BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negou haver uma “guerra” entre o governo e o Congresso Nacional. Também disse ser grato pela relação com o Parlamento e defendeu “divergências” como algo salutar no diálogo entre os Poderes da República.
As declarações foram dadas na manhã desta sexta-feira (4) em Duque de Caxias (RJ), durante cerimônia de anúncio de investimentos da Petrobras em refino e petroquímica. Governo e Congresso deflagraram uma crise por causa do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
“Deixa eu falar uma coisa para o Congresso, porque parece que tem uma guerra entre o governo e o Congresso. Eu sou muito agradecido à relação que eu tenho com o Congresso Nacional. Até agora, nesses dois anos e meio, o Congresso aprovou 99% das coisas que nós mandamos ao Congresso”, afirmou Lula em discurso.
“Quando tem uma divergência, é bom. Sabe por quê? Porque a gente senta na mesa, vai conversar e resolver. O governo pensa uma coisa, o Congresso tá pensando outra. Nós vamos resolver isso numa mesa de negociação”, completou o petista.
Pouco antes, em Brasília, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os efeitos dos decretos que tratam do IOF e determinou uma audiência de conciliação entre o governo federal e o Congresso Nacional.
A medida suspende tanto as normas editadas por Lula, quanto os decretos legislativos aprovados pelo Congresso. Com a decisão, fica mantido o estágio atual, em que as alíquotas do IOF permanecem às anteriores à elevação do tributo.
Moraes deu cinco dias para que o Executivo e o Legislativo prestem esclarecimentos sobre as decisões que envolvem o tema.
A audiência de conciliação foi marcada para 15 de julho, às 15h, na sala de audiências do tribunal. Devem participar integrantes da Presidência da República, da Câmara, do Senado, da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Advocacia-Geral da União (AGU).
Depois desta etapa, Moraes voltará a analisar a necessidade de manter os decretos suspensos. O ministro é o relator das ações no STF que discutem a legalidade de decretos presidenciais que aumentaram o imposto e do decreto legislativo que suspendeu esses aumentos.
constitucional escreveu que o vaivém do IOF causou um “indesejável embate entre as medidas do Executivo e Legislativo”. O ministro apontou a existência de “fortes argumentos que indicam a existência de razoabilidade na imediata suspensão da eficácia dos decretos impugnados”.
“Verifica-se que tanto os decretos presidenciais, por séria e fundada dúvida sobre eventual, desvio de finalidade para sua edição, quanto o decreto legislativo, por incidir em decreto autônomo presidencial, aparentam distanciar-se dos pressupostos constitucionais exigidos para ambos os gêneros normativos”, escreveu o ministro na decisão.
Motta e AGU também repercutem decisão
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse, por meio de publicação no X, que a decisão de Moraes “evita o aumento do IOF em sintonia com o desejo da maioria do plenário da Câmara dos Deputados e da sociedade”.
“Continuamos abertos ao diálogo institucional, com respeito e serenidade, sempre em busca do equilíbrio das contas públicas e do crescimento sustentável da economia”, escreveu Motta.
Por meio de nota, o advogado-geral da União, Jorge Messias, disse não ver a decisão de Moraes como uma derrota e ressaltou que a ACGU, representante do governo federal, valoriza o debate.
“O voto do ministro-relator entende como razoável e plausível a argumentação da União sobre a violação do princípio da separação de poderes, conforme sustentado pela AGU”, diz o comunicado.
“Além disso, destaca a necessidade de esclarecer a dúvida levantada pelo Congresso Nacional sobre possível desvio de finalidade dos decretos presidenciais, especialmente em razão do caráter fiscal das medidas”, prossegue.
“A AGU demonstrará a total conformidade dos decretos presidenciais com a Constituição, enfatizando seu adequado uso na condução da política econômica, cambial e securitária do Poder Executivo Federal”, conclui.
Entenda a disputa sobre o IOF
O aumento do IOF foi decidido pelo governo em maio para inflar a arrecadação e cumprir a meta fiscal. A expectativa do Ministério da Fazenda era gerar mais R$ 20 bilhões em receitas neste ano.
Os decretos, no entanto, não foram bem recebidos pelo Congresso, que iniciou um movimento de derrubada da decisão do governo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a negociar um texto de consenso com líderes partidários, mas sem sucesso.
A Câmara e o Senado derrubaram o aumento do IOF em 25 de junho, e a queda da nova alíquota tributária foi promulgada no dia seguinte. Dessa forma, as taxas do imposto voltaram a ser menores, como eram até o fim de maio.
O caso foi, então, judicializado. Antes mesmo da decisão do Congresso, o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, foi ao STF pedir a suspensão dos decretos do presidente Lula.
Na terça-feira (1º), o governo acionou o STF para tentar manter em vigor os decretos que aumentaram o IOF. A decisão foi de Lula da Silva, após avaliação da AGU.
Jorge Messias afirmou que o Congresso não poderia ter sustado “de modo algum” o decreto presidencial que altera regras de cobrança do IOF.
“Considerando que a Ação Declaratória de Constitucionalidade visa exatamente preservar a integridade, a higidez do ato praticado pelo chefe do Poder Executivo, a conclusão lógica é que este decreto continuaria válido. Portanto, ele não poderia ter sido, de modo algum, suspenso por ato do Congresso Nacional”, disse na ocasião.