Lorenza Maria Silva de Pinho, 41, morreu por estrangulamento e intoxicação, segundo laudo da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG). O documento inédito foi obtido com exclusividade por O TEMPO no início da noite de quinta-feira (29), minutos depois do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), à frente da investigação da morte da mulher do promotor André de Pinho, 51, adiar para a tarde de sexta-feira (30) a conclusão do laudo. Legistas que assinam a perícia indicam que o óbito foi provocado por “asfixia por associação de intoxicação exógena e ação contundente cervical”. A interpretação do laudo foi feita por especialistas ouvidos pela reportagem.
Fontes ligadas à investigação revelaram à reportagem, também nesta quinta-feira, que o órgão estadual irá oferecer denúncia à Justiça contra o promotor pelo feminicídio de Lorenza. De acordo com as informações obtidas, o laudo do Instituto Médico Legal (IML) atestou a existência de lesões internas graves no corpo da mulher – evidência que, segundo fontes, corrobora a hipótese de assassinato. A “ação contundente cervical”, para eles, diz respeito a movimentos de esganadura.
A versão é alvo de contestação por parte dos advogados à frente da defesa do promotor de 51 anos. “É um absurdo essa informação que está sendo repassada pela mídia sobre Lorenza ter sido morta esganada. Essas fontes não viram o laudo correto do Ministério Público. É uma irresponsabilidade afirmar algo que você não viu e não tem conhecimento técnico para analisar. Estou decepcionado e indignado”, desabafou o advogado de Pinho, Robson Lucas Silva.
Ele e o segundo defensor do promotor, Epaminondas Fulgêncio, contrataram uma equipe técnica pericial particular para analisar o laudo sobre a morte de Lorenza emitido pelo Ministério Público de forma antecipada para os defensores. A perícia paga constatou que a mulher morreu por intoxicação devido a junção de antidepressivos e álcool. Peritos contratados questionaram o laudo do IML, que indicou também a existência de hematomas internos no corpo de Lorenza. Segundo a equipe de defesa, médicos particulares atestaram que essas lesões – e a “ação cervical contundente” – foram fruto das manobras de ressuscitação e intubação feitas pelo clínico geral que prestou os primeiros socorros a Lorenza na manhã de 2 de abril, quando ela morreu.
Impugnação
Advogados à frente da defesa do promotor André Luis Garcia de Pinho, 51, suspeito de matar a própria mulher, pretendem pedir a impugnação do laudo pericial do Instituto Médico Legal (IML) se, nesta sexta-feira (30), o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) oferecer denúncia contra o cliente por feminicídio. A equipe formada por Robson Lucas Silva e Epaminondas Fulgêncio contratou uma perícia particular para avaliar o laudo da Polícia Civil por eles acessado na última terça-feira (27).
Leia a nota de esclarecimento na íntegra:
Atraso na conclusão
Contrariando a expectativa inicial da família de Lorenza e da equipe de advogados do promotor, a conclusão da investigação com a revelação de detalhes do laudo pericial não aconteceu nesta quinta-feira (29). Estimativa inicial que perdurou no decorrer de todo o dia indicava que documento feito pela perícia sobre a morte da mulher seria divulgado após as 17h.
Às 19h49, contudo, o procurador-geral Jarbas Soares Júnior, responsável pela apuração, informou por meio de sua página no Twitter que os resultados da investigação serão divulgados apenas na tarde de sexta-feira (30). “Nesta noite lerei o relatório e analisarei os laudos. Que Deus nos ilumine”, escreveu em seu perfil.
Amanhã, às 15h30, na sede do @MPMG_Oficial , serão apresentados os resultados das investigações feitas por membros do MP, com o apoio da @pcmgoficial, sobre as circunstâncias da morte de Lorenza de Pinho. Nesta noite lerei o relatório e analisarei os laudos. Que Deus nos ilumine.
— Jarbas Soares Junior (@jarbassoaresjr) April 29, 2021
O pai de Lorenza, o aviador aposentado, Marco Aurélio Silva, disse que vai esperar o resultado oficial do laudo ser divulgado pelo Ministério Público. Só depois disso ele vai se pronunciar sobre o assunto.
