Delação premiada

Mauro Cid diz em áudio que PF possui narrativa pronta contra Bolsonaro; ouça

Em áudios divulgados pela revista Veja, na noite desta quinta-feira (21), o militar ainda contou que se sentiu pressionado pelos investigadores

Por O Tempo Brasília
Publicado em 21 de março de 2024 | 21:37
 
 
 
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Figura central das investigações que miram Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados, o tenente-coronel Mauro Cid disse em áudios divulgados pela revista Veja, na noite desta quinta-feira (21), que a Polícia Federal (PF) possui uma narrativa pronta contra o ex-presidente. O então ajudante de ordens fechou delação premiada e, desde então, já prestou seis depoimentos aos investigadores. Ouça os áudios abaixo. 

Conforme a reportagem, o militar e então homem de confiança de Bolsonaro, contou que se sentiu pressionado nos depoimentos e criticou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que homologou o acordo de colaboração premiada. Nos áudios, Cid diz que foi pressionado a relatar fatos que não aconteceram e a detalhar eventos sobre os quais não tinha conhecimento. 

“Eles (os policiais) queriam que eu falasse coisa que eu não sei, que não aconteceu”, disse em um primeiro áudio. “Não adianta. Você pode falar o que quiser. Eles não aceitavam e discutiam. E discutiam que a minha versão não era a verdadeira, que não podia ter sido assim, que eu estava mentindo”, completou. 

De acordo com a revista Veja, a gravação foi realizada na semana passada, depois que o tenente-coronel prestou depoimento à PF no último dia 11, e que durou nove horas. Para receber os benefícios da delação premiada, o colaborador é obrigado a falar a verdade. E, segundo Cid, os investigadores estavam com a “narrativa pronta”. 

“Eles estão com a narrativa pronta. Eles não queriam saber a verdade, eles queriam só que eu confirmasse a narrativa deles. Entendeu? É isso que eles queriam. E todas as vezes eles falavam:  Ó, a sua colaboração está muito boa’. Ele (o delegado) até falou: ‘Vacina, por exemplo, você vai ser indiciado por nove negócios de vacina, nove tentativas de falsificação de vacina. Vai ser indiciado por associação criminosa e mais um termo lá’. Ele falou assim: ‘Só essa brincadeira são trinta anos para você’.” 

Os áudios do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro foram enviados para um amigo em uma espécie de desabafo. Ainda segundo ele, os delegados responsáveis pelo caso apenas registravam as informações que se encaixavam naquilo que ele chama de “narrativa”. “Eu vou dizer o que eu senti: já estão com a narrativa pronta deles, é só fechar, e eles querem o máximo possível de gente para confirmar a narrativa deles. É isso que eles querem”. 

Mauro Cid critica Alexandre de Moraes

Em outro áudio, ele ainda critica Alexandre de Moraes, dando a entender que o ministro, que é relator de diversos casos no Supremo que miram o ex-presidente, quer prender Bolsonaro. “A lei já acabou há muito tempo. Eles são a lei. O Alexandre de Moraes é a lei. Ele prende, ele solta, quando ele quiser, como ele quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem acusação”,  diz.

O tenente-coronel ainda fala para o amigo que a PF tem feito uma filtragem das informações que estão sendo oficializadas na delação. Segundo Cid, um encontro entre Moraes e Bolsonaro, não foi registrado nos depoimentos. “Eu falei daquele encontro do Alexandre de Moraes com o presidente, eles ficaram desconcertados, desconcertados. Eu falei: ‘Quer que eu fale? Eu não vou botar no papel porque senão eu vou me f*****, mas o presidente encontrou secretamente com Alexandre de Moraes". 

As críticas contra Moraes continuam, com o Cid dizendo que o ministro do STF “já tem a sentença dele pronta”. “Acho que essa é que é a grande verdade. Ele já tem a sentença dele pronta. Só tá esperando passar um tempo. O momento que ele achar conveniente denuncia todo mundo, o PGR acata, aceita e ele prende todo mundo”. 

Mauro Cid fechou acordo de delação premiada com a PF em setembro do ano passado, após ficar preso por 129 dias. Ele foi detido no âmbito da operação que apura a inserção de informações falsas de doses da Covid-19 em cartões de vacinas de familiares dele, de Bolsonaro, da filha do ex-presidente e de dois seguranças. Ao fechar o acordo e ao se comprometer a dizer a verdade, o colaborador consegue vantagens, como tempo de pena menor caso seja condenado. 

‘Bolsonaro ficou milionário’ e ‘eu me f****”, diz Mauro Cid

Ainda nos áudios, Mauro Cid fala da situação em que se tornou “traidor” e, desde então, tem o nome envolvido em manchetes diariamente. “Quem mais se f**** fui eu. Quem mais perdeu coisa fui eu. Pensa todo mundo aí. Ninguém perdeu carreira, ninguém perdeu vida financeira como eu perdi. Todo mundo já era quatro estrelas, já tinha atingido o topo, né?”.

Ele também diz que Bolsonaro ficou milionário com a ajuda de apoiadores. “O presidente teve Pix de milhões, ficou milionário, né? “Para político é até bom essas p***** porque eles até conseguem se eleger fácil. O único que teve pai, filha, esposa envolvido, o único que perdeu a carreira, o único que perdeu a vida financeira toda fui eu”, desabafou.

Para explicar o motivo que fechou o acordo de delação premiada, o tenente-coronel fala que senão fizesse isso, iria pegar “30, 40 anos de prisão porque eu estou em vacina, eu estou em joia”. Ele ainda acredita que as investigações vão continuar avançando e todos que estão de certa forma envolvidos vão ser condenados. 

“Vai entrar todo mundo em tudo. Vai somar as penas lá, vai dar mais de 100 anos para todo mundo. A cama está toda armada. E vou dizer: os bagrinhos estão pegando 17 anos. Teoricamente, os mais altos vão pegar quantos?”. Além do caso das vacinas, a delação de Cid embasa outras operações, como a que apura uma trama de golpe de Estado e das joias sauditas que envolvem o ex-presidente e a mulher, Michelle Bolsonaro

Advogado de Mauro Cid criticou indiciamento e afirmou que decisão 'viola acordo'

A defesa de Mauro Cid, representada pelo advogado Cezar Bittencourt, expressou descontentamento com o indiciamento de seu cliente no inquérito sobre a suposta fraude em cartões de vacina da Covid-19, na última terça-feira (19). Esse indiciamento também resultou no Bolsonaro e de outras 16 pessoas.

À GloboNews, Bittencourt afirmou: "[Estou] absolutamente insatisfeito com o indiciamento ali proposto. Não faz parte do nosso acordo [...] é ilegal e abusivo. Não concordo com isso".

Neste mesmo dia, a Polícia Federal alegou que o ex-presidente "ordenou" seu então auxiliar de ordens a manipular comprovantes de vacinação contra Covid-19 em nome dele e de sua filha, Laura Firmo Bolsonaro, na época com 11 anos.

De acordo com a investigação, os dados falsos sobre a imunização foram elaborados com a colaboração de servidores da Prefeitura de Duque de Caxias, sugerindo que ambos teriam recebido doses na cidade da Baixada Fluminense.

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