O desapego de Marcos Frederico é notável. Ele não quer mais nomear as coisas, ao menos por hora – ou, antes, pretende ultrapassar os limites da nomeação – tanto que veio da parceira Ana Rodrigues a “brilhante sugestão” para o título de seu novo álbum, o oitavo de uma carreira iniciada no mercado fonográfico em 2007, com “Sinuca Tropical”.
Agora ele chega a “Despalavra”, referência explícita ao poema homônimo do mato-grossense Manoel de Barros (1916-2014), cujo lançamento acontece neste sábado (12/7) com um show no Música aos Montes. Marcos abriu mão até de nomear o seu próprio trabalho, talvez sem perceber o conteúdo significativo deste gesto.
“A proposta é buscar uma linguagem que vá além das palavras convencionais, onde os poetas possam reconstruir o mundo a partir de afetos ou imagens, por exemplo. E porque não por notas musicais? Pensei comigo. As melodias do disco contam histórias, falam por si só”, corrobora ele, indo ao encontro do desejo exposto pelo poeta de “compreender o mundo sem conceitos”.
Ao longo de nove faixas instrumentais, Marcos passa pelo choro, o fado e a valsa, tendo como escudeiro o seu inseparável bandolim que faz as vezes de um Sancho Pança deste Dom Quixote contemporâneo.
“Tocando diariamente a gente vai descobrindo novos caminhos no instrumento. A digitação e a palhetada vão evoluindo e fazendo com que a sonoridade fique mais limpa e com mais personalidade. Criam-se então novas possibilidades para compor e improvisar. É um mundo infinito de descobertas e desafios”, afiança o músico.
O título do álbum “veio só depois”, seguindo a premissa do colombiano Gabriel García Márquez (1927-2014), para quem o final de um livro deveria estar na cabeça do escritor antes de tudo. Diante da foto da capa feita por Pedro David, o batismo foi imediato. Mais uma vez, a natureza plástica da imagem antecedeu o reino concreto da palavra.
Encontros
“Andaluza”, com Chico Amaral, é a única parceria, num tête-à-tête cada vez mais incomum em tempos de redes sociais. “As outras foram brotando no decorrer dos últimos cinco anos”, conta Marcos, que exibe sua habilidade com “choro lento, choro complexo, valsa moderna, experimentações harmônicas e eletrônicas”.
Um dos destaques é a participação especial de Paulinho Santos, que integrou o histórico grupo mineiro Uakti, com sua inconfundível marimba em “Voo Livre”. Já “Montanha Russa”, nas palavras do anfitrião, “abraça todo esse processo”.
“Comecei a compô-la em 2020 e a finalizei agora, em 2025. Foi a última a ser gravada. Percebi então que mais um ciclo havia se fechado”, sintetiza. O resultado dessa nova aventura autoral concentra tudo aquilo que o instrumentista vem “jogando no liquidificador durante toda a carreira”.
Tanto que, na apresentação ao público, além da mais recente lavra, ele promete pinçar ao menos uma faixa de cada álbum lançado. E não para por aí. Marcos intenciona colocar na praça, ainda este ano, um disco de canções que vem produzindo paralelamente.
Como no caso do último, que só conheceu o batismo na última hora, ele segue “sem título, mas bem adiantado”. Já disponibilizadas nas plataformas digitais, “Porto-Poema”, “Flor Tupiniquim” e “Elo Perdido” devem integrar o projeto vindouro. Outro foco do irrequieto artista é a folia carnavalesca, independentemente do calendário.
“Nos últimos 13 anos compus dezenas de marchinhas, com vários parceiros e parceiras. No meu caso funciona como uma válvula de escape. É onde exerço a minha criatividade humorística e ácida. Para as marchinhas estou sempre a postos. Tem as que vêm fora de época, mas no Carnaval elas chegam sem pedir licença”, confirma.
Arremate
Marcos, aliás, percebe uma confluência entre o chorinho e as marchas. “O choro oferece várias alternativas harmônicas e melódicas, o que faz a diferença na hora de compor as marchinhas. É uma linguagem parecida. Apesar de ser levada muito a sério pelos chorões, a roda de choro carrega sempre um clima irreverente. Ao mesmo tempo que rimos com chorinhos divertidos, choramos de emoção com temas inspirados”, arremata.
Serviço
O quê. Show de lançamento do álbum “Despalavra”, de Marcos Frederico
Quando. Neste sábado (12/7), às 17h
Onde. Música aos Montes (av. Agulhas Negras, 225, Mangabeiras)
Quanto. Ingressos a R$15