Aliados de Jair Bolsonaro (PL) têm usado suas redes sociais para reforçar o ato convocado pelo ex-presidente para o dia 25 de fevereiro na Avenida Paulista, em São Paulo. A intenção de Bolsonaro é se defender, como o próprio disse, de investigações que apontam a tentativa de um suposto plano de golpe de Estado para mantê-lo no poder em 2022.
A maioria tem compartilhado o vídeo de convocação para o ato gravado por Bolsonaro com a data, o horário, o local ou o lema "Deus, Pátria, Família e Liberdade", repetido pelo político. É o caso dos deputados federais Nikolas Ferreira (PL-MG), Ricardo Salles (PL-SP), Júlia Zanatta (PL-SC), Carlos Jordy (PL-RJ) e Alexandre Ramagem (PL-RJ).
Esses dois últimos foram alvos da Polícia Federal (PF) em janeiro, em operações distintas. Enquanto Jordy sofreu buscas em seus endereços por suposta participação nos ataques do 8 de janeiro (que terminaram na depredação das sedes dos Três Poderes, em Brasília), Ramagem foi alvo pelo suposto esquema de espionagem ilegal na Agência Brasileira de Inteligência (Abin), quando chefiou o órgão no governo Bolsonaro.
Outros aliados do ex-presidente têm reforçado a convocação. "No dia 25 de fevereiro de 2024 temos um encontro marcado com o nosso Presidente
@jairbolsonaro, as 15 horas na paulista. Em defesa da liberdade, da democracia e do estado de direito em nosso País", escreveu o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN). "Nós não vamos desistir do Brasil! Dia 25, estaremos juntos!", publicou o senador Jorge Seif (PL-SC).
O advogado e assessor de Bolsonaro, Fábio Wajngarten, apostou na estratégia de ampliar o apoio ao ex-presidente de forma antecipada. Ele estimou que o ato reunirá 500 mil apoiadores de Bolsonaro e atacou qualquer estimativa feita no dia que aponte um número menor de presentes.
"Já tô avisando desde já: Dia 25/2 teremos mais de 500 mil pessoas na Paulista. Mais de 10 quarteirões transbordando de apoiadores. E não me venham com cálculos de terceiros com 8514 pessoas. #vaisergigante", escreveu no X (antigo Twitter).
No vídeo de convocação, publicado na noite de segunda-feira (12), Bolsonaro declarou que realizará "um ato pacífico em defesa do nosso Estado Democrático de Direito".
"Peço a todos vocês que compareçam trajando verde e amarelo. E mais do que isso, não compareçam com qualquer cartaz ou faixa contra quem quer que seja. Nesse evento, quero me defender de todas as acusações que têm sido imputadas a minha pessoa nos últimos meses. Mais do que discurso, uma fotografia", disse.
A operação Tempus Veritatis (ou "hora da verdade", em latim), deflagrada na quinta-feira (8) pela PF, investiga "a tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, para obter vantagem de natureza política com a manutenção do então presidente da República no poder". Citações apontam que Bolsonaro ordenou pessoalmente ajustes em uma minuta de golpe.
O documento tinha, ao final, ordens de prisão para diversas autoridades, como Moraes, o também ministro do STF Gilmar Mendes e o presidente do Congresso Nacional e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Sobre Moraes, agentes da PF identificaram que o ministro tinha sua agenda, o deslocamento aéreo e a localização monitorados por um "núcleo de inteligência paralela" integrado pelo entorno de Bolsonaro.
A troca de conversas da reunião, divulgada nesta sexta-feira após o vídeo encontrado no computador de Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), "nitidamente revela o arranjo de dinâmica golpista" na "alta cúpula do governo" do ex-presidente, segundo a PF.
O material também mostra Bolsonaro dizendo a todos os seus ministros que era necessário agir antes das eleições para que o Brasil não virasse “uma grande guerrilha”. O então presidente também manifestou preocupação com a possibilidade de ser preso por "atos antidemocráticos" ao descer a rampa do Palácio do Planalto, a sede administrativa do governo federal em Brasília (DF), onde aconteceu a reunião.
