Investigação

Bombeiro seguiu Marielle por sete meses, até ela ser executada por dois PMs

Informação consta em delação premiada feita por PM que confessou que dirigiu o carro usado nos assassinatos da vereadora e do motorista dela

Por Renato Alves
Publicado em 24 de julho de 2023 | 12:21
 
 
 
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A vereadora Marielle Franco (PSOL) era seguida pelo ex-bombeiro militar Maxwell Simões Corrêa, o Suel, desde agosto de 2017, até a execução do plano criminoso, sete meses depois. A informação consta em delação premiada feita pelo ex-policial militar Élcio de Queiroz, que confessou, em troca de benefícios judiciais, que dirigiu o carro usado nos assassinatos da política e do motorista dela, Anderson Gomes, no Centro do Rio de Janeiro, em março de 2018. 

Também na delação, homologada pela Justiça fluminense, Élcio de Queiroz confirmou que o sargento da reserva da Polícia Militar Ronnie Lessa fez os disparos. O delator ainda entregou outro comparsa, o Suel, que teria sido o responsável por levantar informações sobre a rotina das vítimas. Suel foi preso pela PF na manhã desta segunda-feira (24). Ronnie e Élcio estão presos em penitenciária federal, à espera de julgamento, que não tem data marcada.

Informações sobre o envolvimento dos três citados foram feitas em duas entrevistas coletivas, realizadas em Brasília e no Rio de Janeiro, nesta segunda-feira. Na capital fluminense, o delegado da PF Guilhermo Catramby afirmou que Maxwell fazia campanas desde 2017 para levantar informações sobre a rotina de Marielle, conforme o depoimento prestado por Élcio, há duas semanas, e que levaram à operação desta segunda.

“O Élcio detalha algumas coisas em relação ao planejamento, e esses detalhes, e apesar de saber, não tem maiores informações, porque a efetiva participação foi a partir de 14 de março de 2018, e a participação do Suel foi ainda em agosto de 2017”, comentou Catramby.

De acordo com as investigações, Suel participou antes, durante e depois do crime: além de suporte logístico, ele realizou monitoramentos e ainda destruiu uma das provas do homicídio — o carro usado também para transporte de armas. No dia seguinte ao crime, ele ajudou  Ronnie Lessa e  Élcio de Queiroz a trocar as placas do veículo, a contactar a pessoa responsável por desmanchar o veículo e os executores a se livrarem das armas, jogando ao mar.

Informações de delator foram checadas e confirmadas por investigadores

Ainda na coletiva no Rio,  o promotor de Justiça Eduardo Morais Martins, integrante da força-tarefa formada com a PF para desvendar o crime ocorrido em 2018,  afirmou que as informações da delação premiada de Élcio de Queiroz foram confirmadas por levantamentos feitos pela investigação.

“A novidade que houve foi a colaboração (de Élcio), que não é por acaso. Fruto de trabalho de revisão, melhoramos o arcabouço probatório para que pudesse investir numa linha estratégica de delação. Foi corroborada com levantamento. Não adianta receber informação por si só. Só adianta quando é corroborada. Se mostrou, em vários momentos, completamente de acordo. A versão apresentada foi confirmada de forma bem taxativa”, ressaltou o promotor.

Eduardo Martins contou ainda que, na delação, Élcio de Queiroz disse que para conversas mais reservadas ele e Ronnie Lessa usavam o aplicativo Confide, que ofereceria “tripla confidencialidade” – nesse app a mensagem criptografada é destruída imediatamente após a leitura. Com a quebra de sigilo de dados da “nuvem”, peritos conseguiram comprovar o uso do aplicativo pelos supostos assassinos de Marielle e Anderson.

Marielle foi assassinada devido às causa que defendia

O promotor Eduardo Martins também afirmou que Marielle Franco foi alvo do grupo criminoso por causa do que ela defendia. Ele, no entanto, não disse que causas motivaram a ira dos assassinos.

“Desde a denúncia de Ronnie e Élcio, já se coloca na denúncia que o crime foi praticado por conta também das causas defendidas por Marielle. Isso não exclui outras possíveis motivações. Isso está na denúncia ( à Justiça)e permanece”, disse.

Flávio Dino disse que há outro envolvidos na morte de Marielle

Mais cedo, em Brasília, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, disse que a investigação realizada pela PF aponta que há outras pessoas envolvidas nos assassinatos de Marielle e Anderson, além dos três militares já presos.

“Sem dúvida há a participação de outras pessoas, isso é indiscutível. As investigações mostram a participação das milícias e do crime organizado do Rio de Janeiro no crime”, ressaltou Dino, ao lado do diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, na manhã desta segunda.

Dino convocou entrevista coletiva logo após o desencadeamento da operação para prender Maxwell Corrêa, o Suel e cumprir mandados de apreensão em apuração sobre o duplo homicídio. O ministro afirmou que, nas próximas semanas, devem ocorrer outras operações contra alvos apontados nas investigações como mandantes do crime. Até agora, a PF mirava os executores.

Dino contou que a operação desta segunda ocorreu a partir de delação premiada realizada há cerca de 15 dias por Élcio. “Élcio Queiroz confirmou em delação premiada a participação dele próprio, do Ronnie Lessa e do Maxwell. Temos o fechamento desta fase, com a confirmação de tudo que aconteceu no crime. Há elementos para um novo patamar da investigação, que é descobrir os mandantes”, afirmou o ministro.

Ronnie Lessa está preso à espera de julgamento

Ronnie Lessa negou, em depoimento, participação no crime. Ronnie e Élcio serão julgados pelo Tribunal do Júri. O julgamento ainda não tem data marcada. Ronnie Lessa, que tem ligação com milícias, já foi condenado por outros crimes: comércio e tráfico internacional de armas, obstrução das investigações e destruição de provas.

Já Maxwell Corrêa foi preso em casa, no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste da capital carioca. Contra ele foi expedido um mandado de prisão preventiva. Preso em junho de 2020, Suel foi condenado em 2021 a quatro anos de prisão por atrapalhar as investigações do Caso Marielle, mas cumpria a pena em regime aberto. 

De acordo com investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), Maxwell era o dono do carro usado para esconder as armas que estavam em um apartamento de Ronnie Lessa, acusado de ser um dos autores do crime. Suel também teria ajudado a jogar o armamento no mar.

PF entrou no caso após posse de Lula, que prometeu solucionar crime

Maxwell foi preso na Operação Élpis, primeira fase da nova investigação sobre o duplo assassinato – apesar da condenação de executotres, até hoje não se sabe quem é o mandante do crime. 

A PF iniciou uma apuração própria após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência da República. Ele se comprometeu a elucidar o Caso Marielle. O mesmo fez Flávio Dino em sua cerimônia de posse no ministério, na presença de familiares de Marielle Franco.

Em fevereiro, Dino anunciou que a PF iria “intensificar” a atuação em conjunto com o Ministério Público do Rio de Janeiro nas investigações sobre o assassinato. A decisão foi tomada após Dino se reunir com o procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro, Luciano Mattos.

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