Relembre
Cerca de um mês se passou após a morte de Lorenza Maria Silva de Pinho, 41, e uma sucessão de fatos permeia a investigação coordenada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A mulher do promotor de Justiça André Luis Garcia de Pinho, 51, morreu entre a madrugada e o início da manhã de 2 de abril. O óbito foi constatado por um médico da emergência do Hospital Mater Dei no apartamento onde o casal vivia com seus cinco filhos, no bairro Buritis, na região Oeste de Belo Horizonte. A seguir, a retrospectiva com os episódios mais importantes da investigação:
2 de abril
Morre Lorenza Maria Silva de Pinho, 41;
Promotor André Luis Garcia de Pinho liga para a emergência do Hospital Mater Dei e solicita uma ambulância para a mulher;
Médico Itamar Tadeu Gonçalves Cardoso é direcionado ao apartamento da família Pinho, no bairro Buritis. Ele tenta ressuscitá-la. No atestado de óbito, o plantonista registra morte por autointoxicação.
3 de abril
Velório de Lorenza marcado para acontecer entre 10h e 12h. Fonte que pediu sigilo disse que uma sala foi reservado no Funeral House para a cerimônia;
Hipótese de feminicídio é levantada. Corpo não chega a ser velado e é transferido para o Instituto Médico Legal (IML).
4 de abril
Promotor André é detido no apartamento da família dois dias após a morte da mulher. Ele é apontado como suspeito de assassiná-la;
5 de abril
André troca de advogado horas antes de ser ouvido em audiência;
Filhos de Lorenza e André, de 14 e 16 anos, são ouvidos pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Em função do cargo ocupado por André, investigação segue nas mãos do órgão estadual e da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG).
Necropsia de Lorenza é concluída no IML; no entanto, corpo não é liberado.
6 de abril
Integrantes da equipe de investigação composta por promotores de Justiça e delegados da Polícia Civil são revelados em publicação no Diário Oficial do MPMG;
Justiça concede guarda dos cinco filhos de Lorenza e André, que têm 2, 7, 10, 15 e 17 anos, para um amigo da família; trata-se do médico Bruno Sander, de 41 anos.
7 de abril
Pai de Lorenza, o aviador aposentado Marco Aurélio Silva, revela à Justiça que filha e o marido dela registraram testamento em 2018 apontado o médico Bruno Sander como guardião dos filhos;
8 de abril
Amigos de Lorenza reúnem-se para missa de sétimo dia na igreja Santa Rita de Cássia, no bairro São Pedro, na região Centro-Sul de BH;
9 de abril
Promotor recebe visita virtual do médico Bruno Sander;
10 de abril
Em entrevista inédita, filhos mais velhos de Lorenza e André, de 15 e 16 anos, relatam que a mãe era depressiva e misturava remédios com bebida alcoólica nas crises; eles acreditam na inocência do pai.
11 de abril
Pai de Lorenza contesta versão de que filha teria hábito de ingerir bebidas alcoólicas; para ele, Lorenza foi vítima de feminicídio.
13 de abril
Corpo de Lorenza é liberado pela Justiça dez dias após conclusão da necropsia pelo IML;
Promotor solicita autorização para comparecer ao enterro da mulher;
14 de abril
Lorenza é sepultada no cemitério Boa Morte, em Barbacena, no Campo das Vertentes;
19 de abril
Médico que atestou o óbito de Lorenza em 2 de abril – Itamar Tadeu Gonçalves Cardoso, do Hospital Mater Dei – presta depoimento na sede do Ministério Público de Minas Gerais. Ele se recusou a falar com a imprensa.
20 de abril
Giovani Ferreira, pastor amigo da família Pinho, é ouvido pelo MPMG. Depoimento dura cerca de 1h30. Ele narra que foi ao apartamento da família na manhã do dia da morte de Lorenza e declarou ter visto o corpo ser removido. "O corpo estava ao lado da cama coberto por um lençol. Não mostrava nenhum sinal de ferimento ou algo que chamasse a atenção", disse à ocasião;
22 de abril
Médico Hércules de Pinho, primo de André Luis Garcia de Pinho, presta depoimento ao Ministério Público. Fontes ligadas à investigação disseram que ele conhecia o quadro clínico de Lorenza.
27 de abril
Promotor depõe na Procuradoria-Geral de Justiça, em Belo Horizonte, por cerca de 3h30;
Advogado de defesa de André de Pinho, Robson Lucas da Silva, afirma ter tido acesso antecipado ao laudo de necropsia. Segundo ele, documento atestaria que mulher do promotor não foi assassinada.
29 de abril
Sai laudo de perícia particular contratada pela defesa do promotor. De acordo com documento, morte de Lorenza foi fruto de intoxicação – uma combinação de álcool e medicação antidepressiva.