Ainda na reunião, o então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno afirmou: "tiver que virar a mesa é antes das eleições", acrescentando que não teria "VAR". Ele disse ter sua visão "clara" de que seria necessário "agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas".
Heleno afirmou, inicialmente, que teria conversado com o então diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Vitor Carneiro para "infiltrar agentes nas campanhas eleitorais", alertando sobre o risco de descoberta. Bolsonaro o interrompeu e pediu que conversassem de forma reservada depois.
Foram cumpridos 33 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e 48 medidas cautelares diversas da prisão nos Estados do Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Ceará, Espírito Santo, Paraná, Goiás e no Distrito Federal. Bolsonaro foi alvo de cautelar para entregar o passaporte em 24 horas. Há indícios dos crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.
As apurações apontam que o grupo investigado se dividiu em núcleos de atuação para disseminar a ocorrência de fraude nas eleições presidenciais de 2022, antes mesmo da realização do pleito, para tentar viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital.
De acordo com a investigação, o primeiro eixo consistiu na construção e propagação da versão de fraude nas eleições de 2022. Isso ocorreu por meio da disseminação falsa de vulnerabilidades das urnas eletrônicas de votação, discurso reiterado pelos investigados desde 2019 e que persistiu mesmo após os resultados do segundo turno do pleito em 2022.
A PF apontou que o segundo eixo de atuação consistiu na prática de atos para "subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito, por meio de um golpe de Estado, com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível".
Mandados de busca e apreensão
Mandados de prisão
Medidas cautelares que podem incluir apreensão de passaporte e/ou proibição de manter contato com os demais investigados
Suspensão do exercício de função pública
Eixos de atuação
A PF aponta que a investigação está relacionada com a atuação de organização criminosa com cinco eixos de atuação:
A Polícia Federal enumerou os núcleos de atuação do grupo existentes e atuantes para operacionalizar medidas para desacreditar o processo eleitoral; planejamento e execução do golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito; com a finalidade de manutenção e permanência de seu grupo no poder:
1. Núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral
Forma de atuação: produção, divulgação e amplificação de notícias falsas quanto a lisura das eleições presidenciais de 2022 com a finalidade de estimular seguidores a permanecerem na frente de quartéis e instalações, das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para o golpe de Estado.
2. Núcleo responsável por incitar militares à aderirem ao golpe de Estado
Forma de atuação: eleição de alvos para amplificação de ataques pessoais contra militares em posição de comando que resistiam às investidas golpistas. Os ataques eram realizados a partir da difusão em múltiplos canais e através de influenciadores em posição de autoridade perante a "audiência" militar.
3. Núcleo Jurídico
Forma de atuação: assessoramento e elaboração de minutas de decretos com fundamentação jurídica e doutrinária que atendessem aos interesses golpistas do grupo investigado.
4. Núcleo operacional de apoio às ações golpistas
Forma de atuação: a partir da coordenação e interlocução com o então ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, Mauro Cid, atuavam em reuniões de planejamento e execução de medidas no sentido de manter as manifestações em frente aos quartéis militares, incluindo a mobilização, logística e financiamento de militares das forças especiais em Brasília.
5. Núcleo de inteligência paralela
Forma de atuação: coleta de dados e informações que pudessem auxiliar a tomada de decisões do então presidente na consumação do golpe de Estado. Monitoramento do itinerário, deslocamento e localização do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e de possíveis outras autoridades da República com objetivo de captura e detenção quando da assinatura do decreto de golpe de Estado.
6. Núcleo de oficiais de alta patente com influência e apoio a outros núcleos
Forma de atuação: utilizando-se da alta patente militar que detinham, agiram para influenciar e incitar apoio aos demais núcleos de atuação por meio do endosso de ações e medidas a serem adotadas para consumação do Golpe de Estado.