonaro para que ele fosse dispensado de comparecer à superintendência da PF. Os advogados vêm tentando junto ao STF ter acesso à parte do processo referente à delação premiada do ex-ajudante de ordens tenente-coronel Mauro Cid.

Na segunda-feira (19), Moraes, que é relator do caso na Corte, já havia liberado a consulta aos autos desde que não se tratassem de diligências em andamento nem do acordo de Cid com a Justiça. Na ocasião, ele também recusou a dispensa ou adiamento do depoimento, alegado pela defesa como justificável pela falta de conhecimento de partes das acusações.

Também foram intimados a depor nesta quinta-feira dois ex-assessores de Bolsonaro. São eles Tercio Arnaud, apontado como um dos líderes do chamado “gabinete do ódio", e Marcelo Câmara, que foi preso pela PF na operação Tempus Veritatis (ou "tempo de verdade", em latim), deflagrada no último dia 8.

O depoimento

Citações apontam que Bolsonaro ordenou pessoalmente ajustes em uma minuta de golpe. O documento tinha, ao final, ordens de prisão para diversas autoridades, como Moraes, o também ministro do STF Gilmar Mendes e o presidente do Congresso Nacional e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Sobre Moraes, agentes da PF identificaram que o ministro tinha sua agenda, o deslocamento aéreo e a localização monitorados por um "núcleo de inteligência paralela" integrado pelo entorno de Bolsonaro.

A troca de conversas de uma reunião ministerial em julho de 2022, encontrada em um vídeo no computador de Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), "nitidamente revela o arranjo de dinâmica golpista" na "alta cúpula do governo" do ex-presidente, segundo a PF.

O material mostra Bolsonaro dizendo a todos os seus ministros que era necessário agir antes das eleições para que o Brasil não virasse “uma grande guerrilha”. O então presidente manifestou preocupação com a possibilidade de ser preso por "atos antidemocráticos" ao descer a rampa do Palácio do Planalto, a sede administrativa do governo federal em Brasília (DF), onde aconteceu a reunião.

Bolsonaro classifica fala de Lula contra Israel como 'criminosa'

Ainda na entrevista, Bolsonaro chamou de "criminosa" a comparação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entre os ataques de Israel na Faixa de Gaza, na guerra contra o Hamas, e o Holocausto, que foi a perseguição e o assassinato de judeus na Alemanha nazista por Adolf Hitler

“Não é uma fala infeliz, mas sim criminosa. Ofendeu não apenas os judeus, mas a humanidade. O que aconteceu na segunda guerra com a eliminação de judeus não existe na história do mundo. E o Lula compara o Exército de Israel aos nazistas? Chocou o mundo. O mundo democrático está olhando para o Brasil de forma diferente", disse Bolsonaro.

“As consequências dessa fala são enormes e influenciam em tudo com reflexo negativo dessa posição do presidente Lula. O governo israelense tem dito: 'reconhece o seu erro para voltarmos a conversar, e parece que o presidente Lula está dobrando a aposta'. Nós vamos ficar com quem no futuro? Com ditaduras? Vamos nos afastar do mundo democrático? Além de que a fala demonstra desconhecimento com o holocausto”, completou o ex-presidente.

“O que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu, quando Hitler resolveu matar os judeus", disse Lula no domingo (18), em viagem à Etiópia. A declaração gerou reações duras do governo de Israel e terminou em uma crise diplomática.