BRASÍLIA – Apesar da pressão de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para que o Senado paute o impeachment de Alexandre de Moraes, nunca na história do Brasil republicano um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) foi impedido de exercer o cargo por decisão do Congresso Nacional.
A única situação semelhante ocorreu em 1894, quando o Senado rejeitou a indicação de Cândido Barata Ribeiro, que havia sido nomeado ministro do STF pelo presidente Floriano Peixoto. Ele chegou a exercer o cargo por 11 meses, pois, naquela época, os indicados podiam assumir antes da aprovação dos senadores.
Médico e ex-prefeito do Rio de Janeiro, Barata Ribeiro foi afastado sob o argumento de que não possuía o “notório saber” exigido pela Constituição – ainda que a exigência específica por “saber jurídico” só tenha sido incluída no texto constitucional em 1934.
Impeachment de ministros do STF está previsto em lei
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem 134 anos. Foi instalado em 28 de fevereiro de 1891, com a primeira sessão plenária, de acordo com o Portal STF, marcando o início de suas atividades na República. Mesmo previsto na Lei nº 1.079/1950, o impeachment de ministros da Corte jamais foi efetivado.
Desde 2001, o Senado recebeu 176 pedidos de impeachment de ministros do STF, a maioria deles engavetada antes mesmo de qualquer análise formal. Alexandre de Moraes lidera o ranking, com 48 representações contra ele. Na sequência estão os ministros Luís Roberto Barroso (28 pedidos) e Gilmar Mendes (22).
Como funciona o rito do impeachment de um ministro do STF
Qualquer cidadão pode apresentar uma denúncia por crime de responsabilidade contra um ministro do Supremo. A petição, que precisa conter a assinatura de pelo menos cinco testemunhas, é entregue diretamente ao Senado Federal, responsável exclusivo por conduzir esse tipo de processo.
Após o recebimento, a Mesa Diretora da Casa analisa o documento, e a decisão de dar seguimento ou arquivar o pedido cabe exclusivamente ao presidente do Senado - atualmente, é Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) quem ocupa o cargo. Se o presidente decidir acatar a denúncia, é criada uma comissão especial que elabora um parecer recomendando ou não a abertura do processo.
Esse parecer precisa ser aprovado em plenário por maioria simples, ou seja, pela maioria dos presentes no plenário, com quórum de pelo menos 41 dos 81 senadores. Caso aprovado, o ministro denunciado é imediatamente afastado do cargo até a conclusão do julgamento.
O processo de julgamento também ocorre no plenário do Senado, onde os senadores votam se o ministro cometeu crime de responsabilidade. Para que o impeachment seja aprovado, são necessários os votos de dois terços da Casa (54 senadores).
Se condenado, o ministro perde o cargo e pode ficar impedido de exercer função pública por até cinco anos – nos mesmos moldes do processo de impeachment de presidentes da República, como ocorreu com Dilma Rousseff em 2016.
O que configura crime de responsabilidade
A Lei 1.079/1950 define cinco condutas passíveis de impeachment de ministros do STF:
- Alterar o conteúdo de decisão judicial fora dos trâmites legais;
- Julgar processos nos quais deveria se declarar suspeito;
- Atuar com envolvimento político-partidário;
- Negligenciar os deveres do cargo;
- Quebrar o decoro ou a honra da função.
PGR, AGU e integrantes de conselhos também podem ser destituídos pelo Senado
Além dos ministros do STF, outras autoridades estão sujeitas a esse tipo de denúncia: o procurador-geral da República, o advogado-geral da União, e integrantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Nenhum desses cargos, no entanto, jamais foi alvo de impeachment bem-sucedido.
Mesmo com a ameaça da oposição de “obstruir” os trabalhos no Congresso até que Moraes seja julgado, a estrutura legal e política vigente mostra que dificilmente o processo avançaria sem apoio do presidente do Senado – e sem ampla maioria parlamentar.